Foto: Dida Sampaio/Estadão
Palácio do Planalto 08 de abril de 2021 | 10:00

Coalizão de empresas e ONGs cobra do governo ampliação de meta climática e redução do desmate

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A Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, movimento que reúne mais de 280 empresas e instituições representantes do agronegócio, meio ambiente, setor financeiro e academia, envia uma carta (leia na íntegra) nesta quinta-feira, 8, ao governo Jair Bolsonaro para cobrar metas mais ambiciosas em relação ao clima e medidas que enfrentem, efetivamente, o problema do desmatamento ilegal – a gestão atual registra os piores índices da história. O texto aponta seis medidas que podem reposicionar o País na agenda climática, com base em leis e normas que já estão em vigor, como o Cadastro Ambiental Rural.

A coalizão inclui nomes de empresas e instituições como Amaggi, Bradesco, Carrefour, Cargill, Duratex, Gerdau, Imazon, Instituto Ethos, Itaú, Klabin, Santander, Suzano, UBS, Unilever e WWF Brasil, que se uniram neste grupo para pressionar o governo e propor soluções na área ambiental. O assunto será tratado durante evento organizado pelo governo americano, entre os dias 22 e 23 de abril.

Há duas semanas, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, oficializou o convite a 40 líderes internacionais, entre eles Bolsonaro, para participar do encontro que vai debater a pauta climática, por videoconferência. Biden colocou a questão climática no centro de sua política externa e quer usar a reunião para que países cheguem a acordos para a Cúpula do Clima, encontro da Organização das Nações Unidas (ONU) previsto para acontecer em novembro, em Glasgow, na Escócia.

Na carta ao governo brasileiro, à qual o Estadão teve acesso com exclusividade, a coalizão lembra que “o Brasil é considerado um país-chave nos esforços globais para o equilíbrio climático do planeta”, mas que, com uma decisão anunciada pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, no fim do ano passado, houve “redução no nível de ambição” – isso torna o País menos atraente para investimentos internacionais e abertura do mercado de carbono. “O Brasil só vai receber apoio e parcerias externas por esforços de mitigação como contrapartida a avanços efetivos na agenda climática. Para tanto, é fundamental o País alcançar uma significativa redução de emissões de gases de efeito estufa, trabalhar pela eliminação do desmatamento ilegal de seus biomas e combater a ilegalidade.”

O Brasil é o 6.º maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, e a destruição das florestas responde pelo maior volume dessas emissões. Em novembro, Salles praticamente só confirmou as metas que já haviam sido apresentadas pelo governo de Dilma Rousseff em 2015 e condicionou seu cumprimento a uma ajuda financeira estrangeira, o que não tinha acontecido antes.

No Acordo de Paris, o Brasil havia se comprometido em reduzir suas emissões em 37% até 2025, com base em 2010, e indicou que poderia chegar a 43% em 2030. A maior parte dessa redução se daria com o combate ao desmatamento ilegal, que deveria ser zero até 2030. Salles confirmou os 43%, mas disse que isso dependeria de ajuda estrangeira, o que não foi bem visto internacionalmente.

A posição também foi criticada por empresas. “Para nós, o ponto central dessa questão climática é o desmatamento ilegal. Sabemos que 40% das emissões brasileiras vem dessas ações. É o que mais mancha a imagem do Brasil no exterior. Essa é a questão que preocupa as empresas que exportam”, disse à reportagem o representante da coalizão, Marcello Brito, que também é presidente do conselho da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag). “O Brasil sempre foi um País de excelente imagem, que exportava sustentabilidade. É isso o que queremos resgatar.”

Na semana passada, em entrevista ao Estadão, Salles disse que o governo consegue reduzir a devastação da Amazônia em até 40% em 12 meses, mas somente se receber US$ 1 bilhão de países estrangeiros. Sem verba, afirmou que não se compromete com porcentuais. As taxas oficiais de desmatamento observadas nos dois primeiros anos em que esteve à frente do ministério são as maiores desde 2008. A do ano passado foi 47% maior que a observada em 2018.

Na mesma semana, o Departamento de Estado havia convocado jornalistas brasileiros para uma teleconferência, em Washington, com um influente diplomata americano. E o recado foi duro. “Queremos ver coisas tangíveis contra o desmatamento ilegal. E queremos ver uma diminuição real ainda este ano, não esperar cinco ou dez anos.” O diplomata disse que o governo americano sabe que a forma de agir é uma decisão soberana do Brasil, mas não descartou eventuais sanções – e deixou claro que financiamento deve estar ligado a resultados.

O Brasil é considerado um país-chave nos esforços globais para o equilíbrio climático. Entre 2004 e 2012, o Brasil fez a maior redução de emissões de gases de efeitos estufa já registrada por um único país, ao reduzir em 80% sua taxa de desmatamento, afirma a coalizão, no documento enviado ao governo. “Este é o momento de os brasileiros retomarem esse protagonismo histórico. Por isso, a Coalizão Brasil reafirma que a ambição do país nessa agenda climática precisa ser expressiva e permanente. Algo importante não somente para a comunidade internacional, mas também para o país consolidar-se como uma das maiores economias do mundo.”

1. Retomar e intensificar ações de fiscalização com uso de inteligência do Ibama, Instituto Chico Mendes de Biodiversidade (ICMBio) e Funai, com responsabilização de ilícitos ambientais e punição de infratores. Nesse sentido, é importante o pleno cumprimento da lei vigente, incluindo a destruição no campo de equipamentos utilizados por criminosos ambientais.

2. Finalizar implementação Cadastro Ambiental Rural (CAR) e suspender registros que incidem sobre florestas públicas promovendo responsabilização por eventuais desmatamentos ilegais.

3. Destinar 10 milhões de hectares à proteção e uso sustentável. Selecionar, num prazo de 90 dias, a partir do Cadastro Nacional de Florestas Públicas, a área que possa ser designada como área protegida de uso restrito e de uso sustentável em regiões sob forte pressão de desmatamento.

4. Conceder financiamentos sob critérios socioambientais. O Conselho Monetário Nacional deve exigir que as instituições de crédito rural e agrícola adotem práticas e critérios mais rigorosos de checagem de riscos ambientais, como a comprovação de ausência de ilegalidade nas propriedades, incluindo a conferência do Cadastro Ambiental Rural e demais requisitos relacionados ao cumprimento do Código Florestal e à sobreposição em terras públicas.

5. Dar total transparência e eficiência às autorizações de supressão da vegetação. Os órgãos estaduais de meio ambiente devem tornar públicos os dados referentes às autorizações de supressão de vegetação. Para tanto, as autorizações devem ser compartilhadas no Sinaflor, do Ibama.

6. Suspender todos os processos de regularização fundiária de imóveis com desmatamento após julho de 2008. Todos os processos de regularização fundiária de áreas desmatadas irregularmente após julho de 2008 devem ser paralisados, até que as áreas estejam plenamente recuperadas, conforme prevê o Código Florestal.

André Borges/Estadão Conteúdo
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