26 novembro 2024
A discussão sobre a independência da seccional baiana da OAB dominou boa parte do debate promovido esta manhã entre a presidente Daniela Borges, que concorre à reeleição, e a colega Ana Patrícia Dantas Leão, candidata da oposição. Borges acusou a chapa da oposição de contar com o apoio de um presidente de partido e de dois desembargadores e ouviu como resposta de Ana Patrícia uma crítica ao fato de ter tentado três vezes, sem sucesso, ocupar um cargo de ministra do Tribunal Superior Eleitoral usando a Ordem. Além disso, a candidata da oposição lembrou que o grupo de Borges indicou um desembargador pelo Quinto Constitucional, o que implicou na preferência por um advogado em detrimento de todos os demais candidatos e em negociações com os desembargadores e o governador do Estado, fragilizando a autonomia da instituição.
“Esse é um tema que me preocupa muito nessas eleições, porque a candidata adversária traz na sua campanha dois desembargadores que vêm de uma maneira muito constrangedora, inclusive, pedindo votos para ela, muitas vezes inclusive se referindo à chapa deles. Isso coloca em cheque, sem dúvida nenhuma, a independência da OAB. É isso que está no jogo, inclusive, nessas eleições. Antes de ontem nós tivemos um presidente de um partido político mandando mensagens para prefeitos da sua base, orientando a base a votar na campanha adversária, desembargador ontem também mandando mensagens pedindo, temos diversos prints, a imprensa inclusive já noticia isso. Então, a pergunta que fica é: como é possível se ter efetivamente independência se se tem durante a eleição esse tipo de apoio?”, questionou Daniela Borges no confronto promovido pelo Bahia Notícias.
Na réplica, Ana Patrícia questionou a presidente: “Estranho falar em independência quando a presidente da OAB e a atual candidata Daniela tenta ocupar espaços nos tribunais, situação que todos sabem que não se conquista sem apertar mãos e sem uma posição de subserviência. Mais estranho ainda é falar em independência quando ela fez um desembargador pela primeira vez no Tribunal de Justiça da Bahia, procedimento que todos sabemos que tem etapas e que demandam pedidos de apoio ao presidente do Tribunal e pedidos de apoio ao governo do Estado da Bahia. E quero dizer que mais uma vez que nós precisamos observar que toda atuação que ela reputa de independência é de subserviência”. Para completar, lembrou de vínculos de um desembargador da Justiça do Trabalho com a chapa da situação.
Em outro momento as duas foram ao confronto ao tratar da representação feminina na Ordem, questionada principalmente pela candidata da oposição. “Nós temos, e até com felicidade, uma presidente mulher, mas nós não sentimos avanços femininos. Basta dizer que na própria estrutura da OAB, a partir da posse da atual candidata à eleição, cargos importantes deixaram de ser ocupados por mulheres. A exemplo da presidência do Tribunal de Ética e Disciplina, a exemplo da Procuradoria Geral de Prorrogativas, a exemplo de uma redução significativa de comissões presididas por mulheres”, disse Ana Patrícia, que deixou a presidente da OAB na defensiva praticamente durante mais o tempo do confronto, que durou pouco mais de uma hora.
A candidata da oposição ainda relembrou ter sido agredida após o resultado do pleito em que Daniela Borges foi eleita, mas de não ter tido sua solidariedade pessoal nem um posicionamento firme da presidente no episódio. “Eu não posso deixar de lembrar que liderança feminina significa acolher as mulheres, não apenas as mulheres que fazem parte do seu grupo. Eu fui vítima de um processo violento na última eleição e não recebi da candidata Daniela nenhum apoio. Eu não sou a única mulher a sofrer esse tipo de violência. Doutora Sílvia Cerqueira, atual conselheira federal na Chapa 86, que com ela rompeu, única mulher negra no Brasil do Conselho Federal, ao longo de três anos, só teve a oportunidade de sentar na bancada da Bahia por uma única vez, sempre sendo posta nas últimas bancas do Conselho Federal. Representação feminina significa muito mais do que ter uma imagem de mulher na ocupação de espaços”, relatou.
Ao responder, Borges, primeira mulher presidente da OAB Bahia, afirmou ter aberto outros espaço para a representação feminina na sua gestão e disse que fez um repúdio público aos ataques recebidos por Ana Patrícia. “Eu fiz um repúdio tão enfático que inclusive a imprensa local noticiou, trouxe inclusive aqui sites nos quais houve uma repercussão do repúdio que fiz à época. É importante também aqui destacar que eu repudio todas as formas de violência contra a mulher. Não sou apenas eu, primeira mulher a chegar na presidência da OAB. Eu sempre digo que o meu orgulho é que eu cheguei com muitas. Pela primeira vez na história temos presidente e vice, duas mulheres e temos uma diretoria com três mulheres e as mulheres em todos os espaços do OAB trazendo as ações e projetos em prol também da mulher advogada”, rebateu.
Ana Patrícia ainda provocou a presidente ao questionar sobre o que classificou como omissão da OAB em diversas frentes, entre as quais quanto à inexistência de fiscalização da qualidade dos cursos de Direito na Bahia, hoje com 80 mil inscritos, ao dizer que a instituição não combate o estelionato educacional. “A Bahia e o Brasil vivem um verdadeiro estelionato educacional. É papel da OAB lutar e judicializar pelo fechamento de instituições que não têm qualidade”, defendeu, acrescentando que a Ordem precisa de uma postura firme para garantir que os advogados sejam formados com excelência, propondo a descentralização da Escola Superior de Advocacia (ESA) para o interior, além de iniciativas como o projeto Primeiros Passos, que prevê mentoria, cotas raciais e de gênero, e parcerias para desconto em lojas conveniadas.
A candidata da oposição ainda criticou o programa da Caixa de Assistência dos Advogados da Bahia (CAAB), que distribui ternos usados para advogados iniciantes. “Isso é humilhante. Na nossa gestão, os advogados terão ternos novos e dignidade”, afirmou. Sobre as prerrogativas dos advogados, Ana Patrícia criticou a falta de estrutura do Poder Judiciário e propôs um projeto de pacto com o Poder. A ideia é destinar parte das custas processuais à melhoria da estrutura judiciária, com mais juízes, reativação de comarcas e contratação de assessores. Segundo ela, essa iniciativa poderá reduzir significativamente a violação de prerrogativas: “Embora existam magistrados que intencionalmente violam prerrogativas, a maioria dos problemas é fruto da má estrutura do Judiciário.”