20 junho 2025
Os integrantes da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) das Bets no Senado devem votar nesta quinta-feira (12) o relatório final que pediu o indiciamento das influenciadoras Virginia Fonseca e Deolane Bezerra, além de outras 14 pessoas, incluindo empresários e representantes das casas de apostas.
A relatora da CPI, senadora Soraya Thronicke (Podemos-MS), apresentou o texto final na terça-feira (10). Agora, ele precisa ser aprovado pela comissão.
O documento, obrigatório em comissões parlamentares de inquérito, pode apenas sugerir indiciamentos a autoridades responsáveis, como o Ministério Público Federal.
Há possibilidade de apresentação na reunião de algum relatório paralelo, com diferentes sugestões de medidas e indiciamentos. Mas, segundo membros da comissão, a expectativa é de que somente o texto de Soraya seja analisado. Na terça, a senadora prometeu incorporar trechos de um parecer paralelo feito pelo senador Izalci Lucas (PL-DF).
O relatório final, de 541 páginas, apresenta ainda 18 projetos de lei e 21 medidas que, segundo a relatora, ajudariam a minimizar os danos aos apostadores.
Soraya propõe a criação de três novos crimes: um tipo penal específico para a exploração de apostas online sem autorização (o que seria um ato mais grave que a contravenção penal da exploração de jogos ilegais); outro para a criminalização da propaganda de bets irregulares; e um terceiro para quem facilita pagamentos a bets não autorizadas.
A CPI das Bets foi alvo de desinteresse no Senado desde a instalação, em novembro do ano passado, e enfrentou dificuldades para ouvir testemunhas. Em maio, tornou-se viral na internet com o depoimento midiático de Virginia.
O relatório final propõe que ela seja indiciada pelos crimes de publicidade enganosa e estelionato, cujas penas máximas somariam seis anos de prisão. A senadora afirma que a influencer admitiu, durante o depoimento, fazer as apostas em uma conta de demonstração configurada pela bet —a chamada “conta demo”, no jargão publicitário.
O advogado de Virginia, Michel Saliba, disse em nota que recebeu com “surpresa e espanto” o pedido de indiciamento e que “aguarda e confia no justo discernimento a ser dado pelo colegiado da CPI” na votação final.
Já Deolane foi convocada pela CPI, mas recebeu um habeas corpus do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) André Mendonça que a liberava de ir ao Senado. Mesmo assim, a relatora afirma que a CPI “colheu indícios suficientes da prática de crimes”.
Soraya sugere que ela seja indiciada pelos crimes de estelionato, lavagem de dinheiro e organização criminosa, além das contravenções penais de jogo de azar e loteria não autorizada —proposta que, somadas as penas, poderia levar a até 26 anos de detenção.
A relatora pede a responsabilização de Deolane pela ligação dela com a bet Zero Um, que não tem autorização do Ministério da Fazenda. A empresa opera hoje em âmbito nacional com uma decisão da Justiça de São Paulo. A bet recebeu autorização de funcionamento no Rio de Janeiro da Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro).
O relatório aponta que Deolane divulgou falsamente que a bet estava autorizada a funcionar. A relatora acrescenta que a advogada vendeu a participação dela na empresa em novembro para José Daniel Carvalho Saturnino por R$ 30 milhões, sem qualquer registro de pagamento.
O advogado da Zero Um, André Callegari, disse em nota que o relatório contém desinformações e inconsistências. A defesa afirma que Deolane não é sócia da empresa, como sugere o documento, mas sim embaixadora contratada da marca.
A nota acrescenta que outras pessoas citadas não são sócias da Zero Um, mas sim administradoras, e que ela “opera legalmente com base em mandado de segurança”.
Deolane foi alvo da operação da Polícia Federal que investiga crimes de lavagem de dinheiro e prática de jogos ilegais. Ela nega as acusações.
A advogada e influenciadora ficou presa durante 20 dias em setembro do ano passado por suspeita de envolvimento em uma suposta organização criminosa que teria movimentado quase R$ 3 bilhões de 2019 a 2023.
