30 outubro 2024
Com a experiência de quem já disputou duas vezes a Prefeitura de Salvador (2008 e 2020), o deputado estadual Hilton Coelho (PSOL) afirma ver em 2024 um cenário animador para o crescimento da pré-candidatura do seu partido, ora representada por Kleber Rosa, especialmente pelo fato de reivindicar o protagonismo como representante legítimo da esquerda e dos movimentos sociais.
Nesta entrevista exclusiva ao Política Livre, Hilton avalia que o PT “vai responder pelas consequências” de ter escolhido Geraldo Jr. como seu pré-candidato, ao tempo em que abre o jogo sobre a adesão de petistas, “que não querem renunciar à coerência de sua trajetória”, ao nome de Kleber Rosa, contrariando a decisão oficial da legenda.
Hilton também reage às declarações do ex-ministro Geddel Vieira Lima de que o MDB e o PSOL estiveram juntos em 2022 na eleição estadual, além de criticar as ameaças feitas pelo emedebista de promover uma “carnificina” caso seja atacado como forma de desgastar Geraldo Jr. De viés independente na Assembleia Legislativa da Bahia (AL-BA), Hilton Coelho revela ter uma “decepção em relação às políticas do PT no campo educacional”.
E afirma que o governo Jerônimo Rodrigues, ao contrário do que se diz nos quatro cantos sobre a personalidade do gestor, tem “uma posição extremamente “inabilidosa e muito marcada pela intransigência”. Leia a entrevista completa:
Semana passada a pesquisa Real Time Big Data apontou Bruno Reis com 65% dos votos válidos, Geraldo com 26% e Kleber Rosa com 8%. Qual avaliação o senhor faz desses números?
Primeira coisa que precisamos considerar é que existem duas grandes máquinas atuando em benefício de suas respectivas candidaturas – a máquina da Prefeitura municipal e a do governo do Estado. A máquina da Prefeitura vai precisar desacelerar em função da legislação eleitoral, ou seja, foi encerrado o prazo, a possibilidade das inaugurações e, por outro lado, a máquina do governo do Estado atua na cidade de Salvador com algum nível de limite. Mas apesar do poder dessas duas máquinas, a candidatura de Kleber se mantém num patamar de representatividade entre a população que credencia qualquer leitura de que mobilizar esses quase 10% ou, na margem de erro, 10% da população de Salvador pode se transformar, pode ter como resultado uma campanha muito vigorosa, que é a característica de campanhas do PSOL e da Rede Sustentabilidade. Campanhas baseadas não em grandes estruturas, mas em largos processos de adesão da população de maneira espontânea e, principalmente, através das posições de movimentos sociais. Kleber e Dona Mira têm falado sobre demandas muito legítimas e isso tem feito com que, ao nosso ver, segmentos expressivos da categoria, especialmente formadores de opinião, venham se posicionando. Então, nosso objetivo, a partir desses números, é, primeiro, considerar que começamos num patamar muito expressivo e que a característica dessas pessoas que fizeram a opção pela candidatura de Kleber está marcada por um potencial enorme de disputa pelo crescimento da nossa candidatura. Em síntese, não temos máquinas, mas o nível de adesão, de consciência e de motivação pela candidatura de Kleber tem crescido e isso pode ter resultados que venham a surpreender as pessoas que entendam a política como a repetição de fórmulas conservadoras. Não é o nosso caso. Nós acreditamos que a candidatura de Kleber pode e vai crescer e que ao final desse processo eleitoral, a cidade pode finalizar o processo reconhecendo uma representação de fato legítima dos seus melhores interesses e motivações.
Recentemente o senhor fez declarações sobre Geddel e ele rebateu dizendo, entre outras coisas, que o PSOL e o MDB estavam juntos no mesmo palanque em 2020 na eleição do governador Jerônimo. Como é que o senhor reage a isso?
O PSOL não esteve ao lado do MDB no processo eleitoral passado. Vamos recordar que nós tivemos candidatura própria de Kleber Rosa e de Ronaldo Santos, que realizou um trabalho muito interessante afirmando uma personalidade muito significativa a ponto de chegarmos ao segundo turno como uma força decisiva. Para realizar que tarefa? A primeira, contribuir para que uma espécie de carlismo renovado não fosse vitorioso no processo eleitoral e principalmente que a Bahia se tornasse um cenário de divisão de votos entre as candidaturas de Lula e de Bolsonaro. Nosso objetivo foi que a Bahia fosse o palco de uma realização inversa que seria de uma derrota fragorosa de Bolsonaro no nosso Estado e isso aconteceu. Tanto a primeira tarefa, que foi de derrota do carlismo renovado, assim como, e principalmente, uma vitória muito expressiva de Lula se realizaram, o que foi determinante também para que a gente tivesse uma Presidência da República que viesse a tornar o governo Bolsonaro uma experiência do passado na história do nosso país. Portanto, a desconsideração desses elementos, do perfil das duas candidaturas, tanto de Lula, do que estava em jogo nacionalmente, como o perfil da candidatura de Jerônimo, é uma falsificação da realidade. Tentando materializar a diferença do cenário pintado pelo ex-ministro e o que se desenhou de fato, eu diria que Geraldo Jr. e o MDB nunca seriam alternativas para o PSOL em relação ao futuro do governo do Estado da Bahia. Então, apoiar Lula e Jerônimo é muito diferente de estar ao lado do MDB e apoiar, portanto, a sua candidatura a quaisquer cargos, uma candidatura como Geraldo Jr.
