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05 de outubro de 2015 | 07:19

Lupa nas MPs de Lula e Dilma, por Raul Monteiro

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O que garante que uma única Medida Provisória, apenas, teria sido “comprada” durante o governo Lula? Se, como revelou a reportagem do Estadão, representantes de montadoras negociaram a apresentação e aprovação de uma MP no Congresso diretamente com o governo, por alguns milhões de reais, nada impede que outros setores econômicos com interesses que poderiam ser facilitados ou embargados pela administração federal tenham se utilizado do mesmo expediente para atingir seus objetivos. Isto é, obtido, por meio de dinheiro repassado a escritórios de advocacia e lobbies, a garantia de que obteriam benefícios, incentivos ou coisa que o valha.

A descoberta de que uma MP no governo Lula foi “adquirida” comercialmente por um grupo econômico aponta para a mesma suspeita que aos poucos foi sobressaindo das investigações do petrolão, maior esquema de corrupção já descoberto na história deste país por uma operação policial: com certeza, o modus operandi adotado para assaltar os cofres da maior empresa brasileira foi empregado para se apropriar dos de outras estatais, a exemplo da Eletronuclear, infelizmente impedida de ser investigada pela mesma força-tarefa da Lava Jato, que desvenda o esquema, por força de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF).

Ou seja, se este foi o princípio que presidiu, como revelou o jornal paulista, a criação de uma MP, por que outras não podem ter sido originadas nos governos petistas de Lula sob a mesma orientação? Quem não se lembra de que, entre as primeiras medidas da então principiante da gestão petista, esteve uma proposta aprovada na Câmara dos Deputados que liberou a propaganda de cigarros, entre outros lugares, em eventos da Fórmula 1? Exatamente. Contrariando fortes interesses empresariais, a proibição havia sido aprovada no Congresso nos últimos meses do governo Fernando Henrique Cardoso a pedido do então ministro da Saúde, José Serra.

Envolveu um longo período de negociação no Congresso e um jogo de pressões e contrapressões exercido pela poderosa indústria tabagista, ao final vencida pela determinação do governo tucano em estabelecer a restrição. A iniciativa foi comemorada como um avanço por inúmeras organizações, inclusive internacionais, do campo da saúde pública. Mas o que aconteceu com a proibição da propaganda de cigarros logo no princípio do governo Lula? Foi revogada, liberando geral para os fabricantes de cigarros nos eventos de Fórmula 1, um negócio que mobiliza cifras siderais. Não se está afirmando que a MP que restaurou a propaganda tabagista foi também comprada.

Mas, depois da denúncia sobre a “compra” da MP, todas as outras medidas aprovadas no governo Lula que envolveram interesses privados poderosos estão agora sob forte suspeita. Ou não estão? Infelizmente, para o governo, só uma investigação policial completa sobre as decisões mais polêmicas tomadas no período pode, efetivamente, dissipar dúvidas sobre que interesses prevaleceram enquanto o ex-presidente esteve no comando do país. E no governo Dilma Rousseff? Será que o expediente também foi utilizado no seu primeiro governo, quando ela gozava de alta popularidade? Só há uma saída: vasculhar todas sob a lupa do Ministério Público e da Polícia Federal.

* Artigo publicado originalmente na Tribuna da Bahia

Raul Monteiro*
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