Ernesto Britto Ribeiro

Turismo e Economia criativa

Ernesto é mestre em Administração Estratégica e trabalha com foco em desenvolvimento turístico desde 2001. Foi professor de disciplinas de Planejamento Turístico e Políticas Públicas de Turismo na Faculdade Visconde de Cairu e na Factur. Foi secretário municipal em Itaparica e sub-secretário em Salvador. É sócio da SOBRETURISMO CONSULTORIA, empresa especializada em projetos de desenvolvimento setorial, com inúmeros trabalhos na Bahia e no Piauí, sempre na área de turismo e economia criativa. Ele escreve às sextas-feiras neste Política Livre.

Economia Criativa. Que trem é esse?

Está na agenda do desenvolvimento econômico em várias partes do mundo o fomento à economia criativa, que se baseia no adensamento dos setores que têm a criatividade humana como seu principal insumo. Alguns dos autores mais importantes do mundo sobre esse assunto apontam uma lista de segmentos criativos que giram em torno da arquitetura, artes visuais – fotografia, pintura, escultura, áudio visual – cinema, televisão e propaganda, comunicação – TV e rádio, design, digital – games, aplicativos e startups, editoração, expressões culturais – artesanato, arte popular, gastronomia, dança e festas populares, moda, música e outras.

Esses segmentos, que alavancam a economia criativa, são também chamados de indústrias criativas, principalmente em países de língua inglesa, como a Austrália e a Inglaterra, berço mundial do estudo do desenvolvimento da economia criativa. Na Inglaterra, foi o Primeiro Ministro Tony Blair que envolveu a sociedade britânica para discutir e promover os setores da economia que se alimentam da criatividade, identificando que esse movimento traria consequências em vários outros setores que são impulsionados pelas indústrias criativas. Só para dar um exemplo, a moda inglesa movimenta a indústria têxtil mundial, assim como a música promove o desenvolvimento da milionária indústria fonográfica.

A economia criativa agrega conceitos como a economia da experiência, que identifica os aspectos intangíveis das experiências memoráveis na geração de valor, a economia do conhecimento, que envolve tecnologia, pesquisa e desenvolvimento, direitos de propriedade e capacitação de mão de obra, a economia solidária que descobre novas formas de troca e, sobretudo, a economia da cultura, que se baseia em elementos autênticos, históricos e simbólicos, para gerar valor para os produtos e serviços. Tudo isso pode parecer muito teórico, mas na prática, a economia criativa faz parte da economia geral de qualquer cidade, em diferentes graus de desenvolvimento.

Em Salvador, por exemplo, nós temos uma forte gastronomia, que gera milhares de empregos nos bares e restaurantes e que movimenta a economia como um todo, visto que os trabalhadores dos restaurantes gastam seus salários em outros estabelecimentos, como mercados e farmácias, que também se beneficiam como um efeito em ondas. Falando da economia criativa de Salvador, não se pode deixar de falar da música, que envolve as bandas, cantores, músicos, compositores, produtores, prestadores de serviços nos shows, iluminação, som, segurança, transporte e tantos outros serviços. Em um mega evento como o Festival de Verão, isso pode ser ampliado para arquitetos, engenheiros, cinegrafistas, diretores de arte e por aí vai. Nessa mesma linha de pensamento, temos ainda as artes plásticas, envolvendo artistas, aprendizes, galeristas, vendedores e outros. Temos ainda na economia criativa de Salvador os artesãos, os webdesigners e tantos outros profissionais que são remunerados e, algumas vezes, muito bem remunerados, tendo seu trabalho baseado em sua própria criatividade ou na criatividade dos outros.

É interessante perceber que essas atividades, muitas vezes, encontram-se geograficamente próximas, chamadas de cidades criativas ou territórios criativos. São espaços onde a economia criativa se mostra pujante ou capaz de se desenvolver. Basta perceber quantos restaurantes existem no Rio Vermelho e imaginar o efeito que isso causa na economia da cidade, seja pelos pagamentos que são feitos a fornecedores que se beneficiam daquele movimento intenso nos bares e restaurantes, seja pelos empregos que são gerados naquele território. Na Ribeira também encontramos dezenas de restaurantes muito próximos uns dos outros, causando um efeito positivo na economia criativa do território. Ao se falar de artistas plásticos, artesãos, galeristas, produtores culturais e outros profissionais do ramo das artes visuais, o Santo Antônio Além do Carmo aparece como um território pra lá de criativo, mas se falarmos de músicos, bandas, escolas de música, rádios e estúdios de gravação, o Candeal é o foco.

Ora, se existe toda uma economia que gira em torno das atividades criativas, se ela beneficia uma infinidade de pessoas e, ainda, se as atividades localizam-se próximas umas das outras, então podemos desenvolver políticas públicas e privadas para estimular o desenvolvimento desses negócios criativos e beneficiar mais e mais pessoas. Nessa linha estão instituições de fomento, como o Sebrae que possui a sua Unidade de Economia Criativa, e até a Fieb já começa a trilhar nesse sentido. O Ministério da Cultura, no ano passado, criou a Secretaria Nacional de Economia Criativa, que tem como missão formular as políticas públicas para o desenvolvimento da economia criativa, priorizando o apoio e o fomento aos profissionais e aos micro e pequenos empreendimentos.

Assim, o desafio é identificar territórios e suas potencialidades, criar as condições para que os negócios prosperem, legislação para fomentar, facilitar, atrair e reter negócios criativos e incentivar para que os moradores de Salvador frequentem e promovam a economia criativa da cidade, bem como divulgar para que turistas curtam a cidade com tudo isso que ela tem de mais singular. O caminho é longo, mas o resultado pode ser pra lá de prazeroso.

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