Ainda sobre Geddel, ele disparou ameaças contra o prefeito Bruno Reis e disse transformar a campanha numa “carnificina” caso seja atacado como forma de desgastar seu candidato, Geraldo Jr. Como vê essa manifestação?
Bom, é uma metáfora dantesca. O que viria a ser uma carnificina política, senão um conjunto de situações reveladas, com um nível de consequências profundas e ao mesmo tempo chocantes para toda a sociedade. Nós não podemos entender de outra forma. Eu obviamente não deixo de acreditar que o ex-ministro tenha elementos nesse sentido, já que Bruno Reis é de fato um afilhado, do ponto de vista da origem política, a Geddel Vieira Lima. Vamos recordar que Bruno Reis foi filiado ao MDB de Gedde e, nesse sentido, foi ele quem inseriu Bruno Reis no circuito desse campo político e foi a partir daí que ele ganhou espaço e acabou por se tornar prefeito da cidade de Salvador. Então, de fato, ele deve saber muito considerando o perfil dessa gestão e a própria natureza das concepções de Bruno Reis. O outro lado da moeda é nós entendermos que, sob a batuta de Geddel Vieira Lima, Geraldo Júnior precisa de ameaça, da prática de ameaças e de chantagens para tentar segurar também o seu telhado de vidro. Então o telhado de vidro gigantesco ao meu ver de Bruno Reis, que é ameaçado por Geddel, e ao mesmo tempo de Geraldo Jr., que precisa que Geddel ameace Bruno Reis para tentar preservar minimamente a sua imagem. Mas a grande questão que está colocada ao meu ver aí é se a população de Salvador vai optar por um afilhado de Geddel Vieira ou vai afirmar a representação legítima da nova política que é o companheiro Kleber Rosa, acompanhada da maravilhosa companheira Dona Mira. Essa aqui é a questão. O resto é jogo de chantagem, é a velha política, em relação à qual a cidade de Salvador precisa ter uma posição firme, corajosa e atenta de negar.
Em São Paulo, o PSOL tem a pré-candidatura de Guilherme Boulos com franco apoio do presidente Lula. O PSOL de Salvador também deve reivindicar esse apoio? Até então Geraldo Jr. tem se apresentado como o candidato de Lula.
O PSOL apoiou a candidatura de Lula a partir do objetivo de derrotar a extrema direita representada pela alternativa Jair Bolsonaro nas eleições passadas. Aqui em Salvador o PT poderia ter optado por apoiar uma candidatura de esquerda com um programa popular e com uma trajetória legítima em defesa dos interesses da maioria da população, hoje representado na candidatura do companheiro Kleber Rosa e Dona Mira. No entanto, não fez essa opção. Nós somos obrigados a reconhecer que eles têm autonomia, fizeram a opção para uma candidatura nitidamente conservadora e vão trilhar o caminho e responder pelas consequências disso. O nosso caminho é outro. Nosso caminho é de uma prática e de uma afirmação de posições políticas no campo popular e nesse sentido caminharemos, continuaremos a caminhar de cabeça erguida por todo o processo eleitoral e para além dele.
Mesmo com o apoio formal do PT a Geraldo Júnior (MDB), alguns setores do partido têm se aproximado e sinalizado apoio a Kleber Rosa, sob a visão de que ele é o verdadeiro representante da esquerda nesta eleição. Como tem sido a recepção a esses petistas?
Tem sido a melhor possível, já que se trata de companheiros e companheiras que não querem renunciar à coerência de sua trajetória, seja do ponto de vista político, seja do ponto de vista ideológico. Então, debates ricos têm sido realizados sobre os mais diversos aspectos do programa e a nossa expectativa é que esses laços se fortaleçam cada vez mais para que as decorrências se efetivem, inclusive, para além do próprio processo eleitoral, especialmente em intervenções e contribuições nos movimentos sociais. Então, tem sido muito frutífero e animador perceber o quanto a candidatura de Kleber e Mira tem ampliado para além dos limites do PSOL e da Rede Sustentabilidade. E principalmente pensar na força política que se anuncia como resultado dessa relação tão profícua.
