20 maio 2025
O governo federal poderá economizar até R$ 128,35 bilhões até 2029 se adotar as regras estabelecidas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) para controlar o crescimento das emendas parlamentares. Os cálculos foram feitos pelo jornal O estado de São Paulo e comparados com as estimativas apresentadas pelo Executivo no Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026.
De acordo com decisões do ministro Flávio Dino, que foram referendadas pelos colegas, as emendas totais, incluindo as de gasto impositivo e não impositivo, não podem crescer mais do que o menor de três critérios: a variação das despesas discricionárias (não obrigatórias) do Executivo, o limite de crescimento arcabouço fiscal (0,6% a 2,5% acima da inflação) ou a variação da Receita Corrente Líquida (RCL).
Ao enviar o PLDO, no entanto, o Executivo ignorou os critérios mais rígidos estabelecidos pelo STF. O Ministério do Planejamento afirmou à reportagem que o projeto de diretrizes orçamentárias de 2026 segue a lei aprovada pelo Congresso em outubro do ano passado com regras para a execução de emendas parlamentares. Pela norma, emendas individuais e de bancada podem crescer de acordo com o limite do arcabouço. As emendas não impositivas, em linha com a inflação.
Segundo o PLDO, as emendas individuais e de bancada, cujo pagamento é impositivo, cresceriam em média 4,94% ao ano, em termos nominais, de 2026 a 2029. Descontando a inflação estimada pelo governo no período, a alta média seria de 1,04%. As emendas de comissão, que não são impositivas, avançariam em média 3,88% ao ano nesse mesmo intervalo, em linha com a estimativa de IPCA usada pelo governo no texto.
O Planejamento disse que a situação será reanalisada à luz de decisões judiciais na apresentação do Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2026, previsto para agosto. “No PLDO foi incluído o valor completo, com o objetivo de transparecer os efeitos possíveis das emendas na repartição de recursos. No PLOA 2026 (que será apresentado até 31 de agosto) a situação será avaliada à luz do cenário atualizado, garantindo atendimento da legislação e decisões judiciais”, afirmou a Pasta, em nota.
Economia que o governo poderia fazer
Enquanto as emendas crescem, o PLDO prevê que as despesas discricionárias vão diminuir, em média, 43,19% ao ano entre 2026 e 2029, de R$ 208,284 bilhões no ano que vem para R$ 8,852 bilhões no fim do período. Por isso, qualquer reajuste para cima no montante destinado às emendas faria com que esses pagamentos superem com folga os gastos não obrigatórios do governo. Pelo projeto, elas seriam de R$ 61,679 bilhões no fim da década – quase sete vezes o total das discricionárias.
Em contrapartida, se a regra do STF for cumprida integralmente – ou seja, com diminuição no limite orçamentário para as emendas na mesma magnitude da queda das despesas discricionárias -, o montante destinado a esses pagamentos cairia a R$ 2,237 bilhões até 2029. Nesse cenário, a economia acumulada de 2026 até 2029 atingiria R$ 128,350 bilhões.
“As despesas discricionárias são o meio que a chapa eleita tem de alocar novas iniciativas de políticas públicas, fazer valer sua plataforma eleitoral, e isso representa menos de 5% do orçamento”, diz o economista João Leme, analista e especialista da área fiscal da Tendências Consultoria. “A trajetória atual deixa de ser sustentável por um longo período de tempo e o STF, Executivo e Legislativo têm um grande trabalho pela frente em encontrar consenso de como seguir adiante”, afirmou.
Para Marcus Pestana, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, as emendas são uma alocação legítima de recursos por parte parlamentares eleitos pela sociedade e não há diferença de qualidade em relação aos valores destinados pelo Executivo. “O problema é que temos o orçamento mais engessado do mundo. Uma coisa é o crescimento do valor das emendas nos últimos anos, e outra coisa é a redução brusca das discricionárias”, afirmou.
Marina Atoji, diretora de Programas da Transparência Brasil, afirma que a entidade vai questionar o descumprimento das decisões do Supremo sobre o crescimento das emendas. Ainda não há uma data prevista para a manifestação. “É essencial rever e limitar o crescimento do volume de recursos da União que o Legislativo tem sob seu poder, para que o planejamento e a execução orçamentários voltem a ser coesos. Infelizmente, não há indícios de que os próprios Congresso e Executivo, que deveriam tomar essa iniciativa, farão isso”, disse.
Apesar de a Corte ter definido uma trava para o crescimento das emendas, a proporção que elas ocupam no orçamento ainda não foi debatida no Supremo. Mas o tema é alvo de ação movida pelo PSOL, e o ministro Flávio Dino já antecipou em outubro do ano passado que o assunto deve andar em 2025. “Nós temos uma evolução que faz com que despesas com emendas, que nos países que praticam giram em torno de 1%, cheguem no Brasil a 20%?”, declarou na ocasião.
Lavínia Kaucz/Cícero Cotrim/Estadão