Elias de Oliveira Sampaio

Políticas Públicas

Economista do Ministério da Economia. Mestre em Economia e Doutor em Administração Pública pela UFBA. Autor de diversos trabalhos acadêmicos e científicos, dentre eles o livro Política, Economia e Questões Raciais publicado - A Conjuntura e os Pontos Fora da Curva, 2014 a 2016 (2017) e Dialogando com Celso Furtado - Ensaios Sobre a Questão da Mão de Obra, O Subdesenvolvimento e as Desigualdades Raciais na Formação Econômica do Brasil (2019). Foi Secretário Estadual de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) e Diretor-presidente da Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia (Prodeb), Subsecretário Municipal da Secretaria da Reparação de Salvador (Semur), Pesquisador Visitante do Departamento de Planejamento Urbano da Luskin Escola de Negócios Públicos da Universidade da Califó ;rnia em Los Angeles (UCLA), Professor Visitante do Mestrado em Políticas Públicas, Gestão do Conhecimento e Desenvolvimento Regional da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Professor, Coordenador do Curso de Ciências Econômicas e de Pesquisa e Pós-Graduação do Instituto de Educação Superior Unyahna de Salvador.

Cassino Royale

Emprestamos o título do nosso artigo da semana de um dos melhores filmes de James Bond, Cassino Royale de 2006. Além do sucesso sempre esperado das aventuras do espião que tem licença para matar – e se divertir com as mulheres mais sexies do planeta – a trama também entrou para a história do cinema contemporâneo por registrar algumas das melhores cenas de jogo de pôquer, como parte central do seu enredo.

A crise que vem se abatendo sobre o Brasil, nos últimos três anos, nos indica que a política, como o pôquer, não é para amadores e nem principiantes. É a vera e, a cada partida, aqueles que se arvoram a jogar podem ganhar ou perder tudo, a depender das probabilidades das cartas, mas também, da capacidade e inteligência do jogador. Também, como na política, a sorte e o acaso fazem parte do jogo, mas, decididamente, não são preponderantes para os verdadeiros profissionais.

Significa dizer que muito do que estamos vendo no cenário crítico que se desenvolve no país, a partir da capital federal, é fruto de sucessivas ações equivocadas – quando não incompreensivelmente amadoras – por parte da elite dirigente dos governos e dos partidos que sucessiva e cumulativamente vieram moldando o atual quadro de descontrole econômico e confusão política. É inadmissível supor, por exemplo, que a rápida deterioração das nossas políticas macroeconômicas seja fruto de variáveis exógenas e fora da governabilidade dos supostos policy makers que vem transitando nos ministérios da Fazenda, do Planejamento e no Banco Central e todas as demais peças do arranjo institucional responsável pela gestão da macroeconomia nos últimos cinco anos.

Do ponto de vista político a questão se revela ainda mais complexa. Fora os períodos de exceção da nossa história, nunca se viu, um governo eleito legitimamente ser desconstruído com tamanha velocidade. Por maior que seja o desejo e a mentalidade golpista por trás da grande maioria dos atores sociais que estão orquestrando a queda da Presidenta Dilma, seu governo e a hegemonia política do PT, não ha como negar o conjunto de jogadas desastrosas que muitas dessas lideranças insistiram em participar sem ter as cartas mais adequadas para enfrentar o adversário, ou pelo menos, a destreza suficiente para blefar com a mínima possibilidade de sucesso. Não se tem mais dúvidas de que a escolha de Joaquim Levy para comandar a economia e o recente processo de mudança de comando no Ministério da Justiça foram indicadores da verdadeira pane mental que vem se estabelecendo sobre o Planalto desde a vitória eleitoral de 2014.

O que nos parece que ainda não está bem internalizado por quem dirige a política e os partidos de sua sustentação é que para cada barbeiragem executada, maior a desacumulação de recursos de poder para si e maior a capitalização e acumulação de recursos de poder para seus opositores. Nesses casos, tanto no pôquer e quanto na política, o resultado no médio e longo prazo costuma ser fatal, quando não se tem a capacidade de correção de rumos, nos movimentos imediatamente posteriores aqueles que reconhecidamente leva um determinado jogador a um processo paulatino de desacumulação de força.

O caso do telefonema grampeado sobre o termo de posse do Presidente Lula e a recente saída do PMDB da base de apoio do governo, ilustram de forma inequívoca essa questão. Com efeito, da mesma forma que nós ainda não conseguimos entender o porque a Presidenta Dilma, ao começar a ser acusada pelos seus inimigos de crime de responsabilidade por cometer “pedaladas fiscais”, passa a fazer seus exercícios matinais de bicicleta, pedalando publicamente; não entendemos também o porque registrar, ao telefone, o que Lula deveria fazer ao receber um documento das mãos de um portador que poderia lhe transmitir a mesma mensagem com toda a segurança que as suas comunicações exigem. Apontamos esse fato para não precisamos relembrar do incidente diplomático ocorrido com os EUA em função de algo semelhante feito pelos sistemas de espionagem americano.

No que se refere a saída do PMDB do governo, nossa avaliação é que é simplesmente desastroso e, por mais que o discurso oficial aponte para algo positivo nesse movimento do principal partido (ex) aliado, por abrir espaço para uma reorganização da sua base de apoio (sic), não podemos, sem querermos nos autoenganar ou atentar contra a inteligência dos leitores, registrar qualquer coisa diferente do que a conformação de um desastre, tal como todo mundo entende de algo muito difícil de ser superado e, como todos os desastres, ele pode ser fatal ou não.

Ainda usando a analogia com pôquer, é impossível não perceber que a oposição ao governo tem paulatinamente se fortalecendo nessa disputa e com esse movimento do PMDB passou a jogar com dois ases, enquanto o governo tem em mãos apenas um par de dois para enfrentá-la. Ou seja, além de um jogo francamente desfavorável, ainda está a mercê de um time de distribuidores de cartas altamente viciado, formado por um juiz federal que flagrantemente está distribuindo as melhores cartas para os adversários; um presidente da câmara de deputados, responsável pela condição do processo de impeachment que não apenas frauda o jogo, como ele próprio não possui a menor legitimidade para sequer participar dele; um vice-presidente da república que simplesmente quer defenestrar a Presidenta do jogo para sempre e, por fim, mas não menos importantes, alguns ministros do supremo tribunal federal que vem tomando decisões como se o que está em disputa, são alguns coroços de feijão ou tampinhas de refrigerante das suas brincadeiras de final de semana com seus netos.

Mas não é isso! O que está em jogo é a democracia brasileira e o projeto político da centro-esquerda do país. Essa é a verdadeira disputa que está subjacente a todo o movimento que a elite conservadora vem fazendo, oportunisticamente, sob o pretexto da crise. O risco de retrocesso histórico é mais do que iminente e ao perdedor, como no filme de 007, restará chorar lágrimas de sangue.

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