Karla Borges

Economia

Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

A TRSD, popular taxa de lixo

Uma das inovações na área tributária realizadas pelo Município do Salvador em 2013 foi a possibilidade de dispensa de pagamento da Taxa de Coleta, Remoção e Destinação de Resíduos Sólidos Domiciliares (TRSD) para os grandes produtores de lixo. Pelo novo texto, o Poder Executivo pode estabelecer regramento específico aos grandes geradores de resíduos sólidos, como os proprietários, possuidores ou titulares de estabelecimentos públicos, institucionais, de prestação de serviços, comerciais e industriais, com exceção dos residenciais, desde que produzam volume superior a 300 litros diários, determinando a obrigatoriedade de coleta, transporte, tratamento e destinação final dos resíduos sólidos gerados.

Coube aos Decretos 25.316/14 e 26.916/15 disciplinar o §4º do artigo 160 da Lei 8473/13 que prevê a dispensa, permanecendo em vigor até hoje. O fato é que em 18/11/16 o Decreto 27.946/16 revogou os dois decretos citados que regulamentavam esse dispositivo da lei sem a publicação de qualquer outra norma acerca da matéria. Desta forma, os contribuintes que haviam sido poupados do recolhimento do tributo nos exercícios de 2015 e 2016 foram surpreendidos com o recebimento do boleto de 2017, incluindo além do IPTU, a cobrança da TRSD.

Os decretos e demais atos normativos de natureza regulamentar entram em vigor com a sua publicação. Uma lei vigorará até que uma outra a modifique ou revogue. O caso em questão é que a citada lei não foi revogada, continua válida possibilitando a dispensa do pagamento, todavia, os decretos que a disciplinam é que foram revogados.  É certo que a revogação é um ato que se opera para o futuro, proveniente da conveniência e oportunidade do administrador público, mas por outro lado as isenções tributárias, sob condição onerosa, não podem ser livremente suprimidas (Súmula 544 /STF).

Não resta dúvida de que seria contrária à Constituição a concessão de qualquer espécie de exoneração tributária por regulamento do executivo. A lei foi clara ao dispor sobre a dispensa de pagamento do tributo caso o contribuinte seguisse e obedecesse às condições previstas pelos decretos agora revogados. O Supremo Tribunal Federal por reiteradas vezes assentou que é vedado ao chefe do Poder Executivo expedir decreto a fim de suspender a eficácia de ato normativo hierarquicamente superior. (ADI 1.410-MC, Rel. Min. Ilmar Galvão, Plenário, DJ 1º.2.2002).

O impacto na arrecadação da TRSD dos últimos dois anos foi significativo em decorrência desse regramento disposto em lei fortemente combatido pelos estudiosos por conceder uma espécie de “isenção” a quem mais tem capacidade contributiva e por não haver efetivamente controle e fiscalização sobre essa coleta e sua destinação. Imaginaram se todos os contribuintes pudessem solicitar ao poder público recolher e tratar o seu próprio lixo para ficarem livres do pagamento da taxa?

A iniciativa da administração municipal em acabar com esse curioso benefício é louvável, contudo se existe uma lei que possibilita a dispensa de pagamento, ela só pode ser revogada por outra lei. O princípio da hierarquia das leis preconiza que um ato legislativo em sentido formal somente pode ser alterado da mesma maneira do seu ato constitutivo, ou seja, é proibida a revogação de uma lei por meio de Decreto, pois se violaria o art. 59 da CF. Embora os decretos municipais tenham sido revogados em novembro de 2016, a lei que dispõe sobre a matéria continua tipificada no Código Tributário e de Rendas do Município do Salvador, Lei 7.186/06.

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