Foto: Wilton Júnior/Estadão
BNDES 20 de novembro de 2020 | 11:30

Estatais têm salários médios de até R$ 31 mil, 13 vezes a média do brasileiro

economia

As estatais brasileiras pagam salários médios de até R$ 31,3 mil – isso sem contar as remunerações das diretorias executivas, que chegam a ganhar em média até R$ 2,9 milhões por ano. O dado faz parte de um levantamento inédito do governo federal. O documento evidencia números superlativos – e muitas vezes contrastantes com a realidade brasileira – de várias dessas empresas. No ano passado, a renda média do brasileiro ficou abaixo de R$ 2,5 mil.

Produzido pelo Ministério da Economia, o ‘Relatório Agregado das Empresas Estatais Federais’ reúne dados das 46 estatais de controle direto da União e consolida informações contábeis, de gastos com pessoal e reajustes salariais de pelo menos os últimos cinco anos, entre outros números. O levantamento, ao qual o Estadão/Broadcast teve acesso em primeira mão, será divulgado hoje pelo governo e também mostra que a União precisou aportar no ano passado R$ 17 bilhões em 18 dessas estatais, que são dependentes do Tesouro.

Um dos indicadores que mais chamam a atenção nas estatais brasileiras são os salários. A remuneração média mais alta, de R$ 31,3 mil, é paga a funcionários da PPSA, estatal responsável por gerir os contratos de partilha oriundos de leilões do pré-sal – e já prometida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, para a fila das privatizações, apesar da resistência do ministro de Minas e Energia, Bento Albuquerque. A PPSA tem 57 funcionários.

Já a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf) conta com 1,5 mil empregados e tem o terceiro salário médio mais alto entre as estatais, de R$ 20,7 mil, ficando atrás apenas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) nesse ranking, de R$ 29,2 mil.

Mas diferentemente da PPSA e do BNDES, a Codevasf é uma estatal dependente do Tesouro – ou seja, que precisa de aportes da União para bancar custeio e despesas com pessoal. O relatório do governo revela que a companhia precisou de R$ 2,7 bilhões do governo nos últimos cinco anos. A Codevasf é também uma das empresas mais cobiçadas pelos políticos, pois responde por obras e projetos de agricultura irrigada, oferta de água e revitalização de bacias hidrográficas em todos os Estados do Nordeste.

Com o relatório, o governo espera dar cada vez mais transparência a situação das estatais brasileiras, uma das principais recomendações da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A expectativa é de que os dados consolidados e padronizados possam cercar o Executivo de argumentos em decisões extinção ou privatização de empresas públicas – agenda prometida pela gestão Bolsonaro, mas que pouco avançou até agora.

“É uma consolidação das informações de forma padronizada. Isso é um legado. Esse tipo de material, somado a esforço de avaliação profunda das 46 estatais, é uma transformação na maneira como se gere essas empresas”, afirmou ao Estadão/Broadcast o secretário Especial de Desestatização, Desinvestimento e Mercados do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord de Faria, que assumiu o posto em agosto após a saída de Salim Mattar.

Para Mac Cord, mais do que um “retrato”, o relatório traz um “filme” que mostra a evolução das estatais em termos de custos de pessoal, nível de dependência do Tesouro e evolução do patrimônio líquido. “Vamos conseguir monitorar o cumprimento de políticas públicas pelas estatais. A função dessas empresas não é se perpetuar em cima de falhas de mercado”, disse.

“É o primeiro passo para se ter radiografia completa das estatais brasileiras”, afirmou o secretário de Coordenação e Governança das Empresas Estatais, Amaro Luiz de Oliveira Gomes. No cargo há dez meses, o servidor de carreira do Banco Central atuou nos últimos dez anos como membro do International Accounting Standards Board (IASB), em Londres, representando a América Latina.

Em algumas situações, as estatais evidenciam desigualdades na execução de políticas públicas, restritas a algumas capitais. É o caso das estatais de transporte público, como a Trensurb, no Rio Grande do Sul, e a CBTU, que atua em Belo Horizonte, Recife, Maceió, João Pessoa e Natal. Ambas já estão no Programa Nacional de Desestatização (PND).

