Foto: Divulgação/CBF
O presidente da CBF, Ednaldo Rodrigues 14 de maio de 2025 | 19:35

Parlamentares propõem 3 CPIs contra Ednaldo Rodrigues no Congresso; fritura mira também Gilmar Mendes

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Sob a batuta da oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deputados e senadores têm mobilizado o Congresso Nacional contra o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Ednaldo Rodrigues. O grupo quer tirar proveito do desgaste da imagem de Ednaldo, imerso em suspeitas e acusações, para alcançar também o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, decano da Corte.

Aliado de Ednaldo, Gilmar foi o responsável pela decisão monocrática que reconduziu o presidente da CBF ao comando da instituição após o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) ter ordenado o seu afastamento. O ministro também mantém relações comerciais e pessoais com o presidente da confederação, mas em nenhum momento durante a tramitação do processo se declarou impedido de julgar o caso ou de atuar como relator. Procurados, Gilmar e Ednaldo não quiseram se manifestar. Parlamentares envolvidos na articulação defendem apuração do caso.

“A gente naturalmente tem essa dúvida (sobre a relação de Ednaldo e Gilmar). Nós queremos saber o que está acontecendo”, disse o senador Eduardo Girão (Novo-CE), ao jornal O Estado de São Paulo.

Essa fritura está organizada principalmente na criação de Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs) para investigar a entidade e a realização de audiência pública para que Ednaldo possa prestar esclarecimentos aos parlamentares.

O grupo organiza a instalação de uma CPI na Câmara dos Deputados, sob responsabilidade do deputado Sargento Gonçalves (PL-RN); uma CPI no Senado Federal, sob tutela de Eduardo Girão e uma CPI Mista, com deputados e senadores, organizada por Coronel Meira (PL-PE).

Para abrir uma CPI, é preciso reunir 171 na Câmara, 27 no Senado, e, no caso de uma CPI mista, obter esse mesmo número de apoio por parte de deputados e senadores. O número ainda não foi alcançado em nenhum dos três requerimentos até o fechamento desta reportagem, mas a adesão tem crescido nos últimos dias.

Internamente, a equipe do Sargento Gonçalves teme o “lobby da CBF” para blindar Ednaldo no Congresso. Esse lobby já atuou contra Gonçalves na Câmara na última semana (leia sobre mais abaixo). Procurados, o deputado e o senador Carlos Portinho (PL-RJ) também defenderam a apuração das denúncias envolvendo a CBF.

Quem está mais perto de alcançar o número mínimo é Girão. Até a tarde da segunda-feira, 12, já havia 17 adesões, mais da metade do necessário, incluindo Ciro Nogueira (PP-PI), um dos principais aliados da CBF na CPI que investigou a entidade, em 2016. Questionado sobre a assinatura, ele disse ter retirado.

O texto apresentado pelo senador Girão mira a relação entre Ednaldo e Gilmar por meio do contrato de cooperação técnica que une o Instituto de Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP), do qual o ministro do STF é sócio, e a CBF. A parceria comercial entre as duas instituições faz parte da CBF Academy, que é o braço educacional da Confederação por meio do qual oferta cursos de formação na área do esporte.

“Se Ednaldo não aceitar (o convite da Comissão), a coisa vai ficar mais feia ainda. Mostra o desrespeito pela Casa e que tem coisa escondida”, disse Girão.

“Tais fatos que apontam para interesses privados de alta monta, levantam sérias dúvidas sobre a isenção e a imparcialidade do Ministro na condução do processo que afetava diretamente a permanência de Ednaldo Rodrigues na presidência da CBF”, argumentou Girão na justificativa para instalação da CPI.

“A proximidade temporal entre a assinatura do contrato e a decisão do STF, que beneficiou o atual mandatário do futebol brasileiro, agrava sobremaneira a suspeita de conflito de interesses e a potencial influência da relação comercial na decisão judicial”, completou.

No Senado, Girão ainda conseguiu emplacar a criação de uma audiência pública na Comissão de Esporte que irá convidar Ednaldo para falar de uma possível “conduta irregular” no comando da CBF e de suposto “conflito de interesses” entre ele e Gilmar.

“A gravidade da situação reside não apenas nas alegações em si, mas também no impacto que elas podem ter sobre a credibilidade da CBF. A entidade, embora de natureza privada, exerce uma função social de extrema relevância para o País”, argumenta Girão.

