23 dezembro 2024
Adriano de Lemos Alves Peixoto é PHD, administrador e psicólogo, mestre em Administração pela UFBA e Doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia do Trabalho da Universidade de Sheffiel (Inglaterra). Atualmente é pesquisador de pós-doutorado associado ao Instituto de Psicologia da UFBA e escreve para o Política Livre às quintas-feiras.
A racionalidade foi (e ainda é) o principal instrumento de domínio do homem sobre a natureza. Moldamos o mundo à nossa imagem e semelhança separando, classificando, organizando, reduzindo, dominando. Essa estratégia (alguns preferirão a palavra método) é bastante eficaz. Ela nos deu a maior parte do conforto que nossa sociedade experimenta, dos antibióticos ao telefone celular. Do avião ao micro ondas. Do velcro às viagens espaciais. Força tão poderosa, a racionalidade não se constrangeu às tecnologia e às ciências e invadiu nosso cotidiano. Boa parte das explicações sobre o comportamento humano têm um pressuposto racional. E como não podia deixar de ser, o contexto de trabalho não ficou imune a essa forma de ver e atuar sobre o mundo.
Na organização do trabalho o auge da racionalidade se deu com a emergência da administração científica, o Taylorismo, e na organização da produção com a linha de montagem automatizada da Ford. Duas poderosas imagens são normalmente utilizadas como forma de ilustração desses princípios de organização: a máquina, como metáfora da organização, composta por diversas partes interconectadas com funções específicas; e a do maestro que conduz a orquestra, para ilustrar a ação do gestor e da equipe de trabalho. Aqui a lógica é a mesma, um mecanismo de coordenação central que conduz uma atividade altamente organizada, na qual cada indivíduo tem uma função específica e bem determinada, que contribui para o todo.
Apesar do grande sucesso na condução de vários aspectos da ação humana, o recurso a uma ação baseada exclusivamente na racionalidade sempre mostrou as suas limitações. A emergência de um novo paradigma nas ciências exatas abriu as portas dos estudos gerenciais para a complexidade com importantes desdobramentos na forma de conceber o homem, o trabalho e a organização.
Na teoria (e em muitos lugares, também na prática) a imagem do maestro e da orquestra foi substituída pela improvisação do grupo de jazz; a flexibilidade impôs a desestruturação da linha de montagem que passa a se organizar na forma de células e grupos semi autônomos; e a metáfora da máquina foi substituída pela do organismo, que se adapta e evolui em função de variações no contexto.
Entretanto, as visões e concepções de formas tradicionais de gestão ainda estão presentes no nosso cotidiano e são largamente difundidas nas escolas de gestão e em diversos manuais. Não é por acaso é que das primeiras coisas que se aprende estão as cinco funções (racionais) da gestão: planejamento, organização, direção controle e coordenação. Até que no papel isso funciona bem, mas na prática…há controvérsias!
Uma das razões dessa resistência de concepções tradicionais de gestão pode ser encontrada em nossa própria em nossa dificuldade de conviver com a incerteza, a irracionalidade, a complexidade e as emoções. Precisamos de rotina. Temos dificuldade de convivência com a ambiguidade, queremos razões claras para ações e comportamentos e lidamos mal com comportamentos que divergem do padrão. Por outro lado, práticas tradicionais ainda se mostram efetivas em inúmeros contextos e práticas modernas costumam são de difícil aplicação. E por ai vão se acumulando tensões e contradições.
Qual é a solução? Não sei, mas me parece que quanto mais rapidamente aceitarmos a ideia de que a imagem que melhor descreve a organização e o trabalho parece ser a do caos organizado, mais rapidamente teremos respostas aos problemas que nos afligem.