Adriano Peixoto

Relações de Trabalho

Adriano de Lemos Alves Peixoto é PHD, administrador e psicólogo, mestre em Administração pela UFBA e Doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia do Trabalho da Universidade de Sheffiel (Inglaterra). Atualmente é pesquisador de pós-doutorado associado ao Instituto de Psicologia da UFBA e escreve para o Política Livre às quintas-feiras.

Um quase conto de Natal

Era uma vez um diretor de uma organização que dizia que seu sonho era ser uma referência na sua área de atuação. Ele queria construir um “paraíso” que ele chamava de “Ravarde” em algum lugar na região nordeste de seu país. Seu sonho parecia perfeito e nele as feras eram mansas e passeavam em um jardim paradisíaco ao lado de outras criaturas mais inofensivas do mundo corporativo.

Ele tinha um jeito assim, tipo simpático, mas muito pouco conhecimento prático da gestão dos problemas do dia a dia que sua organização enfrentava. Ele também não possuía nenhuma concepção estratégica que orientasse a atuação do corpo funcional. Bem, se tinha ele não a compartilhou com ninguém… Não se sabe se ele tinha clareza de suas limitações, mas o fato é que ele resolveu que sua abordagem às muitas dificuldades enfrentadas no dia a dia seria tipicamente populista: ou seja, fundamentalmente suas ações se pautariam exclusivamente pela reação de seus clientes. A principal consequência dessa linha de ação era que suas decisões careciam de consistência interna variando em função das demandas que lhe eram individualmente colocadas.

Aos poucos ele foi afastando todos os técnicos (“de carreira”) e foi desmontando todos os projetos que haviam sido iniciados nas gestões anteriores sob o argumento de que precisavam ser reavaliados para adequação ao seu novo projeto. Ato contínuo, postos importantes na gestão da organização foram preenchidos por parentes e amigos “cordiais”, que sempre diziam amém a qualquer coisa que o diretor propusesse. Nos poucos encontros que ele tinha com o corpo de empregados responsável por fazer funcionar o cotidiano da organização as conversas eram sempre unilaterais não havendo espaço para pensamentos divergentes que, quando eventualmente surgiam, eram rapidamente desqualificados. Tal comportamento gerou um antagonismo, ou melhor, um descrédito da direção junto aos empregados que simplesmente tocavam suas atividades para frente na espera que dias melhores chegassem.

Como todo bom populista o diretor já gostava de um discurso e adorava falar por símbolos/metáforas como forma de tornar seu pensamento mais acessível para a plateia. Um de seus temas preferidos, curiosamente, era o significado da palavra aluno. Para o diretor, ela tinha origem no latim com a aposição do prefixo “a”, significando “sem”, à  palavra “lumen” que para ele significava luz. Assim o aluno seria um ser sem luz. Essa era o gancho para jogar os técnicos do nível operacional (os alunos) contra a gestão intermediária (os professores) já que no seu pensamento torto, os “professores” seriam os seres iluminados. Afinal, como uma gestão populista pode se manter sem um bom conflito entre grupos? Nessas ocasiões os poucos críticos que restavam aproveitavam para lembrar que havia um grande equívoco na sua fala. Origem da palavra aluno é de fato o latim, mas vindo do verbo alere que significa nutrir. Aluno seria todo aquele que precisa ser cuidado, nutrido. Assim, o sentido deveria ser o de cooperação entre os grupos e não o de oposição!… Muitos achavam que isso era apenas um pequeno e irrelevante equívoco. Eram poucos aqueles que reconheciam que no campo das ideologias essa é uma diferença abissal.

O fato é que o diretor viveu e geriu por um longo período. Durante a sua gestão todos os sinais de que alguma coisa estava errada foram solenemente ignorados e todos os que apontavam a necessidade de correção de rumos foram acusados de traição. Não se sabe ao certo como essa estória terminou. Uns dizem que ele se aposentou com glórias, louvores e condecorações. Outros dizem que ele deu um desfalque na organização, fugiu com o dinheiro e que mora feliz da vida em uma ilha paradisíaca no Caribe. De concreto, sabe-se apenas que sua organização vai mal e ela não tem podido cumprir plenamente seus objetivos sociais.

Dizem que todo conto de Natal tem um final feliz e uma moral…Não faço a mínima ideia de quais seriam eles neste caso. O que fica para mim é apenas a inspiração e o desejo de que em 2013 o populismo e a ignorância não prevaleçam entre os homens de bem.

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