Adriano Peixoto

Relações de Trabalho

Adriano de Lemos Alves Peixoto é PHD, administrador e psicólogo, mestre em Administração pela UFBA e Doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia do Trabalho da Universidade de Sheffiel (Inglaterra). Atualmente é pesquisador de pós-doutorado associado ao Instituto de Psicologia da UFBA e escreve para o Política Livre às quintas-feiras.

Democracia e Segredo

Não há dúvidas de que um dos procedimentos mais comumente utilizados para se compreender o significado do conceito Democracia é aquele que recorre à etimologia da palavra grega para, identificando sua origem, reconstruir o seu sentido. Poder do demos ou da comunidade de cidadãos. Na sua origem, essa forma de compreender a Democracia parece sugerir uma oposição à Aristocracia. Entretanto, esta referência a um corpo coletivo se presta a ser interpretado de forma pejorativa quando este corpo é confundido, como ocorreu por muito tempo ao longo da história política, com a “massa”, o “vulgo”, a “plebe” e similares.

Seja lá como for, esse tipo de recurso à origem do conceito, ainda que se constitua como um instrumento didático legítimo, tende a perpetuar um grande equívoco de substância: definir um fenômeno social complexo no presente a partir da visão limitada de sociedades tradicionais, mesmo que esta seja a Grécia de Péricles, Sólon e tantos outros. Esse tipo de procedimento desconsidera as profundas transformações no sentido e na forma que a Democracia sofreu ao longo dos anos e assume que nossa compreensão atual é igual, ou mesmo similar àquela dos antigos. Em outras palavras, ainda que em seus termos descritivos o conceito de democracia tenha permanecido, de uma perspectiva valorativa seu significado se transformou.

Um exemplo bastante eloqüente dos riscos que tal proceder comporta pode ser observado nas denominações que vários governos ditatoriais utilizaram ao longo dos anos buscando estabelecer um paralelo entre sua atuação e uma pretensa identificação com interesses populares. Afinal de contas não há regime, mesmo o mais autocrático, que não goste de ser chamado de democrático. A República Democrática da Alemanha, nomenclatura oficial da antiga Alemanha Oriental sob jugo soviético, ou ainda a República Democrática Popular da Coréia do Norte, um dos países mais fechados e atrasados do mundo hoje, são exemplos bastante claros daquilo a que me refiro. Por este motivo, ao se falar de Democracia faz-se necessário explicitar a forma como o conceito é compreendido.

Noberto Bobbio vai direto a este ponto quando indica que são muitas as definições da democracia e apresenta aquela que lhe é preferida: “poder em público”. Em assim procedendo, ele ressalta um aspecto fundamental das democracias do século XXI, que é a transparência e publicidade das ações dos governantes, o que permite aos governados verem onde e como as decisões são tomadas. Esta concepção delimita a natureza do fazer democrático na medida em que se opõe frontalmente aos procedimentos de caráter autocrático que, nas suas tentativas de se perpetuar no poder, têm uma tendência a se esconder. Esta relação entre ocultar, não revelar, esconder, que caracteriza as formas autocráticas de dominação é absolutamente contrária aos interesses da República e da Democracia contemporâneas.

Não é por outro motivo que os governos (de forte matiz autoritário) de nossos vizinhos Venezuelanos e Argentinos elegeram grupos de imprensa como seus principais inimigos. Aqui mesmo no Brasil, temos uma longa tradição de empastelamento de redações de jornais e revistas cuja origem remonta aos tempos do Brasil colônia. Essa tradição autoritária “que só gosta” do pensamento chapa branca se reatualiza, por exemplo, nas perseguições que jornalistas têm sofrido nas manifestações de rua no Rio e em São Paulo. Precisamos resistir às tentações autoritárias e reafirmar continuamente que uma imprensa livre e independente é condição necessária para a Liberdade, a Democracia e a República.

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