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O político moderado, ainda que alinhado ao regime do Irã, Masoud Pezeshkian 06 de julho de 2024 | 11:24

Candidato moderado é eleito presidente do Irã em sinal de insatisfação com regime

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O político moderado, ainda que alinhado ao regime do Irã, Masoud Pezeshkian, superou o ultraconservador Saeed Jalili e foi eleito neste sábado (6) o novo presidente do país. O vencedor foi o único candidato reformista na disputa, e o resultado sinaliza insatisfação popular com a gestão do líder supremo, Ali Khamenei.

Após liderar o primeiro turno das eleições antecipadas em 28 de junho, Pezeshkian, obteve cerca de 53,6% dos votos no segundo turno, de acordo com os primeiros resultados oficiais. A participação no pleito foi de 49,8% da população.

O eleito afirmou que “estenderá a mão da amizade a todos”, em suas primeiras declarações após a confirmação da vitória. “O caminho que temos pela frente é difícil. Só será fácil com a cooperação, empatia e confiança de todos. Estendo-lhes a mão”, prometeu ele.

O príncipe herdeiro saudita Mohammed bin Salman saudou a eleição de Pezeshkian. “Afirmo a minha vontade de desenvolver e aprofundar as relações entre os nossos países e povos e servir os nossos interesses mútuos”, disse MbS, como é conhecido.

A sunita Arábia Saudita e o xiita Irã são grandes adversário no Oriente Médio, disputam por influência na região e aliam-se a blocos distintos no cenário de reordenamento global atual —Riad é próxima dos Estados Unidos, grande inimigo iraniano, e Teerã tem laços estreitos com a Rússia.

Os dois países, por outro lado, retomaram relações diplomáticas em 2023 após um hiato de sete anos em acordo mediado pela China.

O presidente russo, Vladimir Putin, foi outro que congratulou Pezeshkian. “Espero que suas atividades como presidente contribuam para avançar a cooperação construtiva bilateral em todas as áreas para o benefício de nossos povos amigos, no interesse de simplificar a segurança e a estabilidade regional”, afirmou o Kremlin.

Pezeshkian, 69, é médico e foi ministro da Saúde no governo de Mohammad Khatami (1997-2005). Durante a campanha, o novo presidente defendeu a retomada de negociações com o Ocidente, em especial relacionadas ao programa nuclear iraniano. Khamenei não o criticou diretamente, mas chegou a alertar eleitores em discurso para que ficassem atentos a quem vê nos Estados Unidos “a fonte do progresso”.

O médico vai suceder Ebrahim Raisi, conservador linha dura que morreu em uma queda de helicóptero em maio. Em função do episódio, ainda obscuro, a eleição foi antecipada, e o segundo turno ocorreu nesta sexta-feira (5), com um embate direto entre Pezeshkian e Jalili.

O político moderado inspira mais liberdade interna do que seu adversário, mas analistas descartam mudanças significativas, com Khamenei buscando controlar sua própria sucessão —e o destino da teocracia.

De todo o modo, a vitória de Pezeshkian surpreende. Ele foi o único reformista permitido pelo Conselho de Guardiões, órgão com 12 membros que aprova todos os candidatos a qualquer cargo no país, limitando a democracia local. Outras 74 pessoas foram vetadas. E na véspera do primeiro turno, dois políticos deixaram a disputa num esforço de última hora, mas em vão, para que o campo conservador saísse vitorioso.

Vídeos publicados nas redes sociais mostram apoiadores de Pezeshkian dançando nas ruas de várias regiões, e motoristas buzinando para comemorar a vitória. Em Urmia, cidade natal do político moderado no noroeste do país, pessoas foram filmadas distribuindo doces.

O ultraconservador Jalili foi o negociador nuclear da Presidência iraniana de 2005 a 2013, governo visto por analistas como um dos mais deletérios da história recente do país. Ex-combatente que perdeu a perna direita na Guerra Irã-Iraque (1980-88), o candidato derrotado ganhou fama pela inflexibilidade.

Ele chegou a ser descrito como “incrivelmente opaco” pelo diretor da CIA, William Burns, em suas memórias publicadas em 2019. Analistas o veem moldado pelas experiências na guerra contra o vizinho, que geraram algo próximo do fanatismo.

O pleito no Irã foi considerado um dos maiores desafios para o regime desde que o aiatolá Ruhollah Khomeini voltou do exílio na França para tomar o poder em 1979. No primeiro turno, foram às urnas 39,9% dos 61,4 milhões de eleitores potenciais, o menor índice desde a criação da República Islâmica. Mesmo a eleição de Raisi em 2021, um jogo manipulado para sua vitória, levou metade do eleitorado a votar.

O número reflete o desgaste recente do regime, que sofre com as sanções reintroduzidas pelos Estados Unidos em 2018, sob o governo de Donald Trump. Joe Biden prometia amenizar a situação, mas não houve mudanças significativas, e agora o antecessor republicano pode voltar ao poder.

Ao mesmo tempo, Khamenei asseverou sua posição endurecendo o regime. Manobrou para Raisi, um linha dura associado à morte de opositores, chegar à Presidência. O cargo, apesar de não ter a palavra final na gestão do regime, influi muito na condução de políticas internas e externas.

O símbolo desse período foi a morte na prisão de Mahsa Amini, uma mulher curda de 22 anos que havia sido detida por supostamente não usar o véu islâmico da forma que a polícia religiosa considerava correta. Isso levou a inauditas manifestações contra o governo, temperadas por insatisfação econômica.

Apesar de Raisi ter visto uma retomada devido à venda de petróleo, o custo de vida subiu —em seu governo, a carne ficou 440% mais cara, por exemplo.

Além disso, o Irã se viu no meio do turbilhão regional da guerra Israel-Hamas, na qual apoia o grupo terrorista palestino e que ameaça espalhar-se pela região, principalmente para o Líbano onde o grupo xiita Hezbollah, apoiado por Teerã, tem trocado foguetes com Israel.

Folhapress
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