Karla Borges

Economia

Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

A Lei de Terceirização

O texto geral do Projeto de Lei PL 4330, que estava adormecido desde 2004, foi recentemente aprovado pela Câmara dos Deputados, gerando um enorme descontentamento não só na classe trabalhadora como na própria magistratura e no meio jurídico. Ele dispõe sobre os contratos de terceirização e as relações de trabalho nas empresas privadas, excluindo a Administração Pública Direta e agora também a Indireta, uma vez que uma emenda votada na última terça-feira felizmente retirou a possibilidade de aplicação às empresas públicas e às sociedades de economia mista.

A nova lei considera terceirização a transferência pela contratante da execução de parcela de qualquer de suas atividades à contratada, criando nesse sentido dois problemas básicos: o que se entende por parcela? 99,9 % das suas atividades poderão ser terceirizadas com o novo dispositivo? E quanto à natureza dessas atividades? Poder-se-ia terceirizar pelo texto até mesmo a atividade principal da empresa, causando uma reviravolta no tema, por contrariar o entendimento da Súmula 331 do TST, que se reporta a serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, jamais atividade-fim.

Vale registrar que a contratante será pessoa jurídica, com exceção para o produtor rural e para o profissional liberal no exercício de sua profissão, assim como a contratada só poderá ser empresa especializada, que presta serviços determinados e específicos, possuindo qualificação técnica e capacidade econômica compatível com a execução do acordado. Não será permitida a contratação de pessoa jurídica cujos sócios guardem cumulativamente com a contratante relação de pessoalidade, subordinação e habitualidade. Depreende-se, desta forma, que a existência de um ou dois desses requisitos já habilitaria a contratação dessa empresa.

A exigência da contratada ter um único objeto social será por demais onerosa para o meio empresarial, pois aqueles que tiverem no seu contrato social a previsão de mais de uma atividade terão que promover alteração contratual e criar uma nova pessoa jurídica para cada tipo de serviço prestado caso as atividades não recaiam na mesma área de especialização. A qualificação técnica da contratada deverá ser demonstrada, assim como a indicação da qualificação dos membros da equipe técnica que se responsabilizará pelo trabalho, sob pena da Justiça do Trabalho desqualificar seguramente o tipo do contrato.

A “terceirizada” é responsável pelo planejamento e execução dos serviços e cabe a ela contratar, remunerar e dirigir o trabalho, permitindo ainda a quarteirização quando se tratar de serviços técnicos especializados e houver previsão contratual. Então, qual será o papel da empresa contratante se ela está impossibilitada de dirigir a sua própria organização? Como conceber a licitude do contrato de terceirização de qualquer atividade da contratante sem caracterizar a formação de um vínculo de emprego entre a contratante e os empregados da contratada como prevê o artigo 4º da lei?

Caso restem configurados os elementos da relação de emprego entre a contratante e o empregado da contratada, a empresa que terceirizou ficará sujeita a todas as obrigações trabalhistas, tributárias e previdenciárias, caracterizando o vínculo de emprego e tornando a terceirização ilícita. Entretanto, a mesma lei exclui, no que se refere a formação de vínculo empregatício, quando a contratante for empresa pública ou sociedade de economia mista, fato que impediria a alegação de terceirização ilícita.

O inadimplemento da obrigatoriedade de fiscalização pela contratante das obrigações trabalhistas certamente será um forte argumento para que a Justiça do Trabalho descaracterize o contrato e impute responsabilidade subsidiária ao tomador dos serviços. A alegação de discriminação também pode ser suscitada pela previsão de tratamento diferenciado aos terceirizados no parágrafo único do artigo 12 quando a contratante poderá disponibilizar aos empregados terceirizados os serviços de alimentação e atendimento ambulatorial em local distinto dos demais funcionários.

Talvez a maior indagação que persiste aos estudiosos da matéria é compreender como uma empresa irá terceirizar a sua atividade-fim sem haver subordinação jurídica? A Justiça do Trabalho através dos seus julgados tem em sua maioria entendido que a terceirização em muitos casos é ilícita por ferir os princípios da dignidade da pessoa humana e o valor social do trabalho, cláusulas pétreas da Constituição Federal. Se a grande inovação do texto é não impedir a terceirização da atividade-fim, tal fato conduziria facilmente ao reconhecimento do vínculo empregatício, constatada, obviamente, a subordinação jurídica. Então, para que terceirizar atividade principal da empresa? Não seria um contrassenso e não geraria maior insegurança jurídica?

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