24 dezembro 2024
Adriano de Lemos Alves Peixoto é PHD, administrador e psicólogo, mestre em Administração pela UFBA e Doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia do Trabalho da Universidade de Sheffiel (Inglaterra). Atualmente é pesquisador de pós-doutorado associado ao Instituto de Psicologia da UFBA e escreve para o Política Livre às quintas-feiras.
Sempre achei curiosas as explicações que bandidos dão quando são pegos em flagrante delito: “não fui eu, eu não sabia de nada”. “Nunca antes na estória de minha vida aconteceu algo semelhante”…, e por ai vai. Parece que são poucos os que realmente assumem a autoria, mesmo quando existem provas irrefutáveis nessa direção. É possível que exista uma explicação psicológica para tal fenômeno. Eu confesso que não a conheço. O fato é que não deixo de me surpreender quando isso acontece.
E foi tomado por extrema surpresa, que nesse caso específico veio acompanhada de profunda indignação, que li, na semana passada, notícias sobre trabalho análogo ao escravo nas obras de expansão do aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. Segundo o Ministério Público do Trabalho, pessoas estão sendo aliciadas nas regiões norte e nordeste, sob promessa de emprego, para constituírem um contingente de reserva nas obras do aeroporto. Mais ainda, em uma obra sob a responsabilidade direta de uma das maiores empreiteiras nacionais, a baianíssima OAS.
Quando falamos de trabalho escravo, uma primeira ideia nos remete às imagens características da escravidão no Brasil colônia e império. Entretanto, a própria noção de trabalho escravo se modernizou junto com a sociedade. Nos dias atuais, essa categoria engloba formas de trabalho bastante diversas que vão desde o vínculo forçado em função de débito ao tráfico de pessoas. Normalmente, as vítimas desse tipo de situação são as pessoas de camadas mais vulneráveis da população.
Situações como esta atingem diretamente elementos constitutivos mais profundos da dignidade humana. Afinal, o trabalho em condições normais, é fonte de sustento para famílias; o trabalho tem um forte propósito social, já o seu produto (seja um bem ou um serviço) é útil para a sociedade e para outras pessoas; o trabalho é importante espaço de interação social; e o trabalho significativo contribui decisivamente para a auto realização dos indivíduos e para o desenvolvimento da autoestima. É por motivos como estes que, ao permitir o trabalho escravo no seio de nossa sociedade, nós colocamos em xeque a nossa própria humanidade.
Não podemos fechar os olhos a este tipo de situação. Não podemos admitir que uma grande empresa nacional permita que práticas como estas se perpetuem em nossa sociedade; não existem argumentos que justifiquem esta realidade.
Voltando ao aeroporto, não deixa de ser curioso que, quando a fiscalização flagrou 111 trabalhadores morando na obra do aeroporto, as empresas envolvidas alegaram desconhecer a situação. Isso lembra aquela estória que termina mais ou menos assim: “[…] está tudo muito bom, está tudo muito bem. Somos todos pessoas honestas, mas roubaram a minha carteira”. Vergonha GRU Airport. Vergonha OAS!