23 dezembro 2024
Adriano de Lemos Alves Peixoto é PHD, administrador e psicólogo, mestre em Administração pela UFBA e Doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia do Trabalho da Universidade de Sheffiel (Inglaterra). Atualmente é pesquisador de pós-doutorado associado ao Instituto de Psicologia da UFBA e escreve para o Política Livre às quintas-feiras.
Tem um aspecto das ciências humanas que sempre me fascinou: não importa a pergunta, não importa o tema, há sempre uma referência nos filósofos gregos para subsidiar a reflexão. Apesar de parecer óbvio, levei algum tempo até desenvolver uma compreensão profunda (não meramente cognitiva) dessa questão. O objeto fundamental de reflexão das humanidades é permanente, o Homem nas suas dúvidas, angustias, limitações, aspirações, desejos, problemas e esperanças.
Apesar de sua importância e ubiquidade, um aspecto do pensamento grego parece ter se perdido em tempos recentes: a dimensão moral da ação humana e uma orientação para a sua formação. Não descarto a possibilidade de estar equivocado, mas tenho a impressão que todos os ensinamentos clássicos apontavam em uma direção básica: como ser uma boa pessoa, um bom cidadão. Durante muito tempo este padrão parece ter orientado famílias e currículos subsistindo nas mais variadas formas. Até bem pouco tempo, uma das principais portas de entrada para essa tradição eram as fábulas contadas às crianças, com destaque para Esopo e alguns reinventores mais “modernos” como La Fontaine.
Do tempo de minha infância lembro, vividamente, de uma dessas fábulas, a história da formiga e da cigarra. Em pleno verão a formiga trabalhava enquanto a cigarra cantava e se divertia. Vendo aquela cena a formiga advertia a cigarra- prepare-se o inverno está chegando!- e continuava a trabalhar. E a cigarra, nada! O final é bem conhecido. Inverno chega, como chega todos os anos, e a cigarra despreparada vai pedir socorro para a formiga. Para os religiosos uma estória com este mesmo tema básico pode ser encontrada no gênesis, no sonho do faraó com as sete vacas gordas e as sete vacas magras. Haverá um período de abundância seguido por um período de escassez. O governante sábio deve aproveitar o período das vacas gordas e se preparar para os momentos mais difíceis que chegarão.
Tanto num caso quanto n´outro há um mesmo eixo narrativo e uma clara moral: um valor no trabalho diligente daquele que se prepara durante os períodos de abundância para os tempos de escassez. A vida mansa e tranquila da cigarra tem o seu valor, mas precisamos nos lembrar que é pelo trabalho diuturno, como os da formiga, que o mundo é construído. Está na hora de resgatar os clássicos e voltar a contar essas estórias para as crianças. Quem sabe elas não se lembram disso quando crescidas forem escolher um candidato?