24 de julho de 2012 | 16:09

Com saída de Cristiana Santos do Procon, governo perde em virtude

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No Pequeno Tratado das Grandes Virtudes, a polidez, ela mesma uma virtude, é tratada por André Comte-Sponville  como uma qualidade que permite o exercício de todas as demais virtudes. Daí que aos que pretendem acercar-se de virtudes – e os políticos deveriam estar entre os primeiros a fazê-lo – começar atuando sob o critério dos bons modos é primordial.

A referência é oportuna porque o governador Jaques Wagner (PT) é um homem polido, reconhecidamente. E ninguém lhe tira esta qualidade ou virtude, nem a agressividade de alguns poucos adversários nem a vulgaridade de outros que o acompanham, o que tem representado um diferencial significativo para a sua prática política numa Bahia de passado recente mandonista.

Exatamente por este motivo, custa acreditar que o governador tenha permitido que o processo de exoneração da advogada Cristiana Santos da superintendência do Procon tenha se transformado desnecessariamente numa demonstração inequívoca de falta de educação do seu governo, no qual, não custa lembrar, em pouco mais de seis anos, se verifica a primeira e lamentável grande despedida.

Desde a quinta-feira passada, circulavam rumores de que Cristiana Santos deixaria o cargo por decisão unilateral do governo. Antenado como sempre, com o auxílio de seus inestimáveis colaboradores e fontes que possui no governo, este Política Livre saiu na frente e confirmou que a especulação procedia, transformando-a em notícia.

Ante o choque da divulgação feita pelo site, por tudo que o trabalho excepcional de Cristiana à frente do Procon vinha representando para a sociedade e, consequentemente, o governo, e pelas especulações de que a mudança ocorreria sob o patrocínio de um vergonhoso arranjo político-eleitoral visando outubro em Salvador, houve um verdadeiro corre-corre na administração para arrumar a situação.

E a Cristiana, a quem já havia sido insinuado na mesma quinta-feira que seu cargo iria ser colocado em negociação de forma menos técnica – ou virtuosa – do que a marca que nele imprimiu, foi sugerido que não precisaria precipitar-se e despedir-se imediatamente porque tudo seria executado segundo o ritual de civilidade previsível para um caso como o seu.

Mas eis que a exoneração da superintendente do Procon é publicada na edição de hoje do Diário Oficial do Estado sem que ninguém se dignasse a dar-lhe um telefonema oficial no dia de ontem. Pior: ao chegar no Procon, já sabendo por quem leu o DO que estava fora do cargo, Cristiana deparou-se em sua sala com a substituta, uma desconhecida cujo nome não serve para referência alguma.

Assim, foi obrigada a pedir que um ex-assessor recolhesse do gabinete que ocupara seus objetos pessoais. Na sequência, a incógnita nova titular do Procon resolveu recomendar a Cristiana, por interpostas pessoas, que não falasse com a imprensa sobre sua exoneração nem dentro nem fora do órgão.

A medida praticamente proibia-lhe de divulgar uma nota que preparara, rapidamente, em agradecimento ao governador Jaques Wagner – num ato de grandeza, mais do que de virtude – e todos que julgava ter colaborado com a sua gestão, inclusive a imprensa. Sob o argumento de que a rua era pública, Cristiana conversou com os jornalistas na frente do Procon, onde também despediu-se de ex-assessores e colaboradores.

E assim, deixou o governo, sob um comando inexplicável, mas agindo de forma digna, no que cumpriu a tradição das figuras públicas mais destacadas de sua família, como o seu pai, o ex-governador Roberto Santos, e seu avô, o ex-reitor da UFBa Edgard Santos, homens educados e preparados como ela e poucos, haja visto o que se vê na Bahia, para o exercício da gestão e da função públicas.

Quanto a este Política Livre, se vê, pela primeira vez, forçado a lamentar que um furo dado com praticamente uma semana de antecedência tenha se confirmado, ainda mais de maneira tão lamentável.

Raul Monteiro
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