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Empreiteiro baiano Ricardo Pessoa, dono da UTC/Constram 13 de julho de 2015 | 08:41

A delação hitchcockiana de Pessoa, por Raul Monteiro

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Folha de São Paulo revela que a presidente Dilma Rousseff (PT) ficou simplesmente enfurecida com as revelações do empreiteiro baiano Ricardo Pessoa, da UTC, de que transferiu R$ 7,5 milhões para a sua campanha à reeleição com dinheiro desviado da Petrobras. Na reunião de avaliação que convocou em Brasília com seus principais auxiliares, antes de viajar para os EUA, para analisar o estrago da edição da revista Veja da semana passada com trechos da delação de Pessoa, ela teria dito que não devia nada ao empresário e abusado dos xingamentos, que endereçou a muitos.

O colaborador mais cobrado por Dilma na reunião foi o seu ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Segundo a Folha, a presidente alegou que Cardozo poderia ter combinado com o ministro Teori Zavaski, relator do processo da Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, nada republicamente, a dilatação do prazo para a homologação da delação de Pessoa. Assim, ela poderia ter tido tido uma viagem mais tranquila. Por causa da, digamos, “falta de iniciativa” de Cardozo, Dilma o acusou de ter destruído sua agenda internacional com palavras que não precisam ser publicadas.

Os auxiliares de Dilma sabem o que é enfrentar sua ira. Os baianos Sérgio Gaudenzi, que dirigiu a Infraero quando ela era ministra no governo Lula, e José Sérgio Gabrielli, que presidiu a Petrobras na primeira gestão petista e ainda depois que ela virou presidente, foram vítimas diretas de seu temperamento. É de conhecimento público que Gabrielli chegou a ser visto chorando depois de ter se sentido humilhado pela presidente num telefonema. O excesso de autoconfiança de Dilma, aliado a seu voluntarismo, pode ser apontado como uma das razões porque ela empurrou o país para o abismo.

E porque a presidente tem tanta dificuldade em assumir a responsabilidade por seus equívocos, tentando o tempo todo atribuir a culpa de sua incompetência à crise internacional. Mas sua fúria será de muito pouca valia para enfrentar a avalanche de informações prestadas por Pessoa que começam a vir à tona sobre a propina que, de acordo com a Veja, corria solta em seu governo e, segundo o empreiteiro, beneficiou a campanha dela. Novo extrato de sua delação, publicado na Veja desta semana, indica que a campanha de Dilma recebeu dinheiro também de um contrato dividido pela UTC e outras três empreiteiras com a Eletrobras no valor de R$ 2,9 bi.

Segundo Pessoa, a Eletrobras pediu um desconto de 10% ao consórcio, que aceitou um abatimento de 6%. A diferença, contou o delator, teria ido para a campanha da reeleição da petista. O diretor da Eletrobras Valter Luiz Cardeal, que a Veja diz ser ligado a Dilma desde 1990, quando ela ainda era secretária de Energia do Rio Grande do Sul, teria avisado os petistas sobre os 4 pontos porcentuais de diferença e o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto, preso pela Lava Jato, procurou Pessoa para exigir o pagamento. Simples assim.

O processo da delação de Pessoa, que o governo Dilma acusa com alguma propriedade de ser seletivo, é digno de um roteiro do cineasta inglês Alfred Hitchcock, o mestre do suspense. Os espectadores vão sendo conduzidos para o desfecho das situações antes dos personagens, que parecem inocentes na trama. Os vácuos só ampliam a tensão e a ansiedade. Como o fato de até agora não terem aparecido na relação do empresário políticos baianos, não como receptadores oficiais da conhecida generosidade de Pessoa, cujos nomes, aliás, a revista já publicou, mas na lista dos propineiros que a Bahia deseja conhecer.

* Artigo publicado originalmente na Tribuna da Bahia.

Raul Monteiro*
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