Elas receberam R$ 5,7 bilhões em aportes do Tesouro nos últimos cinco anos, dinheiro que serve para subsidiar os passageiros dessas cidades. As duas estatais se somam as outras 15 empresas públicas sob controle direto da União que já estão na mira do governo para desestatização: Ceagesp, CeasaMinas, Codesa, Porto de Santos, ABGF, EMGEA, Casa da Moeda, Nuclep, Serpro, Dataprev, Ceitec, EBC, Correios, Eletrobrás e Telebrás.

Um dos caso mais emblemáticos das dificuldades financeiras das estatais é o da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (EBSERH). Responsável pela gestão de 40 hospitais universitário federais no País, ela presta serviços de média e alta complexidade pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e registra necessidade crescente de aportes da União. Foram R$ 1,7 bilhão em 2015, R$ 2,8 bilhões em 2016, R$ 3,6 bilhões em 2017, R$ 4,5 bilhões em 2018 e R$ 5,1 bilhões em 2019. A EBSERH tem hoje 35, 7 mil empregados, com salário médio de R$ 9,8 mil. Até agora, o governo não deixou claro o que pretende fazer para solucionar o déficit crescente da empresa.

Diretores, presidentes e membros de conselhos fiscais e de administração podem ganhar remunerações muito elevadas à frente de estatais brasileiras, principalmente nas maiores empresas públicas do País, e especialmente entre as de capital aberto.

Na Petrobrás, os membros da diretoria executiva receberam, em média, R$ 2,9 milhões em 2019. Os integrantes dos conselhos de administração e os membros do conselho fiscal ganharam, em média, R$ 194,3 mil e R$ 132,4 mil, respectivamente.

No Banco do Brasil, membros da diretoria executiva, inclusive o presidente, receberam, em média, R$ 1,6 milhão no último ano. Os integrantes dos conselhos de administração e fiscal ganharam na média entre R$ 89,8 mil e R$ 90,3 mil.

Na Eletrobrás, os membros diretoria executiva receberam R$ 1,019 milhão em média por ano. Os conselheiros de administração e fiscais ganharam, na média, respectivamente, R$ 176,4 mil e R$ 75,4 mil, respectivamente.

Empresas públicas de capital fechado também pagam remunerações atrativas à sua diretoria. Na Caixa, o presidente Pedro Guimarães recebe R$ 56,2 mil por mês, mas, se atingir as metas de remuneração variável, pode ganhar mais até R$ 449,6 mil por ano. Os valores são relativos a 2019. Os outros 24 diretores executivos receberam R$ 50,2 mil mensais fixos, com potencial de até R$ 401,9 mil anuais em remuneração variável.

No BNDES, o presidente Gustavo Montezano teve honorário fixo mensal de R$ 80,8 mil ano passado e uma remuneração variável potencial de até R$ 242,5 mil. Os dez diretores do BNDES têm salário de R$ 74,1 mil, enquanto a remuneração variável pode atingir R$ 222,3 mil.

As altas remunerações variáveis não estão restritas aos bancos públicos. Com o papel de atuar no financiamento de estudos, projetos e programas de interesse para tecnológico, a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) ofereceu ao presidente da empresa uma remuneração variável de até R$124,5 mil.

O Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro), responsável pelo desenvolvimento de soluções tecnológicas para o governo, teve remuneração variável de até R$ 103,5 mil. Por ano, diretores da Casa da Moeda, DataPrev, Emgea, Santos Port Authority e ABGF puderem receber até, respectivamente, R$ 128,2 mil, R$ 110,8 mil, R$ 96,3 mil, R$ 89,3 mil e R$ 84,4 mil, em remuneração variável.

Veja abaixo a lista de estatais com salários médios mais altos (em 2019, não inclui eventuais conselheiros e diretoria executiva):

PPSA (opera a parte da União no pré-sal)- R$ 31,3 mil
BNDES (banco de fomento) – R$ 29,2 mil
CODEVASF (projetos de agricultura irrigada e segurança hídrica) – R$ 20,7 mil
FINEP (financiamento de projetos de tecnologia) – R$ 20 mil
Petrobras (petroleira) – R$ 18,9 mil
ABGF (responsável por dar garantias) – R$ 15 mil
EPL (planejamento e logística)- R$ 14,7 mil
EPE (pesquisa energética) – R$ 13,7 mil
NUCLEP (indústria de componentes relativos a usinas nucleares) – R$ 13,3 mil
Embrapa (pesquisa agropecuária)- R$ 12,7 mil

Estadão
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