Foto: Reprodução/Instagram
O presidente dos EUA, Donald Trump 16 de julho de 2025 | 14:45

Maioria das nações atingidas pelas tarifas não reage, e EUA faturam US$ 50 bilhões

economia

A maioria dos parceiros comerciais dos EUA falhou em retaliar as tarifas impostas por Donald Trump, permitindo que um presidente tachado por “sempre recuar” arrecadasse quase US$ 50 bilhões (R$ 278,61 bilhões) em receitas alfandegárias extras a um custo baixo.

Quatro meses após o presidente dos EUA disparar a primeira salva de sua guerra comercial, apenas China e Canadá revidaram contra Washington impondo uma tarifa global mínima de 10%, taxas de 50% sobre aço e alumínio, e 25% sobre automóveis.

Ao mesmo tempo, as receitas dos EUA com direitos aduaneiros atingiram um recorde de US$ 64 bilhões (R$ 356,63 bilhões) no segundo trimestre —US$ 47 bilhões (R$ 261,89 bilhões) a mais do que no mesmo período do ano passado, de acordo com dados publicados pelo Tesouro dos EUA na sexta-feira (11).

As tarifas retaliatórias da China sobre importações norte-americanas, as mais sustentadas e significativas de qualquer país, não tiveram o mesmo efeito, com a receita geral de direitos aduaneiros apenas 1,9% maior em maio de 2025 do que no ano anterior.

Combinadas com a retaliação limitada do Canadá, que ainda não divulgou dados aduaneiros do segundo trimestre, as tarifas impostas às exportações dos EUA em todo o mundo representam uma fração minúscula da receita dos norte-americanos durante o mesmo período.

Alguns outros parceiros comerciais dos EUA decidiram não responder da mesma forma enquanto negociavam com Trump para evitar a ameaça de tarifas ainda mais altas.

A UE, o maior bloco comercial do mundo, planejou contra-tarifas, mas repetidamente adiou a implementação, agora vinculando-as ao prazo de 1º de agosto de Trump para as negociações.

O custo das tarifas de Trump também não está recaindo exclusivamente sobre os consumidores norte-americanos, dizem especialistas em cadeia de suprimentos, já que marcas internacionais buscam distribuir o impacto dos aumentos de custos ao redor do mundo para minimizar o impacto nos EUA.

Simon Geale, vice-presidente executivo da Proxima, uma consultoria de cadeia de suprimentos de propriedade da Bain & Company, comentou que grandes marcas como Apple, Adidas e Mercedes buscariam mitigar o impacto dos aumentos de preços.

“Marcas globais podem tentar absorver parte do custo da tarifa através de fornecimento inteligente e economia de custos, mas a maioria terá que ser distribuída em outros mercados, porque os consumidores dos EUA podem aceitar um aumento de 5%, mas não 20% ou mesmo 40%”, disse Geale.

Mas apesar das tarifas dos EUA atingirem níveis não vistos desde a década de 1930, a timidez da resposta mundial a Trump impediu uma espiral de retaliação do tipo que dizimou o comércio global entre a primeira e a segunda Guerras Mundiais.

Economistas afirmaram que a posição dominante dos EUA como o maior mercado consumidor do mundo, juntamente com as ameaças de Trump de redobrar as tarifas sobre as nações que o desafiam, significava que para a maioria dos países a decisão de “recuar” não era covardia, mas bom senso econômico.

Levantamento da consultoria Capital Economics indicou que uma guerra comercial de alta escalada onde a taxa média de tarifa recíproca atingisse 24% causaria um impacto de 1,3% no PIB (Produto Interno Bruto) mundial em dois anos, em comparação com 0,3% em um caso base onde permanecesse em 10%.

“Diferentemente da década de 1930, quando os países tinham relações comerciais mais equilibradas, o mundo de hoje apresenta um sistema de hub-and-spoke com os EUA no centro”, analisou Marta Bengoa, professora de economia internacional da City University of New York. “Isso torna a retaliação econômica menos desejável para a maioria dos países, mesmo quando poderia ser politicamente satisfatória”, disse.

Alexander Klein, professor de história econômica da Universidade de Sussex, acrescentou que medidas de curto prazo —reduzir a exposição a tarifas e minimizar o risco de inflação— estavam impulsionando a maioria das negociações com Trump, o que dava à Casa Branca a vantagem.

“Eu gostaria de pensar que os líderes estavam aprendendo as lições da história, mas temo que estou sendo otimista. É mais provável que a UE, o Canadá e muitos outros governos temem o impacto nos vínculos de fornecimento global e a inflação decorrente da escalada”, analisou. “Trump se importa menos com isso, então está aproveitando”.