O relatório da CPI também sugere o indiciamento por lavagem de dinheiro e associação criminosa do empresário Fernando Oliveira Lima, conhecido como Fernandin OIG, dono de bets que disponibilizam jogos como o Fortune Tiger, popularmente conhecido como “jogo do tigrinho”.
Fernandin, um primo dele, Erlan Ribeiro Lima Oliveira, e o administrador da bet, Toni Macedo da Silveira Rodrigues, constituíram empresa para, segundo o relatório, “lavagem de dinheiro, dissimulação patrimonial e possível evasão de divisas”, usando “da fachada de marketing e serviços digitais para encobrir a origem de recursos provenientes de jogos de azar não regulados”.
O presidente nacional do PP, senador Ciro Nogueira (PI), que é membro suplente da CPI, viajou no mês passado para a Europa em um jatinho de Fernandin OIG.
Os advogados de Fernandin e do grupo OIG, João Paulo Boaventura e Thiago Turbay, disseram em nota que todas as movimentações financeiras mencionadas têm origem lícita.
A CPI foi prorrogada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), em 30 de abril por mais 45 dias, prazo bem menor que o defendido pela relatora, que insistia em levar a comissão até o fim do ano, com mais 130 dias.
Ao ser instalada, no final de 2024, a CPI das Bets dividiu atenções com a CPI das Apostas Esportivas, capitaneada pelo senador e ex-jogador da Seleção Romário (PL-RJ) e pelo senador e apresentador Jorge Kajuru (PSB-GO) para apurar a manipulação em partidas de futebol.
Uma investigação da Polícia Federal sobre supostos pedidos de propina feitos por um lobista a empresários do setor de apostas na mira da CPI das Bets ajudou a pavimentar o esvaziamento da comissão —até hoje, com um titular a menos.
A defesa de Bruno Viana Rodrigues, citado no relatório final, repudiou a “exposição indevida” durante a CPI e afirmou que “mesmo sem ter prestado depoimento e sem qualquer elemento de prova, foi proposto seu absurdo indiciamento”.
A defesa de Adélia Soares, também citada, disse que o relatório é “uma coleção de inverdades com o objetivo de retaliá-la pelo fato de não ter comparecido ao segundo depoimento”.
A Folha entrou em contato com Pâmela de Souza Drudi, Erlan Ribeiro Lima Oliveira, Toni Macedo da Silveira Rodrigues, Jorge Barbosa Dias, Ana Beatriz Scipião Barros e Marcus Vinicius Freire de Lima e Silva, também elencados no documento, mas não teve retorno até a publicação desta reportagem.
SUGESTÕES DE INDICIAMENTOS:
Adélia de Jesus Soares (ex-BBB, advogada e influenciadora)
Daniel Pardim Tavares Gonçalves (dono de empresa suspeita de operar jogos ilegais)
Deolane Bezerra dos Santos (advogada e influenciadora)
Ana Beatriz Scipiao Barros (influenciadora)
Jair Machado Junior (empresário do setor de bets)
José Daniel Carvalho Saturnino (empresário do setor de bets)
Leila Pardim Tavares Lima (contadora, mulher de Daniel Pardim)
Marcella Ferraz de Oliveira (empresária do setor de bets)
Virginia Pimenta da Fonseca Serrão Costa (empresária e influenciadora)
Pâmela de Souza Drudi (mulher de Fernando Oliveira Lima)
Erlan Ribeiro Lima Oliveira (primo e sócio de Fernandin OIG no setor de bets)
Fernando Oliveira Lima (empresário de bets, conhecido como Fernandin OIG)
Toni Macedo da Silveira Rodrigues (administrador da empresa de Fernandin OIG)
Marcus Vinicius Freire de Lima e Silva (empresário do setor de bets)
Jorge Barbosa Dias (empresário do setor de bets)
Bruno Viana Rodrigues (empresário do setor de bets)