Nove meses depois do início da gestão, o PSOL anunciou que estava entregando cargos e saindo da base governista. Foi um erro participar do governo Jerônimo?
Bom, a primeira coisa a ser dita é que o que foi autorizado pelo Partido Socialismo e Liberdade, no que se refere à participação do governo de Jerônimo, foi no conselho político. Em um espaço, portanto, que era um espaço de ouvir as posições do Partido Socialismo e Liberdade, e a partir dessa escuta tentar fazer com que o governo tivesse um perfil de transformação em um conjunto de posições que vinham sendo materializadas nas experiências, ao nosso ver, negativas do governo, especialmente das gestões de Rui Costa, mas também de Wagner. A condição para o apoio no segundo turno foi, portanto, não que o governo tivesse a participação de membros do PSOL ocupando cargos, mas que o governo ouvisse as posições do PSOL em conjunto de áreas que são extremamente sensíveis em relação à questão da segurança pública, em relação à questão ambiental, à educação e à saúde no estado da Bahia. Infelizmente isso não aconteceu. Primeiro, alguns militantes, sob argumento de estar cumprindo principalmente uma função técnica, assumiram pequenos cargos no governo e, por outro lado, o governo Jerônimo se mostrou extremamente impermeável às leituras que o PSOL vinha fazendo sobre esses pontos que são muito sensíveis e caros ao nosso partido. Portanto, a posição do PSOL foi muito explícita, dizendo aos militantes que entraram sob argumento técnico que eles não poderiam permanecer nos cargos, se quisessem ser entendidos pelo partido e pela sociedade, portanto, como membros do PSOL. Então, nós deliberamos pela saída imediata desses militantes ou suspensão, alguns foram suspensos porque permaneceram nos cargos, e ao governo nós dissemos que não existia mais sentido em participar de um conselho onde simplesmente o PSOL não era ouvido. Então, foi essa a posição política que marca obviamente uma posição mais crítica ao governo de Jerônimo, ainda que nós venhamos a fazer uma aposta em relação a elementos pontuais que têm um certo significado, mas o momento político exigiu essa atitude como mais uma demonstração de coerência do PSOL. Não queremos cargos que não tenham sentido político e não queremos participar de conselhos que não são ouvidos. Por isso, essas posições.
O senhor tem tido atuação destacada na Assembleia Legislativa da Bahia em pautas espinhosas para o governo, como a dos precatórios e a reestruturação da Defensoria Pública da Bahia. Como avalia a condução do governo nessas matérias?
Nossa avaliação sobre a atuação do governo em relação a essas pautas é que o governo tem tido uma posição extremamente inabilidosa e muito marcada pela intransigência. Em relação aos precatórios do Fundef, o que nós vimos foi o governo que, diferentemente de outros estados, simplesmente ficou com parte dos recursos que de maneira legítima deveriam ser repassados para a categoria, o que marca uma decepção muito grande porque a expectativa que a categoria e a sociedade tinham, já no início do governo, era que em tendo um governador educador e uma secretária de educação também educadora, nós teríamos um novo momento para a educação na Bahia, inclusive do ponto de vista do respeito aos segmentos dos profissionais da educação, o que não aconteceu. Infelizmente foi um episódio lamentável em que a categoria teve mais um prejuízo e principalmente mais uma decepção em relação às políticas do PT no campo educacional. É preciso mudar profundamente essa trajetória. E em relação à Defensoria Pública, ao nosso ver, o governo acabou adiando muito essa votação, gerando uma situação de desgaste na afirmação de uma instituição que é central para a defesa especialmente da população mais vulnerável do estado da Bahia. A Bahia tem um Índice de Desenvolvimento Humano que a coloca nas últimas colocações, apesar de ser a sexta economia do país, e a correção desse rumo passa necessariamente por uma instituição tão significativa para essa população mais oprimida, que é a Defensoria Pública, por isso nós não poupamos esforços desde o momento em que o governo retirou, a base do governo retirou da pauta no final de 2023, o PLC 154 de 2023, nós fomos muito taxativos ocupando a tribuna e falando da necessidade que o projeto voltasse para a pauta e que fosse votado. E de lá para cá foram meses numa espécie de cabo de guerra entre, como eu disse, os interesses dessa população mais vulnerabilizada e uma posição marcada pela intransigência do governo. Felizmente, no final das contas o projeto foi aprovado, acho que o governo ainda que de maneira tardia comemora e principalmente defensores e defensores públicos tiveram uma grande vitória política, nós temos orgulho muito grande de ter participado ativamente dessa vitória.
Política Livre