Karla Borges

Economia

Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

A recente decisão judicial sobre o ITIV de Salvador

O Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis Inter Vivos – ITIV foi a pauta da semana na cidade do Salvador, quando o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia concedeu liminar favorável ao contribuinte, impedindo a municipalidade de exigir a cobrança do tributo na celebração do contrato de compra e venda de unidade imobiliária, portanto, antes do registro do título translativo.Dois aspectos interessantes podem ser analisados acerca da matéria: quem seria o contribuinte do imposto e qual o momento em que ele deve ser pago?

Normalmente nas diversas legislações o contribuinte do ITIV é o adquirente do bem imóvel, mas a lei municipal pode atribuir sujeição passiva da obrigação tributária a quem ela desejar, embasada no artigo 42 do Código Tributário Nacional – CTN que concedeu discricionariedade ao consignar que contribuinte do imposto é qualquer das partes na operação tributada, como dispuser a lei.Não há dúvida de que a lei municipal possa imputar responsabilidade tributária ao incorporador imobiliário, na qualidade de substituto tributário, conforme descrito no parágrafo único do artigo 119 do Código Tributário e de Rendas do Município do Salvador.

A famosa súmula 108 do Supremo Tribunal Federal que dispõe ser legítima a incidência do Imposto de Transmissão Inter Vivos sobre o valor do imóvel ao tempo da alienação, e não da promessa, na conformidade da legislação local,é de 13/12/1963. Vigorou até quando a Emenda Constitucional – EC n.3 de 17/03/93 acrescentou o parágrafo 7º ao artigo 150 da Constituição Federal rezando que “A lei poderá atribuir a sujeito passivo de obrigação tributária a condição de responsável pelo pagamento de imposto ou contribuição, cujo fato gerador deva ocorrer posteriormente, assegurada a imediata e preferencial restituição da quantia paga, caso não se realize o fato gerador presumido”. Desta forma, além de autorizar o instituto da responsabilidade tributária, permitiu ainda a antecipação do fato gerador.

Entretanto, a maioria dos estudiosos acredita que o dispositivo que antecipa o fato gerador só poderia valer em relação ao ITIV, caso a lei complementar dispusesse sobre o assunto de forma expressa, possibilitando que as legislações municipais também o prescrevessem. Ou seja,cabe a lei complementar, conforme preceito constitucional (art.146,II) estabelecer as normas gerais em matéria tributária, sendo condição prévia a concessão legal dessa antecipação e o CTN é omisso sob esse aspecto.

Doutrinadores mais ousados garantem que a circunstância da lei complementar não fazer qualquer menção a antecipação do fato gerador, culminando no pagamento antecipado do imposto, facultaria aos entes municipais procederem de acordo com a lei ordinária municipal, exigindo nos seus Códigos Tributários, por exemplo, a antecipação do fato imponível do tributo para o ato da assinatura do contrato de compra e venda do imóvel, sendo a omissão perfeitamente suprida ou sanada pela presença da norma na legislação do município.

O curioso é que a lei de Salvador estabelecia no seu artigo 114 apenas três fatos geradores do ITIV: a transmissão de bens imóveis por natureza ou por acessão física, a transmissão de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia e a cessão de direitos de aquisição relativos às transmissões já mencionadas, exatamente como prevê o CTN. A lei 8421/13 acrescentou o artigo 114-A, ampliando as situações compreendidas na incidência do imposto, adicionando, inclusive, a cessão de direitos decorrente de compromisso de compra e venda.

Importante ressaltar que o artigo 122 da Lei 7186/06 também determinava que o ITIV fosse pago na assinatura do contrato da promessa de compra e venda da unidade imobiliária para entrega futura. Embora essa lei não tivesse previsto inicialmente a antecipação do fato gerador na incorporação imobiliária, somente o pagamento, o fez posteriormente, preenchendo uma lacuna omissa na lei complementar, pois o CTN além de não contemplar tal situação como fato gerador, não prevê também qualquer possibilidade de exação antes da transmissão efetiva do bem,sendo considerada inconstitucional a pretensa cobrança antecipada do tributo.

Seria de bom alvitre, tendo em vista a repercussão da decisão judicial e a proporção que ela pode alcançar,que a municipalidade soteropolitana estudasse uma forma de viabilizar novamente o parcelamento do imposto nos contratos firmados para entrega futura de imóveis. Evitar-se-ia o impacto no erário público diante da provável perda de arrecadação desse tributo, caso a decisão seja mantida, afinal os recentes posicionamentos proferidos pelo Supremo Tribunal Federal têm sido contrários aos municípios, principalmente em relação ao momento da ocorrência do fato gerador do ITIV.

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