27 novembro 2024
Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.
O regime previsto no Código Tributário Nacional (CTN) para o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS é o lançamento por homologação. Quando ocorrido o fato gerador da obrigação tributária, o contribuinte calcula o montante do tributo devido e recolhe diretamente aos cofres municipais, independente de qualquer ação do fisco. Deve, portanto, a autoridade fiscal averiguar se o valor declarado está correto, possibilitando a cobrança de eventuais diferenças a serem apuradas ou homologando expressamente o imposto recolhido.
De acordo com o CTN, compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional. Desta forma, cabe privativamente ao auditor fiscal promover o lançamento, ensejando nulidade a prática de qualquer ato distinto.
Na cidade de Salvador, a Lei 8421/13 acrescentou o artigo 106-A ao Código Tributário, dispondo que o ISS não pago ou pago a menor, relativo às Notas Fiscais de Serviços Eletrônicas – NFS-e emitidas, será enviado para inscrição em Dívida Ativa do Município com os acréscimos legais devidos, na forma do Regulamento, aplicando-se também a mesma situação ao responsável tributário. Permite, todavia, que a Administração Tributária possa efetuar cobrança amigável do valor apurado, previamente à inscrição em Dívida Ativa. Será que o crédito tributário do ISS não será mais constituído através de Notificação Fiscal de Lançamento?
Talvez a intenção do fisco municipal soteropolitano tenha sido seguir a metodologia utilizada pela Receita Federal quanto à Declaração de Débitos e Créditos Tributários Federais (DCTF) e à Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social (GFIP), por serem consideradas confissões de dívida, e reconhecidas pelo Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) como instrumentos hábeis para a constituição do crédito tributário. Vale ressaltar que a Súmula 436 do Superior Tribunal de Justiça (STJ) respaldou tal procedimento ao dispor que a entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco.
Nesse diapasão é conveniente discernir os atos administrativos discricionários e os vinculados. Quando existe liberdade de escolha em relação ao conteúdo da matéria, observadas as conveniências e oportunidades, mas limitados aos ditames legais, reporta-se a atos discricionários. Já os atos vinculados impedem qualquer liberdade na sua prática, pois sua conduta será sempre discriminada em lei, não havendo qualquer subjetividade da autoridade fiscal. Sendo assim, é fundamental que o lançamento do crédito tributário seja constituído através de ato administrativo vinculado praticado por auditor fiscal.
A simples emissão da nota fiscal eletrônica não pode determinar a sua inscrição em Dívida Ativa e também não caracteriza confissão de débito. Faz-se necessário a apuração por parte da fiscalização das informações prestadas pelo sujeito passivo no documento fiscal, carecendo de uma análise mais depurada, a fim de que eventuais erros não causem enormes transtornos ao contribuinte como a inclusão do seu nome no Cadastro de Inadimplentes – CADIN e a própria Execução Fiscal. A Notificação Fiscal de Lançamento constitui requisito essencial de validade para a exigibilidade do crédito tributário sendo imprescindível para dar conhecimento ao contribuinte, permitir o seu pagamento ou possibilitar a defesa em caso de discordância.
Conclui-se, então, que o controle administrativo do crédito tributário antes da inscrição em Dívida Ativa é de vital importância, como forma de resguardar o princípio da segurança jurídica, uma vez que o lançamento tributário goza de presunção de legitimidade. Evita-se, desse modo, execuções fiscais indevidas e condenações judiciais contrárias ao município, além de preservar o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal, requisitos básicos num Estado Democrático de Direito.