9 maio 2025
Um dos líderes petistas mais ligados à Igreja Católica, o ex-ministro Gilberto Carvalho diz ter esperança que o sucessor do papa Francisco seja um moderado, mas teme uma articulação da direita mundial para emplacar o novo pontífice.
“A direita internacional, que tem uma relação com certos setores neofascistas da igreja, vai jogar muito pesado, mais do que nunca. Mas eu tenho expectativa de que isso não vai prevalecer, que tenhamos um papa moderado”, diz Carvalho, atualmente secretário de Economia Solidária do Ministério do Trabalho.
Segundo ele, Francisco foi hábil ao nomear cardeais próximos de sua ideologia, que agora decidirão pelo novo comandante da igreja.
“Francisco juntou o pensamento progressista com atitudes muito humanas. A gente espera, em razão da nomeação de cardeais, que haja continuidade em questões essenciais, como combate à fome e foco no social. Talvez venha um papa não como ele, mas ao menos moderado”, afirma. Ele dá o exemplo de Paulo 6º , considerado moderado, que substitui o progressista João 23, em 1963.
Nos dois primeiros governos Lula, de quem é amigo próximo, Carvalho exerceu a estratégica função de chefe de gabinete da Presidência.
Já sob Dilma Rousseff, foi ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência e, nessa condição, um dos responsáveis pela organização da vinda de Francisco ao Rio de Janeiro em julho de 2013, quando ele tinha poucos meses de papado, para a Jornada Mundial da Juventude.
Naquele momento, o estilo informal de Francisco ainda causava espanto, e acabou gerando reclamações da própria Dilma pela questão da segurança.
“Em visitas do papa, o país que recebe é responsável pela segurança. Nós mandamos um avião da FAB buscar o papamóvel [veículo blindado], mas o Francisco não quis. A Dilma, quando soube, disse que o papa era demagogo, irresponsável, podia levar tiro”, lembra Carvalho, que foi obrigado a contraditar a presidente numa reunião.
“Pela primeira vez eu a enfrentei e disse que o papa não era demagogo, era um estilo novo que estava chegando. Ela respondeu que eu só dizia isso porque eu era ‘igrejeiro’”, recorda-se.
Depois de conhecê-lo pessoalmente, no entanto, a então presidente se rendeu aos hábitos do papa. “Eles tiveram uma proximidade e ficaram amigos de verdade”, afirma Carvalho.
Da mesma forma, Lula também ficou um pouco desconfiado das intenções do papa no início, diz o ex-ministro. A relação só esquentou quando o pontífice enviou um bilhete para o petista em 2018, quando ele cumpria pena em Curitiba.
Carvalho, na ocasião, foi o responsável por intermediar, via uma pessoa próxima ao papa em Roma, o contato com o líder religioso.
“Foi feita uma carta para o papa em nome do Lula preso. Fui a Roma, entreguei a uma pessoa íntima dele. Passados dois meses, quando achei que o bilhete tinha se perdido, recebi um telefonema da Nunciatura [embaixada do Vaticano no Brasil] e a resposta do Francisco”, recorda-se.
Havia um problema, no entanto, porque a exigência do Vaticano era que a missiva não fosse divulgada, contrariando as expectativas dos aliados de Lula.
O jeito foi recorrer ao político argentino de esquerda Juan Grabois, amigo de Francisco, que obteve pessoalmente do pontífice autorização para que a mensagem viesse a público. “Para não melindrar a Nunciatura, vazamos a carta na Europa”, diz Carvalho.
Depois desse gesto, Lula e o papa se aproximaram, até porque tinham pautas comuns, como o combate à fome. Francisco era grande apoiador da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza, bandeira do presidente e da primeira-dama, Janja.
Também houve uma sintonia entre o estilo de ambos, muito informal e caloroso.
“O princípio que o papa tinha era de uma humanidade à flor da pele. Ele rompeu barreiras em questões com direitos das mulheres, dos gays, dos trans, na questão ambiental. Outro igual ao papa Francisco acho que não teremos”, diz Carvalho.
Fábio Zanini, Folhapress