Foto: Joédson Alves/Agência Brasil/Arquivo
Manifestação pró-anistia na capital federal 12 de maio de 2025 | 17:45

Bolsonaristas tentam retomar controle sobre anistia do 8/1 após ato, UTI e ação de Alcolumbre

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Após três semanas de internação de Jair Bolsonaro (PL), os aliados do ex-presidente tentam retomar o controle da pauta da anistia do 8 de Janeiro e não deixar o assunto esfriar.

Desde que Bolsonaro foi parar na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do DF Star, em Brasília, para desobstruir o intestino – problema decorrente da facada da qual foi vítima em 2018 –, a articulação pela anistia havia perdido força.

Nesse meio tempo, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) tomou a pauta para si, o que fez as conversas desacelerarem. Ele pretende apresentar um novo projeto para reduzir a pena dos bolsonaristas do 8 de Janeiro. O texto está sendo negociado com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e com o Supremo Tribunal Federal (STF) – o que desperta suspeita em parlamentares do PL.

O movimento foi feito após Motta ser pressionado a avançar com o projeto, uma vez que os bolsonaristas tinha conseguido o número mínimo de assinaturas (257) para votar o requerimento de urgência da proposição. O texto está sendo analisado pelos consultores legislativos no Senado, e não há prazo para ficar pronto.

Bolsonaristas veem a ação de Alcolumbre como “protelatória” e se queixam de não terem sido ouvidos para a elaboração do texto. O líder da oposição na Câmara, Zucco (PL-RS), afirmou à reportagem não confiar em Alcolumbre para encampar esse tema. O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder da bancada, segue na mesma linha:

“Estão dizendo que tem um texto (feito) por gente que não deveria fazer, que é o STF, com o Senado. Já começa errado. Se fizer isso, o próprio STF vai dizer que o golpe não existiu, ao rever penas que ele mesmo deu”, declarou o deputado na semana passada.

O senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), por sua vez, afirmou não ter interesse em redução de penas articulada por Alcolumbre, e sim na anistia completa: ”Não foi esse o compromisso que o então candidato teve conosco, da oposição. O nosso compromisso com ele, que ele nos deu a palavra, é que se tivéssemos as assinaturas suficientes pra levar essa pauta para plenário, e inclusive os votos pra aprovar um projeto da anistia, seria de incumbência da oposição”, afirmou.

Aliados de Bolsonaro voltaram na última semana a soprar as brasas da pauta da anistia. A Câmara aprovou na quarta-feira, 7, um projeto que suspende o processo penal por tentativa de golpe contra o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ) no STF. A decisão também beneficia Bolsonaro e outros 32 denunciados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) por atos golpistas.

O projeto, no entanto, não deverá ter efeitos práticos. Ministros da Cortes consideram que a iniciativa extrapolou o que está previsto na legislação, e a Primeira Turma formou maioria na sexta-feira, 9, para derrubar parcialmente a decisão. De qualquer forma, a aprovação do texto na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) foi comemorada em tempo real pelos bolsonaristas que, naquele instante, marchavam em Brasília rumo ao Congresso.

“Agora na CCJ acabou de ser votado o trancamento da ação penal contra o deputado Ramagem. Nós vencemos! Quarenta e quatro votos a 18 da esquerdalha. Viva o Brasil! Agora é no plenário”, discursou Sóstenes, ao lado de Bolsonaro e outros parlamentares, do alto do carro de som que guiou a manifestação pró-anistia na capital federal.

O ato foi feito para pressionar as demais autoridades a aprovar o perdão aos seus apoiadores presos nos ataques aos Três Poderes em 2023 – movimento que pode beneficiar o ex-presidente, réu no STF por tentativa de golpe de Estado e tornado inelegível pela Justiça Eleitoral por ataques à democracia.

Descumprindo recomendação médica três dias após sua alta, Bolsonaro discursou no ato, que reuniu 4 mil pessoas na Esplanada dos Ministérios de acordo com levantamento de pesquisadores da USP, que se o projeto for aprovado no Congresso não poderá haver qualquer contestação dos demais Poderes.

“Anistia é um ato político e privativo do Parlamento brasileiro. Se o Parlamento votou, ninguém tem que se meter em nada, tem que cumprir a vontade do parlamento, que representa a vontade da maioria do povo brasileiro”, declarou Bolsonaro.

O argumento deu o tom central dos discursos daquela tarde. “Anistia é exclusiva do Poder Legislativo, STF não pode meter o bedelho. O STF pode condenar a 200 anos quem ele quiser. Acabou, a partir daí é Congresso Nacional”, discursou o pastor Silas Malafaia, organizador do protesto.

Até Bolsonaro ser internado, a pauta da anistia avançava sem concorrência no noticiário. A crise gerada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelos descontos irregulares no Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), no entanto, levou a uma mudança de rota no bolsonarismo.

Nos últimos dias, lideranças do Partido Liberal (PL) passaram a centrar esforços em fazer o governo federal sangrar com o escândalo, enquanto a articulação pela anistia dos envolvidos no 8 de Janeiro perdeu gás.

O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), por exemplo, publicou um vídeo atacando o governo pela crise no INSS que monopolizou as atenções. O vídeo alcançou 134 milhões de visualizações no Instagram até a tarde desta sexta-feira – e acendeu um alerta no governo, que se preocupa com um estrago parecido ao da crise do Pix no começo do ano, quando o parlamentar também entrou em campo para detonar Lula nas redes sociais.

Em meio a um bate-cabeças para mitigar os estragos do escândalo, o discurso adotado pelo Palácio do Planalto tem sido reiterar que as irregularidades começaram em 2019, primeiro ano do mandato de Bolsonaro, e que seu governo foi responsável por identificá-las.

“Na última semana, o nosso governo, por meio da Controladoria-Geral da União e da Polícia Federal, desmontou um esquema criminoso de cobrança indevida contra aposentados e pensionistas, que vinha operando desde 2019. Determinei à Advocacia-Geral da União que as associações que praticaram cobranças ilegais sejam processadas e obrigadas a ressarcir as pessoas que foram lesadas”, afirmou Lula em pronunciamento em rede nacional em 30 de abril.

Guilherme Caetano/Estadão
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