26 novembro 2024
Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.
Um dos dispositivos previstos na Lei Anticorrupção (12.846/13) é a possibilidade da celebração de acordo de leniência entre as pessoas jurídicas responsáveis pelas práticas de atos lesivos contra a administração pública nacional ou estrangeira e os órgãos ou entidades públicas. O referido acordo tem a finalidade de estimular as empresas a colaborar com as investigações e com o processo administrativo.
Sabe-se que a nova lei prevê a responsabilização objetiva administrativa e civil às pessoas jurídicas que venham a cometer atos ilícitos contra o poder público, como fraudar licitações e contratos, oferecer vantagens indevidas ou utilizar-se de laranja para ocultar ou dissimular interesses. Na responsabilização objetiva não há necessidade de demonstração da culpa para que o ato seja considerado infração passível de punição. Dispõe, para tanto, de duas categorias de penalidades: a administrativa e a judicial.
Entretanto para que possa haver a celebração do acordo de leniência as empresas infratoras têm a obrigação de identificar os demais envolvidos na infração e fornecer de forma célere informações e documentos que comprovem o ilícito sob apuração. Existem ainda requisitos obrigatórios que devem ser atendidos cumulativamente: a pessoa jurídica deve ser a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para apuração do ato ilícito, deve cessar completamente seu envolvimento na infração investigada, além de admitir sua participação e cooperar plenamente, às suas expensas com as etapas do processo administrativo.
Deve-se deixar patente que o acordo de leniência é celebrado na esfera administrativa e que o artigo 18 da lei reza que a responsabilidade da pessoa jurídica não afasta a possibilidade de sua responsabilização na esfera judicial. Desta forma, ainda que sejam reduzidas as penas e extintas as punições aplicadas pelo Poder Executivo, nada obsta que o Ministério Público ajuíze ação com vistas à aplicação de sanções. Ademais o acordo também não exime a empresa de reparar integralmente o dano causado e não estende os seus benefícios às pessoas físicas.
Então quais seriam as vantagens do acordo? Dispensa a empresa da publicação extraordinária da decisão condenatória, reduz a multa em dois terços e retira a proibição de receber incentivos, subsídios, doações ou empréstimos de órgãos públicos e de instituições financeiras públicas, permitindo a continuidade dos contratos celebrados. Todavia, com as informações e documentos fornecidos pelas empresas, os responsáveis poderão ser processados criminalmente, pois as infrações cometidas não só são ilícitos administrativos, como penais.
O acordo de leniência está para Lei Anticorrupção, assim como a delação premiada está para o Direito Penal. A diferença básica entre os dois institutos é que o primeiro é celebrado por órgãos do Poder Executivo, atingindo as pessoas jurídicas e o segundo é homologado pelo Poder Judiciário com a participação do Ministério Público e voltado para as pessoas físicas. Não há no ordenamento jurídico pátrio a possibilidade de renúncia da ação penal, como disposto no direito americano através da “Plea Bargaining” que prevê tal prerrogativa.
A Lei Anticorrupção em nenhuma das suas disposições referentes ao acordo de leniência usurpa qualquer competência do Ministério Público como muitos alegam, pelo contrário, permite e estimula as pessoas jurídicas a fornecer provas que podem ser aproveitadas pelo órgão, que continua com as suas prerrogativas de investigar, facilitando a imputação de responsabilidade pelo cometimento de atos lesivos à administração pública. Inclusive o próprio texto legal prescreve que concluído o processo administrativo, a comissão designada para apuração das responsabilidades dará conhecimento ao Ministério Público de sua existência, para apuração de eventuais delitos.