Foto: Divulgação/Arquivo
Fabiane Almeida e Ana Patrícia 09 de outubro de 2024 | 10:35

Advogada criminalista aponta omissão da OAB-BA na luta contra o racismo estrutural no Judiciário baiano

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A advogada criminalista Fabiane Almeida, considerada uma das maiores referências na advocacia criminal brasileira, disse nesta segunda-feira (7) que a Ordem dos Advogados da Bahia (OAB-BA) tem sido omissa e pouco incisiva no combate à violação de prerrogativas da advocacia baiana.

“Falta representar criminalmente contra os abusadores que violam as prerrogativas”, diz Fabiane. “Um simples desagravo, ir pra porta do Judiciário, da corregedoria ou de uma delegacia não faz com que cessem as ofensas. É preciso que essas pessoas sejam representadas criminalmente”, reforça a advogada, que ingressou nos quadros da Ordem dos Advogados e Advogadas da Bahia (OAB-BA) em 2012.

Fabiane defende também que, além de representar criminalmente contra todos aqueles que violam as prerrogativas da advocacia, é preciso que a Lei 13869, que trata do abuso de autoridade, seja utilizada nessas representações. “Como essa lei tem sido pouco utilizada, nós a chamamos de lei nova, embora ela seja de 2019”, explica Fabiane, que ao longo de sua trajetória profissional teve de encarar, por ser negra, diversas situações abusivas. Em 2013, por exemplo, quando advogava em defesa de um cliente acusado de crime de extorsão e estelionato, foi decretada a prisão preventiva desse cliente com a justificativa de não terem encontrado o endereço dele para citação.

“Entrei com um pedido de revogação da prisão preventiva e fui despachar com a magistrada. Cumprimentei a todos no cartório e, ao entrar na sala de despacho, a juíza pediu que eu me retirasse alegando que não despachava com as partes. No mesmo momento, eu disse a essa magistrada ´vamos parar com essa palhaçada que a advogada aqui sou eu e vim tratar do pedido de revogação do meu cliente`. Esse foi um dos primeiros impactos que eu tive na advocacia baiana”, recorda.

Antigamente, as estudantes de Direito se apaixonavam pelo direito penal, ao longo do curso, mas casavam com o direito civil no momento da formatura. Nos últimos anos, vem aumentando a cada dia o número de mulheres que “se casam” com o direito penal, numa mudança cultural que pode transformar, para melhor, o cenário jurídico no País, principalmente no que se refere à defesa das prerrogativas de advogados e advogadas.

Fabiane conta que sofreu por muitos anos, e ainda é obrigada a confrontar, o racismo institucional e estrutural no Judiciário baiano. “Várias vezes fui barrada pelos seguranças quando tentava entrar no Fórum ao lado de um colega advogado, branco. Esse colega me puxava pela mão para que eu não enfrentasse o constrangimento. A mulher preta aqui na Bahia é sempre confundida com a ré, nunca a veem como advogada”, ressalta.

Muitas vezes, em delegacia, Fabiane foi tratada como criminosa, sendo até chamada de meliante, quando estava defendendo uma cliente branca. “Sempre achavam que a cliente branca era a advogada”. Para ela, as mulheres magistradas são mais racistas do que o homens nos tribunais, enquanto os homens delegados, nas delegacias, são mais racistas do que as mulheres delegadas.

Em 2014 Fabiane foi convidada para participar da Comissão da Verdade da OAB-BA, ingressando para os quadros das comissões. Em 2016, convidada pela então vice-presidente da OAB-BA, Ana Patrícia, Fabiane passou a ser Conselheira Seccional da instituição, mas deixou o cargo na gestão passada. Ela foi também presidente da Comissão de Direito Militar, diretora de Prerrogativas, participou da comissão estadual e nacional do Sistema Prisional e Segurança Pública.
“Sempre defendi meus colegas em mesas de audiência. Eu pensava que não mais seria violada racialmente por nenhum magistrado, mas em 2022, durante a pandemia, eu estava com dois colegas em uma audiência, quando uma juíza, que me conhecia por vários processos, esqueceu que eu estava ali como advogada e me tratou como se a ré eu fosse. O sistema jurídico é seletivo e coloca sempre a mulher advogada preta na condição de ré”.

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