Foto: Presidência do Peru/Xinhua
O presidente do Peru, Martín Vizcarra, fala durante o processo de impeachment no Congresso, em Lima 19 de setembro de 2020 | 10:00

Congresso peruano rejeita impeachment de presidente

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O Congresso peruano recusou o pedido de impeachment do presidente Martín Vizcarra, na noite de sexta-feira (18). Depois de uma sessão de mais de 12 horas, a moção de vacância foi rejeitada por 78 votos, contra 32 de parlamentares a favor do afastamento e 15 abstenções.

Com isso, Vizcarra permanece no cargo. Há eleições presidenciais no Peru previstas para abril de 2021.

O resultado ficou longe do que seria necessário para o afastamento. Segundo a lei, para o impeachment são necessários 87 votos. Na semana passada, a aceitação da moção teve 65 votos, o que significa que vários parlamentares que estavam a favor do afastamento mudaram de ideia ao longo dos últimos dias.

As intervenções dos deputados tomaram toda a tarde e o início da noite. Quando terminaram, o líder do Congresso, Manuel Merino de Lama, em vez de colocar a moção em votação, apresentou outros dois temas de legislação eleitoral para serem votados antes, enquanto os porta-vozes dos partidos decidiam, nos bastidores, se queriam votar a vacância na sequência ou adiá-la para segunda-feira (21), como foi proposto pelo partido Acción Popular.

Ao final, por volta das 20h (22h de Brasília), Merino de Lama iniciou a votação do impeachment. Mais da metade dos congressistas votou desde suas casas por conta da pandemia de coronavírus. Dificuldades de conexão atrasaram várias fases da sessão.

Vizcarra havia comparecido pela manhã ao Congresso para apresentar sua defesa. O mandatário chegou ao local pouco antes das 10h (meio-dia de Brasília), acenou para simpatizantes do lado de fora do edifício do Congresso e disse a jornalistas que estava tranquilo e que havia decidido comparecer “por dever constitucional”.

Em sua fala, afirmou que “os áudios que estão usando contra mim não passaram por perícia, portanto não têm validade comprovada. Reconheço que num deles, se trata da minha voz. Mas pergunto: qual é o delito?”.

O processo de impeachment foi desencadeado pela divulgação de gravações nas quais o presidente aparece pedindo a assessoras que mintam em um inquérito sobre a relação dele com um ex-colaborador.

O caso explodiu em maio, quando a imprensa descobriu que o Ministério da Cultura havia oferecido contratos supostamente irregulares de US$ 10 mil (R$ 53 mil) ao cantor Richard Cisneros.

Nos áudios, há mais de uma conversa entre Vizcarra e a secretária-geral da Presidência, Karem Roca, para organizar visitas de Cisneros, cujo nome artístico é Richard Swing, à sede do Executivo.

Ao iniciar a fala no Congresso, o líder peruano afirmou que “muitos haviam recomendado” que ele não comparecesse à sessão e que deixasse a defesa nas mãos de seu advogado, Roberto Pereira Chumbe.

“Mas eu não sou assim, vim para dar a cara, porque nunca escapei desse tipo de situação nem vou fugir agora. Vou enfrentar essas acusações de frente”, afirmou o presidente.

Vizcarra ainda argumentou que não compete ao Congresso investigar o episódio, e sim ao Ministério Público, e que, após apresentar a defesa, daria sequência a uma viagem por regiões do país afetadas pela pandemia do coronavírus. “Este é o verdadeiro inimigo do Peru hoje, a Covid-19.”

Ele chamou a atenção para a melhora dos números da crise sanitária no país, com leve queda nos casos e mortes em setembro. O Peru, um dos mais afetados pelo vírus na América Latina, registrou, até o momento, 31.146 óbitos e mais de 750 mil infecções confirmadas por coronavírus.

Chumbe, o advogado de Vizcarra, também discursou. Reforçou os argumentos do presidente, de que os áudios não foram periciados e que a investigação de um possível crime deve passar primeiro pelo Ministério Público. “O Congresso pode votar uma vacância do presidente, mas que o faça sobre questões concretas. Não quando estamos numa investigação ainda embrionária de um eventual delito.”

Ele ainda afirmou que não há explicações comprovadas sobre como as gravações foram feitas. “Temos de zelar pelo Estado de Direito, e, num Estado de Direito, é preciso seguir as vias legais para a obtenção de provas. Evidências conseguidas por meios ilegais e informais não podem ser usadas num processo, ainda mais num processo dessa gravidade.”

Após a apresentação da defesa, os parlamentares passaram a se pronunciar.

Entre os que votaram contra o impeachment, está o deputado Reymundo Dioses, porta-voz do Somos Perú, que afirmou não ser “conveniente nem oportuno gerar uma situação de instabilidade por uma mudança de governo a dez meses do fim do mandato presidencial e a sete meses de um processo eleitoral”.

Já María Silupu, do partido fujimorista Força Popular, disse que “esses áudios são a prova de um delito de fraude e de um delito de obstrução da Justiça” e que, por isso, o presidente deve sair. A líder do Força Popular, Keiko Fujimori, no entanto, manifestou-se contra o afastamento —ela participou virtualmente porque cumpre prisão domiciliar por conta do escândalo da Odebrecht.

Omar Chehade, do Alianza para el Congreso, sugeriu outra solução. “O presidente está deslegitimado, não tem autoridade moral para governar o país e deveria renunciar.”

Folha
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