14 dezembro 2024
Centenas de pacientes do maior hospital da Faixa de Gaza, o Al-Shifa, começaram a deixar a unidade neste sábado (18), naquilo que a direção do local chamou de evacuação forçada pelas forças de Israel. Tel Aviv nega, dizendo que apenas está facilitando a saída a pedido da administração do complexo.
O hospital é o mais polêmico alvo de Israel em sua guerra contra o Hamas, grupo terrorista palestino que comandava Gaza desde 2007 e que, em 7 de outubro, lançou um ataque com 1.200 mortos que disparou o conflito atual.
Na quarta (15), o local foi ocupado após um breve combate entre forças israelenses e terroristas. Desde então, as Forças de Defesa de Israel têm buscado mostrar evidências de que o local era utilizado pelo Hamas como esconderijo e centro de comando.
Armas, equipamento tático, computadores, documentos e ao menos uma entrada para o sistema de túneis do Hamas foram encontrados no local, segundo os militares, que divulgaram vídeos e fotos dos achados. O grupo e a direção do hospital negam o relato, trazendo o debate para o campo pantanoso das verdades de redes sociais.
Com cada lado dizendo uma coisa, e a visita de uma equipe do jornal The New York Times afirmando ser impossível ter certeza do que o túnel achado se tratava, restam por ora as versões. O mesmo ocorre neste sábado.
Há um fato: grandes grupos de pacientes e médicos estão deixando o Al-Shifa. Para a mídia árabe, é uma evacuação forçada, enquanto as IDF, sigla inglesa pela qual são conhecidas as forças israelenses, afirmou em nota que apenas está garantindo a saída de quem quiser deixar o local.
Há cerca de 1.500 pessoas no Al-Shifa, 650 das quais pacientes. A situação no local é dramática, sem energia e água. Na sexta, 1 dos 33 bebês que dependiam de incubadoras morreu, a primeira vítima desde que Israel entrou no local —um ato que desafia a lei internacional, que só permite tal invasão se o hospital for de fato usado como unidade militar pelo adversário, o que é bem difícil de tipificar.
Ao todo, morreram do lado palestino cerca de 12 mil pessoas, segundo número do Hamas usualmente aceitos pela ONU e ONGs. Neste sábado, Israel anunciou “pausas táticas” em horários determinados para permitir a evacuação de civis do norte para o sul da Faixa de Gaza. Caminhões com combustível do Egito também entraram na região para abastecer estruturas da ONU.
Enquanto o drama se desenrola, as IDF intensificaram seus ataques aéreos ao sul de Gaza, matando segundo autoridades palestinas 32 pessoas neste sábado, em preparação para a próxima fase da guerra.
Ao longo da semana, Israel despejou panfletos em cidades como Khan Yunis, onde estão diversas famílias brasileiras que não quiseram deixar Gaza na repatriação promovida pelo Itamaraty no fim de semana passado, alertando os moradores a ir para a região costeira da faixa.
“Estamos pedindo para as pessoas se realocarem. Não é fácil para muitas delas, mas não queremos ver civis pegos no fogo cruzado”, afirmou Mark Regev, um assessor do premiê Binyamin Netanyahu, durante entrevista à rede americana MSNBC na sexta (17).
Foi em Khan Yunis que ataques aéreos mataram 26 pessoas nesta madrugada, segundo os palestinos. As outras 6 morreram numa cidade 10 km a norte, Deir al-Balah.
A Faixa de Gaza foi dividida em dois pelos militares israelenses. A porção ao norte do rio Wadi Gaza, incluindo a capital homônima da região, é objeto da operação terrestre desde 27 de outubro. A sul, para onde os civis foram orientados a ir, é alvo de bombardeios e, segundo o que indicou o Exército de Israel na sexta, será invadida por terra também.
Se o objetivo de destruir o Hamas é declarado, o futuro da faixa é incerto. Neste sábado, o governo dos Emirados Árabes Unidos, que é um país árabe que estabeleceu relações intensas com Israel em 2020, disse estar preocupado com a presença de Tel Aviv na região —que, com a Cisjordânia, formaria o Estado palestino previsto nos acordos de Oslo (1993), mas nunca viabilizado.
Os EUA, principais fiadores de Israel, já disseram o mesmo, e Netanyahu nega querer retomar a ocupação de Gaza, que durou de 1967 a 2005, deixando em aberto a questão do controle militar da região. A Autoridade Nacional Palestina, órgão legítimo que governa a Cisjordânia, seria naturalmente a opção, mas é um governo desgastado e malvisto pela população local.
Igor Gielow, Folhapress