O acordo que manteve Ednaldo na CBF passa por um questionamento. Uma perícia indica que uma das assinaturas é falsa. A análise é sobre a assinatura de Antônio Carlos Nunes de Lima, o coronel Nunes, ex-vice-presidente da CBF e que foi presidente interino da entidade em duas ocasiões. A inspeção foi feita pela perita Jacqueline Tirotti, a pedido do vereador do Rio Marcos Dias (Podemos).

Na Câmara, a “bancada da bola” conseguiu frear o ímpeto da oposição. O grupo, capitaneado por José Rocha (União Brasil) conseguiu retirar de pauta uma audiência que convidaria Ednaldo e outros envolvidos no caso da suposta falsa assinatura.

“Qual outro motivo, senão um lobby por parte da entidade de frear essa audiência pública?”, questionou Gonçalves. “O lobby que a CBF faz nessa Casa é impressionante. É triste”, afirmou Luiz Lima (Novo-RJ). “A pressão que a CBF tem nessa Câmara e até no STF é vergonhosa”.

A reportagem apurou que Gilmar tem acompanhado a crescente fervura contra Ednaldo e que o atinge colateralmente. O ministro tem dito que é preciso aguardar o desenrolar dos fatos. Um senador ligado ao futebol afirmou em conversa reservada com a reportagem que ouviu de diferentes interlocutores que há um processo de distanciamento do ministro em relação ao seu aliado na CBF, tendo em vista o cerco da oposição.

Na última quarta-feira, 7, Gilmar negou monocraticamente dois pedidos de afastamento imediato de Ednaldo do comando da CBF. As petições contra o presidente da entidade foram apresentadas pela deputada federal Daniela do Waguinho (União Brasil-RJ) e pelo vice-presidente da CBF, Fernando Sarney, com base na perícia, feita a pedido do vereador carioca Marcos Dias (Podemos), que identificou falsidade na assinatura de Antônio Carlos Nunes de Lima no acordo que pôs fim ao julgamento do processo que poderia afastar Ednaldo e que foi homologado pelo STF.

Ao negar o afastamento do presidente da CBF, Gilmar justificou que as petições utilizam “apertada síntese” para questionar as condições de saúde de Coronel Nunes. Ele argumentou que o pedido de afastamento é “incabível”, já que essa situação se restringe a dispositivos da Lei Geral do Esporte e da Lei Pelé.

Porém, o ministro determinou que o TJ-RJ apure, de maneira imediata e urgente, as suspeitas apontadas pelos pedidos. Assim, caberá ao mesmo Tribunal que afastou Ednaldo do cargo determinar se o acordo pode realmente ser questionado ou não.

A Corte realizaria uma audiência para ouvir Nunes nesta segunda-feira, 12, mas o advogado do ex-presidente da CBF disse que ele não poderia comparecer por motivos de saúde.

Na avaliação do senador Carlos Portinho, que é um dos apoiadores da CPI da CBF no Senado, “toda essa situação relacionada ao Ednaldo tem dado azo a muito constrangimento aos ministros do STF, porque o ministro Gilmar Mendes decidiu colocar ele de volta no cargo”. “De lá para cá, é uma trapalhada atrás da outra. É lógico que isso respinga nos ministros do STF”, argumenta.

Principal aliado de Ednaldo no Congresso e amigo do presidente da CBF desde 1980, José Rocha argumenta que uma CPI do tipo não teria como ser instalada. “Não tem nenhuma pertinência. Eu sou totalmente contra, porque a CBF é uma entidade privada, não tem nada a ver”, diz. “É que nem abrir uma CPI contra qualquer outra empresa, não recebe dinheiro público”.

Rocha também analisa que esse movimento recente contra Ednaldo causa danos ao futebol brasileiro. “É uma questão de poder. Os caras não conseguem o poder atrás dos votos dos associados, e aí ficam buscando coisas para poder criar uma instabilidade. Com isso, quem perde é o futebol brasileiro”, afirma. “Não olham a confederação, veem a pessoa.”

Nesta semana, políticos também miraram o afastamento de Ednaldo por outra instância: a Comissão de Ética da CBF. Daniela do Waguinho, que pediu ao STF o afastamento de Ednaldo no caso da assinatura, fez representação similar nesta instância.

Já Gonçalves e o vereador do Rio Marcos Dias pedem a mesma sanção, além de abertura de investigação por gestão temerária, conflito de interesses, favorecimento e corrupção privada

A Comissão de Ética foi criada em reforma da CBF em 2017 para ser um órgão de caráter autônomo e de controle externo. As decisões do órgão precisam ser referendadas pela Assembleia Geral, composta pelos presidentes das 27 federações estaduais.

Weslley Galzo/Levy Teles/Estadão
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