Foto: Dida Sampaio/Estadão
21 de outubro de 2019 | 06:44

Missionários abandonam ideia de conversão religiosa ao se aproximar de indígenas

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Entre os participantes brasileiros do Sínodo da Amazônia, reunião convocada pelo papa Francisco até este próximo domingo (27) para discutir os rumos da fé e dos problemas sociais e ambientais na região, está uma delegação de 26 membros que defende uma forma de evangelizar os povos indígenas bastante distinta da que marcou a Igreja Católica desde sua chegada ao Brasil.

“Trabalhamos com a evangelização no sentido do diálogo, do respeito às culturas diferentes e, sobretudo, do desafio de perceber os sinais da presença de Deus no meio de cada povo”, diz dom Roque Paloschi, arcebispo de Porto Velho (RO) e presidente do Cimi (Conselho Indigenista Missionário).

Criado em 1972, durante o regime militar, o Cimi conta hoje com 171 missionários, divididos em 11 regionais espalhadas pelo país. Na delegação enviada ao sínodo em Roma estão tanto o arcebispo quanto missionários leigos (não religiosos) e parceiros indígenas do órgão.

Influenciado pela teologia da libertação, corrente de pensamento para a qual não é possível separar a fé cristã da luta contra a pobreza e as desigualdades, o conselho oferece assistência jurídica, teológica e de comunicação às comunidades indígenas que buscam garantir seus direitos constitucionais, sem que isso implique na conversão de tais povos ao catolicismo.

Com 14 anos de episcopado na Amazônia (antes de se tornar arcebispo de Porto Velho, também foi bispo de Roraima), dom Roque Paloschi explica as diferentes abordagens desse trabalho.

“Em Roraima, tive duas experiências diferentes. Com o povo macuxi, que já tinha tido contato com monges beneditinos no início do século 20, esse processo de diálogo incluiu a acolhida dos sacramentos [como o batismo e a comunhão católicos].”

“Já com o povo ianomâmi tivemos outro processo, de respeito e de promoção da vida daquelas comunidades. Nesse segundo caso, não é uma evangelização explícita, mas sim uma presença respeitosa dos missionários junto a eles.”

A chamada “evangelização implícita”, de fato, é um dos eixos do trabalho do Cimi, diz o missionário leigo Aleandro Laurindo da Silva, 36, que trabalha com comunidades indígenas urbanas, de etnias como os guaranis e os pancararus, na Grande São Paulo, e também com grupos do Vale do Ribeira (também guaranis).

“Nos nossos encontros com eles, não falamos de Jesus Cristo, de Deus, da eucaristia”, afirma ele. “A perspectiva da evangelização implícita é a seguinte: como vamos mostrar a essas comunidades que os cristãos são bons, que Deus é bom? Por meio da nossa presença solidária ao lado delas, para que conquistem seus direitos.”

De acordo com Silva, um dos modelos para essa abordagem foi a atuação de missionárias francesas, ligadas à Fraternidade das Irmãzinhas de Jesus, junto aos tapirapés, povo de Mato Grosso que quase desapareceu nas primeiras décadas do século 20.

Folha de S.Paulo
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