O maior parceiro comercial dos EUA, o México, não retaliou após ser atingido com tarifas de 25% em março sobre exportações não cobertas pelo Acordo EUA-México-Canadá. Desde o início de suas conversas com Trump, a presidente Claudia Sheinbaum expôs que preferia um acordo.

O fracasso do mundo em se unir e enfrentar coletivamente as ameaças de Trump também deixou o presidente dos EUA com mais espaço para punir individualmente outros parceiros. Ele anunciou sobretaxa de 50% sobre o Brasil na semana passada, citando justificativas amplamente políticas.

“Trump deixou claro que está preparado para aumentar ainda mais as tarifas diante de retaliação”, afirmou Bengoa. “Muitos países aprenderam com a guerra comercial de 2018-2019 que a retaliação frequentemente leva à contra-retaliação em vez de soluções negociadas”, recordou.

Mesmo dentro de blocos unificados como a UE, os interesses concorrentes dos estados membros individuais, combinados com temores mais amplos sobre se um confronto com Trump poderia minar as garantias de segurança dos EUA à Europa, geraram intensa cautela.

A decisão de Trump de elevar a sobretaxa para 30% não provocou uma grande reação em Bruxelas, em parte porque altos funcionários dos EUA, incluindo o secretário do Tesouro, Scott Bessent, entraram em contato nos bastidores para aconselhar cautela, segundo pessoas com acesso à negociação.

Um funcionário da UE familiarizado com a situação acrescentou que as negociações não estavam ocorrendo isoladamente, em um momento em que a Europa buscava apoio contínuo dos EUA para a Ucrânia, pois esse debate envolve outros setores do relacionamento como a segurança, por exemplo.

Como resultado, diferentemente da China, que igualou as tarifas de Trump em abril, a UE repetidamente adiou a implementação de seus pacotes de medidas retaliatórias enquanto busca deixar espaço para fechar um acordo com Trump antes de 1º de agosto.

Quando a Comissão Europeia publicou sua mais recente lista de possíveis alvos de retaliação em bens de 72 bilhões de euros na terça-feira (15) —incluindo aeronaves Boeing, carros e uísque tipo bourbon— não colocou taxas tarifárias específicas contra produtos individuais, em uma aparente tentativa de não irritar Trump.

Mesmo o Canadá e a China têm sido cautelosos em antagonizar Trump, apesar de serem os únicos dois países a impor tarifas retaliatórias.

As tarifas dos EUA sobre a China escalaram para 145% em meados de abril, fazendo com que as exportações chinesas para os EUA despencassem um terço em maio. Ambos os lados rapidamente recuaram, concordando com uma pausa de 90 dias em Genebra em maio, reduzindo a taxa para 30%.

Em fevereiro e março, o Canadá impôs quase 155 bilhões de dólares canadenses (R$ 630,91 bilhões) em tarifas retaliatórias, incluindo sobre aço e autopeças. Nas últimas semanas, porém, recuou diante da pressão dos EUA, apesar das promessas eleitorais do primeiro-ministro canadense Mark Carney de confrontar Trump.

Com o comércio dos EUA representando 20% do PIB canadense —em comparação com 2% para os EUA— Carney calibrou suas respostas. Ele abandonou um imposto sobre serviços digitais sob pressão dos seus vizinhos e não igualou a decisão de Trump no mês passado de dobrar as tarifas de aço para 50%.

“A retórica de ‘cotovelos para cima’ de Carney funcionou durante a campanha eleitoral, mas não podemos ser quem confrontará os EUA”, disse Dan Nowlan, conselheiro do ex-primeiro-ministro conservador canadense Stephen Harper. “Agora é uma abordagem muito mais realista”.

Diplomatas dizem que se o mundo eventualmente se unirá para confrontar Trump dependerá em parte do nível em que as tarifas vão se estabelecer perto do prazo de 1º de agosto.

O comissário de comércio da UE, Maros Sefcovic, disse esta semana que uma tarifa de 30% sobre as exportações da UE deixaria o bloco sem nada a perder, já que o comércio transatlântico seria “quase impossível”. Ele acrescentou que a UE estava conversando com parceiros comerciais “de ideias semelhantes” sobre possíveis medidas conjuntas.

A longo prazo, o fracasso em retaliar também daria às empresas dos EUA praticamente um passe livre para as cadeias de suprimentos globais, enquanto os fabricantes da UE e da Ásia ainda enfrentariam altas tarifas para os EUA, avaliou Creon Butler, chefe de economia global da Chatham House.

“O cálculo é de curto prazo versus longo prazo. Faz sentido não retaliar no curto prazo, mas a longo prazo, há um cálculo para outros países sobre até que ponto vamos lutar por cadeias de suprimentos globais fora dos EUA”, complementou.

Folhapress
Comentários