23 novembro 2024
Um de cada 6 congressistas gasta parte de suas verbas de gabinete com serviços fornecidos por pessoas ou empresas que fizeram doações em suas campanhas eleitorais. Um cruzamento de dados de doações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) com os gastos da Câmara dos Deputados e Senado aponta um benefício “cruzado” de R$ 2,5 milhões distribuído entre 92 deputados e senadores aos seus doadores. Os números foram obtidos e analisados pelo Estado a partir da ferramenta Datascópio, criada pelo jornalista Claudio Weber Abramo, diretor da ONG dados.org. A plataforma atualiza automaticamente suas informações somente com bases de dados oficiais. Foram consideradas doações da última eleição nacional (2014) e os gastos da atual legislatura. Analistas ouvidos pelo Estado apontam que o pagamento por si só não é crime, mas que há o risco de que esses “gastos cruzados” possam ocultar benefícios indevidos. Outra crítica é que este tipo de apoio aos parlamentares acaba virando uma espécie de acordo comercial, sem interesse público. Em quase metade dos casos (40) identificados pela reportagem, esses doadores receberam mais do que passaram às campanhas dos parlamentares, ou seja, o valor recebido em troca de serviços foi maior do que o doado – em um dos casos, 36 vezes maior. Os serviços mais adquiridos são os de gráficas, locadoras de veículos e gastos com postos de gasolina. O senador e pré-candidato ao governo de Rondônia Acir Gurgacz aparece no topo da lista. O seu gabinete destinou R$ 392,9 mil em pagamentos a Gilberto Piselo do Nascimento, que também é seu suplente e chegou a assumir o mandato por um curto período em 2016. O valor teve como destino o aluguel de imóvel do suplente para uso como escritório político do senador. Em fevereiro, Gurgacz foi condenado a 4 anos e 6 meses de prisão em regime semiaberto e suspensão dos direitos políticos por crimes contra o sistema financeiro pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, mas segue no mandato. Nem sempre o valor gasto pelos parlamentares atinge o da doação feita. O deputado federal Weliton Prado (Pros-MG), por exemplo, recebeu R$ 416,2 mil em doações da Sempre Editora Ltda, que tem como sócio o prefeito de Betim, Vittorio Medioli (Podemos-MG). Ao menos outros dez parlamentares usaram os serviços da editora. Somente em um dos casos os gastos superaram a doação – com o deputado federal Toninho Pinheiro (PP-MG), que recebeu R$ 1,9 mil e gastou R$ 20,8 mil de sua cota com a empresa.
Estadão