Karla Borges

Economia

Professora de Direito Tributário, graduada em Administração de Empresas (UFBA) e Direito (FDJ) ,Pós-Graduada em Administração Tributária (UEFS), Direito Tributário, Direito Tributário Municipal (UFBA), Economia Tributária (George Washington University) e Especialista em Cadastro pelo Instituto de Estudios Fiscales de Madrid.

Não é só a atividade-fim!

O Projeto de Lei de Terceirização, agora tramitando no Senado, tem sido alvo de ataques de diversos segmentos da sociedade. Apesar da permissão da terceirização da atividade-fim concentrar a maior atenção dos críticos, o critério de enquadramento sindical dos empregados terceirizados é considerado a parte mais preocupante do texto, por expressar, sem nenhum disfarce, o desejo do legislador em precarizar as relações de trabalho.

Pela regra do projeto, quando o contrato de prestação de serviços dos terceirizados envolver empresas que integrem a mesma categoria econômica, os empregados da contratada serão representados pelo mesmo sindicato que representa os empregados da contratante, conforme prevê o artigo 511 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Caso contrário, os empregados envolvidos no contrato de terceirização serão integrados ao sindicato que representa a empresa contratada, ainda que exerçam as mesmas atividades dos empregados da contratante.

Esse critério de ajuste sindical consagra a real intenção de fragilizar as relações de trabalho, pois, enquanto as empresas investem na fusão para ficarem cada vez mais fortes, o Projeto de Lei de Terceirização aposta na divisão dos trabalhadores, entre vários sindicatos profissionais, para torná-los mais fracos. Se, hoje, os empregados que trabalham em bancos são representados basicamente pelo Sindicato dos Bancários, amanhã, não mais serão. A fragmentação dos sindicatos por atividade terceirizada contratada motivará, assim, o surgimento dos sindicatos dos auxiliares administrativos, dos técnicos, dos compensadores, entre outros. (Nesta hipótese, a terceirizada contratada somente integraria a mesma categoria econômica da contratante, se tivesse autorização do Banco Central para atuar como instituição financeira).

Nesse cenário, não será difícil supor que essa forma de definição sindical atingirá, significativamente, o direito à isonomia (trabalho igual, salário igual), tendo em vista que permitirá que empregados contratados por empregadores distintos – um diretamente pelo contratante e outro por intermédio da terceirizada contratada – recebam como contraprestação ao trabalho igual, diferentes salários e vantagens oriundas de normas coletivas absolutamente distintas. Enquanto o contratado diretamente pelo contratante tenderá a receber maiores salários e vantagens oriundas das normas coletivas, porque seria representado por sindicato profissional que defende os direitos e interesses da categoria com um todo; o outro, o contratado por intermédio da terceirizada contratada, tenderá a receber menores salários e vantagens oriundas das normas coletivas por ser representado por sindicato profissional que defende os direitos e interesses de apenas uma parte da categoria.

Na prática, essa fragmentação da organização sindical não feriria de morte apenas o direito à isonomia, mas, também, o próprio direito de greve, porquanto sem uma pauta única, que compreenda os direitos e interesses defendidos pelos mais variados sindicatos profissionais terceirizados, seria praticamente impossível utilizar a paralisação de toda a empresa como alternativa de pressão para a efetivação da negociação coletiva. Notadamente, envolver-se-ia mais de uma das oito centrais sindicais reconhecidas pelo Ministério do Trabalho e Emprego.

Exatamente porque os direitos à isonomia e à greve não podem ser afetados pelo desejo do legislador em precarizar as relações de trabalho, o modelo de enquadramento sindical deveria ser determinado de acordo com a atividade da contratante. Somente assim, seria possível ter garantia de que os trabalhadores contratados diretamente pelo contratante ou por intermédio da terceirizada contratada receberiam os mesmos direitos e vantagens provenientes das normas coletivas.

Aliás, se o modo de definir o sindicato for estabelecido de acordo com a atividade da contratante, toda a discussão acerca da permissão da terceirização da atividade-fim perderá importância, haja vista que, caso os direitos e vantagens decorrentes das normas coletivas dos trabalhadores contratados diretamente pelo contratante ou por intermédio da terceirizada contratada sejam iguais, não haverá motivo para se preocupar em precarização das relações de trabalho.

Ilude-se quem pensa, portanto, que a luta contra o Projeto de Lei de Terceirização deva se concentrar apenas na permissão da terceirização da atividade-fim, uma vez que essa questão, certamente, teria seus efeitos atenuados, caso o critério de enquadramento sindical venha a ser definido de acordo com a atividade da contratante.

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