23 dezembro 2024
Adriano de Lemos Alves Peixoto é PHD, administrador e psicólogo, mestre em Administração pela UFBA e Doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia do Trabalho da Universidade de Sheffiel (Inglaterra). Atualmente é pesquisador de pós-doutorado associado ao Instituto de Psicologia da UFBA e escreve para o Política Livre às quintas-feiras.
Na minha cabeça já estava tudo certo. Eu iria aproveitar o feriado para tentar colocar em dia algumas de minhas pendências: um artigo científico que precisa ser finalizado, um manual que só aguarda uma revisão e o meu nihil obstat para ser divulgado, uma entrevista sobre ‘workaholismo’ para uma revista que espera as respostas, um livro que estava lendo e larguei no meio por falta de tempo e algumas outras coisas que nem me lembro mais direito … Entre as minhas prioridades constava escrever esta coluna de quinta. Os últimos textos têm saído nas sextas e nos sábados, mas se você olhar ai no site verá que elas deveriam ser publicadas às quintas feiras e isso não vem acontecendo por pura falta de tempo para escrever neste dia.
Minha pretensão era aproveitar o 2 de Julho e escrever um libelo quase revolucionário. Em um tom planfletário, tendo o hino da Independência como base, iria exortar os leitores a não esquecerem os sacrifícios e as promessas feitas pelos nossos pais que lutaram pela liberdade e a resistir às tentativas de opressão e submissão, reais e simbólicas, que se fazem cada vez mais presentes em nossa sociedade.
Entretanto, quando me sentei para trabalhar no início da manhã, após passar um tempo escondido dentro do armário enquanto brincava de esconde-esconde com minha filha, tive a infeliz ideia de começar pela correção das provas de uma disciplina que ministrei para um curso de especialização lato sensu. Se arrependimento matasse….
PROVA, assim com todas as letras maiúsculas é um evidente exagero. Creio que algo como exercíciofeitoemduplaemsaladeaulacomperguntassimplesquedeveriamserextraídasdeumúnicotexto caracteriza melhor o que foi feito. A opção por este formato para a “verificação de aprendizagem” se deu com base uma experiência prévia de discussão em sala, onde uma situação problema foi apresentada e foi pedido aos alunos que aplicassem a teoria para a sua compreensão e para a formulação de uma resposta/proposta, o que redundou em um desastre total. O exercício era muito simples, mas fugia do óbvio e dependia de um grau de interpretação e compreensão do texto (no nível ensino fundamental bem feito). Foi o que bastou para que me olhassem como se tivesse xingado a mãe de alguém e que logo surgiu uma voz para dizer que se ninguém entendia a culpa era do professor! O fato é que algo que levaria um período curto se arrastou por todo o dia.
Enquanto isso, fiquei pensando se teremos motivos para comemorarmos, de fato, faltando apenas sete anos para o bicentenário de nossa separação de Portugal, nossa independência? Não temos exércitos estrangeiros acampados em nossas terras, mas não temos capacidade de defendê-la se preciso for. Não pagamos tributos à outras nações, mas os juros da dívida são escorchantes e extrapolam dezenas de vezes qualquer ajuste fiscal. Somos campeões mundiais em número de cirurgias plásticas, mas não conseguimos dar condições decentes de vida para parte significativa de nossa população. Expulsamos invasores à duzentos anos apenas para sermos patrulhados por nós mesmos. Recusamos-nos a sustentar Portugal, mas mantemos uma casta, uma verdadeira nomenclatura, que possui privilégios extraordinários que são custeados com o suor do rosto da maioria da população. Construímos escolas e Inventamos os mais variados componentes curriculares, mas ano após ano nossos estudantes são incapazes de compreender textos simples, o que dirá lidar com questões complexas e abstratas.
Que liberdade é essa? Você acha que eu estou sendo pessimista? Quer ler as minhas provas?