26 novembro 2024
Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.
As leis que modificaram a forma de cálculo do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU de Salvador a partir de 2014 apresentam graves contradições em relação às legislações anteriores e são distintas de todas as outras existentes no Brasil. Até o exercício de 2013, o Código Tributário e de Rendas dispunha da tabela de receita desse tributo, através de um anexo, portanto qualquer alteração que fosse promovida na tabela era submetida ao aval do Poder Legislativo.
Anteriormente as alíquotas incidentes sobre o IPTU variavam de acordo com o padrão construtivo do imóvel. Com a nova lei, elas passaram a oscilar em função dos valores venais. Contudo, a Lei 8464/13 omitiu os dados numéricos dos valores venais, não permitindo associar a alíquota correspondente à faixa de enquadramento do imóvel. O mesmo diploma legal remeteu ao Poder Executivo a possibilidade de dispor sobre os números da tabela. Ora, bases de cálculo e alíquotas devem ser fixadas por lei em sentido estrito, jamais por regra infralegal. Ademais, qualquer norma de hierarquia inferior não tem o condão de mudar uma lei existente, somente regulamentá-la.
A Instrução Normativa 12 de 20.12.13 além de preencher numericamente a tabela de receita da Lei 8464/13, inovou ao criar uma faixa de valores dedutíveis não existentes na lei. Foi a partir daí que os contribuintes puderam conhecer em qual faixa o seu imóvel estaria contido, a alíquota correspondente e quais valores seriam deduzidos da base de cálculo do IPTU. Pode-se comparar o que ocorreu com a edição de palavras cruzadas com espaços sem preencher, o que torna impossível a compreensão. As informações só foram publicadas posteriormente por ato discricionário do Executivo.
As travas contidas no artigo 4º da Lei 8473/13 imputam uma progressividade no cálculo do tributo relacionada à extensão do imóvel, elemento não permitido pela Constituição Federal. Embora a intenção tenha sido limitar o valor do imposto, as travas não poderiam dar tratamento diferenciado e estabelecer progressividades distintas para os imóveis por ferir o princípio da isonomia tributária. A progressividade somente pode ocorrer de acordo com o valor venal, localização, uso ou pelo cumprimento da função social da propriedade.
A urgência na tramitação da matéria à época na Câmara Municipal, a ausência de audiências públicas, a falta de debate entre os edis de assunto tão relevante, o grave erro material na tabela de receita de terrenos, a sua republicação sem nova apreciação do legislativo, a desobediência ao regimento da casa, conforme comprova a 62ª Ata da Sessão Ordinária, já seriam motivos suficientes para que o IPTU de 2014 de Salvador fosse suspenso em 2014, não impactando nos exercícios subsequentes.
Numa cidade que possui mais de 600 mil imóveis tributáveis é humanamente impossível avaliar os casos concretos um a um, até porque as premissas de inconstitucionalidade são as mesmas para todos. Os contribuintes clamam por justiça, almejam regularizar os seus débitos para com o fisco municipal, desde que haja respeito aos princípios constitucionais consagrados com o lançamento do imposto nos moldes de regras claras, transparentes, não discricionárias e que façam jus à segurança jurídica e à legalidade tributária.