Foto: Wilton Júnior/Estadão
Flávio Bolsonaro 23 de setembro de 2020 | 12:45

Investigado, Flávio tenta aproximar Bolsonaro de juiz evangélico por vaga no STF

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Em campanha para ser indicado a uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal), o juiz federal William Douglas dos Santos tem contado com a ajuda de pesos pesados para se aproximar de Jair Bolsonaro (sem partido).

Além de ter o apoio de líderes evangélicos, o filho mais velho do presidente, senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), tem buscado impulsionar o nome do pastor do Rio de Janeiro junto ao pai e a auxiliares de confiança do presidente.

A informação de que o juiz recebeu a chancela de Flávio, que está na mira de investigações por suspeita de abrigar em seu gabinete como deputado estadual um esquema da chamada “rachadinha”, foi confirmada por três pessoas próximas ao presidente e por três aliados do magistrado.

Uma vaga do Supremo ficará desocupada em novembro com a aposentadoria do ministro Celso de Mello, que completará 75 anos. Bolsonaro indicará o substituto, que terá de ser aprovado pelo Senado.

A situação jurídica de Flávio passará pelo STF, que decidirá sobre a concessão de foro especial ao senador. Caso o benefício seja confirmado, poderá ganhar força a tese de anulação das provas colhidas quando a investigação estava sob responsabilidade do juiz de primeira instância Flávio Itabaiana.?

Segundo relatos feitos à Folha, o juiz Douglas teria auxiliado Flávio a se aproximar de líderes de igrejas evangélicas no Rio de Janeiro durante a campanha eleitoral de 2018.

Desde o início do ano, o magistrado tem se deslocado a Brasília com frequência. Durante um período, viajou à capital federal quinzenalmente, segundo aliados. Em ao menos uma dessas ocasiões, no meio do ano, o juiz teve um encontro com Flávio no gabinete do senador.

Agora em setembro, segundo fontes ligadas tanto ao juiz quanto ao presidente, Douglas esteve com o próprio Bolsonaro em Brasília.

De acordo com um aliado do presidente, o encontro ocorreu após Flávio ter indicado o nome do juiz e após uma ofensiva de evangélicos em defesa do magistrado.

Procurado, o magistrado negou ter havido a reunião com Bolsonaro e diz que as fontes ouvidas pela Folha estão equivocadas. “Nunca promovi encontros políticos e não ocorreu o mencionado encontro com o presidente”, afirmou.

O Palácio do Planalto não quis comentar. Flávio também não respondeu aos questionamentos da reportagem sobre sua relação com o juiz.

Também no início deste mês, Bolsonaro recebeu no Planalto o líder da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo, Silas Malafaia. O pastor estava acompanhado do apóstolo César Augusto, fundador e líder da igreja Fonte da Vida e do ex-deputado federal Fábio Sousa (PSDB-GO).

No encontro, segundo relatos, foi defendido o nome de Douglas. Na ocasião, foi entregue a Bolsonaro uma lista com o apoio de diversas igrejas evangélicas ao nome do juiz.

Apesar dos encontros recentes, o presidente já sabia quem Douglas era. Em novembro de 2019, ambos estiveram juntos durante um culto da Assembleia de Deus, em Manaus.

Em dezembro do ano passado, o juiz também foi visto no evento cantata de Natal, no Palácio do Planalto, ao lado de outros líderes evangélicos.

Hoje, o juiz, que tem trabalhado por sua indicação, é apontado como um dos nomes avaliados pelo presidente para uma das cadeiras que ficarão vagas no STF nos próximos dois anos.

A indicação de Douglas, porém, ainda é dada como improvável. O magistrado não conta com grande apoio entre ministros palacianos e enfrenta resistência de integrantes de tribunais superiores. A confirmação dele seria tratada como um gesto caricato, avaliam ministros.

Além disso, o presidente tem dado sinais trocados a assessores e aliados sobre o que esperar do candidato à primeira vaga a que terá direito de indicar no Supremo.

Há três semanas, o presidente disse a uma pessoa próxima que indicaria um evangélico para a vaga. Dias depois, porém, disse a outro aliado que escolherá alguém com quem “toma café” e “bebe cerveja” e que seria aprovado facilmente em sabatina no Senado.?

Em um desses encontros, Bolsonaro ressaltou que o nome “terrivelmente evangélico”, que o próprio presidente já disse querer no Supremo, só será escolhido no próximo ano.

Em julho de 2021, o ministro Marco Aurélio Mello também completará 75 anos e se aposentará.

Para o posto de Celso, o presidente disse querer um nome politicamente forte, capaz de influenciar grupos do Supremo. Eles hoje se dividem em ministros refratários a Bolsonaro e outros mais afeitos ao diálogo.

Os relatos sugerem que a escolha de Bolsonaro deverá ficar entre Jorge de Oliveira, ministro da Secretaria-Geral, João Otávio Noronha, ex-presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), e Ives Gandra Filho, ministro do TST (Tribunal Superior do Trabalho).

Em mais de um encontro, o presidente já disse que sua opção para a primeira vaga seria Oliveira. Bolsonaro quer ter um aliado de primeira hora por um longo período. O ministro tem 44 anos e os magistrados só são obrigados a se aposentar aos 75.

O titular da Secretaria-Geral, por sua vez, já disse a ministros do STF e a pessoas próximas que não gostaria de ser indicado agora. O motivo seria a falta de preparo para assumir a cadeira que hoje pertence ao decano da corte, respeitado entre os colegas.

Por isso, Oliveira disse que gostaria de passar mais um ano à frente da SAJ (Subchefia para Assuntos Jurídicos). O cenário ideal para ele, dizem pessoas próximas, seria Bolsonaro ser reeleito e ele, então, indicado a uma terceira vaga.

Caso Oliveira mantenha a postura refratária, o presidente já disse que pode indicar o ministro da Justiça, André Mendonça. Ele, contudo, sinalizou que tem preferência em avaliar a sua indicação para a segunda vaga, quando pretende escolher alguém “terrivelmente evangélico”.

Folha de S.Paulo
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