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Fabrício Queiroz 09 de dezembro de 2019 | 06:51

Aplicativo para identificar ‘rachadinhas’ é premiado no Rio de Janeiro

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Sem relatório do antigo Coaf ou campanas policiais, um aplicativo que promete identificar gabinetes com potencial de praticarem rachadinha foi premiado na última sexta-feira (6) pelo Ministério Público do Rio de Janeiro.

A ferramenta pretende cruzar 50 diferentes informações de cada um dos assessores dos gabinetes parlamentares —tais como escolaridade, local de residência, vínculos com empresas— a fim de identificar inconsistências que indiquem a possibilidade de crimes.

“Podemos, por exemplo, cruzar a escolaridade e o cargo. Se encontrarmos um assessor responsável por elaborar leis com o ensino fundamental incompleto, há um indício de incompatibilidade do cargo”, disse o estudante de direito Rafael Wanderley, 22, idealizador do aplicativo.

O programa depende de dados a serem obtidos pelo próprio Ministério Público em fontes oficiais de informação cujos dados não são abertos.

“A ferramenta não dispensa o trabalho investigativo, mas cria um índice de risco que impede aquele argumento de que investigou mais o partido X ou Y”, disse Hassany Chaves, analista do Ministério Público Federal.

O Projeto Rachadinha, composto também pelo analista de tecnologia da informação Kennedy Carvalho, 30, recebeu R$ 9.000 no Hackfest, festival de tecnologia voltado para o combate à corrupção.

A “rachadinha” é a principal suspeita que recai sobre o gabinete do senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) entre 2007 e 2018, quando exercia o mandato de deputado estadual na Assembleia do Rio.

O filho do presidente Jair Bolsonaro se tornou alvo de investigação do Ministério Público fluminense após um relatório do antigo Coaf identificar movimentação financeira atípica de R$ 1,2 milhão de seu ex-assessor Fabrício Queiroz.

Além do volume movimentado, chamou a atenção a forma como as operações se davam: depósitos e saques em dinheiro vivo em datas próximas do pagamento de servidores da Assembleia.

As características das operações levaram a Promotoria à suspeita de um esquema de “rachadinha”, em que servidores são coagidos a devolver parte do salário para os deputados.

Iniciada em janeiro de 2018, a apuração ficou quatro meses parada em razão de uma liminar do presidente do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli. Ela voltou a andar essa semana, após o plenário da corte autorizar o compartilhamento com o Ministério Público e a polícia de dados sigilosos como os do antigo Coaf.

A proposta do aplicativo foi elaborada em outubro e desenvolvida ao longo de dois meses. “É um aplicativo apartidário. Não para avaliar uma pessoa ou dez, mas todos. O Queiroz não foi a razão da ferramenta, mas o modus operandi atribuído a ele foi analisado”, disse Chaves.

O promotor Eduardo Carvalho, membro do Gaecc (Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção), que investiga o senador, disse que a ferramenta tem potencial para melhorar o foco das investigações sobre a prática.

“[A ‘rachadinha’] É algo que ocorre de forma obscura. É difícil distinguir que assessores participam ou não disso. A ferramenta é uma tentativa de buscar esses indicadores de risco”, afirmou Carvalho, membro da comissão avaliadora do festival.

Além de identificar a possibilidade de “rachadinha”, a ferramenta também disponibiliza um canal para denúncias.

O trio criou uma página na qual informa a lotação de assessores por gabinete da Assembleia do Rio, informação não divulgada atualmente pelo Legislativo fluminense.

A Assembleia editou uma resolução em 23 de outubro na qual se dá um prazo de seis meses para disponibilizar esse dado. O grupo do Projeto Rachadinha conseguiu o mesmo em uma semana com informações coletadas por robôs do Ministério Público do Rio em edições do Diário Oficial.

Folha de S.Paulo
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