Foto: Robert Leal/Divulgação
Tribunal de Justiça de Minas Gerais 21 de outubro de 2022 | 10:59

TJ de MG aprova verba retroativa para magistrados que custará R$ 5 bilhões

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O Órgão Especial do TJ-MG (Tribunal de Justiça de Minas Gerais) aprovou o pagamento de verbas retroativas a 2006, a serem acrescentadas aos salários dos juízes e desembargadores do estado. Nos cálculos do presidente da Corte, desembargador Arthur Carvalho, o custo será de cerca de R$ 5 bilhões, entre vários “penduricalhos”, como o adicional do tempo de serviço, ou quinquênio.

A contragosto dos colegas de plenário, ele defendeu na sessão, realizada no dia 14 de setembro, que o caso seja analisado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) antes que qualquer pagamento seja feito.

“Eu não vou fazer um pagamento de R$ 5 bilhões sem submeter esse valor ao Conselho Nacional de Justiça. Tenho certeza de que qualquer um dos senhores não faria de outra maneira”, disse Carvalho durante a votação unânime —o Órgão Especial do tribunal é formado por 25 desembargadores, mas não foi divulgado se todos estavam presentes na sessão.

Em uma petição ao CNJ nesta semana, Carvalho disse que uma parte dos pagamentos é correta e incontroversa. Essa parcela, cujo valor se ignora, foi creditada na conta dos magistrados em 1º de outubro. A outra parte só vai ser paga com o aval do conselho, afirmou o desembargador.

Procurada pelo UOL, a assessoria do TJ de Minas disse que a estimativa precisa do custo do pagamento de verbas retroativas ainda está sendo quantificada.

O valor de R$ 5 bilhões seria o suficiente para bancar quase um mês do Auxílio Brasil quando ele ainda era de R$ 400. Antes de ser elevado, o benefício consumia R$ 7 bilhões por mês —são 18 milhões de famílias atendidas.

O TJ de Minas justificou a decisão de pagar verbas retroativas após o tribunal fluminense aprovar pagamentos semelhantes no ano passado, como o UOL revelou. No Rio, até os promotores —que integram o Ministério Público— se movimentaram para obter as verbas retroativas, principalmente adicional de tempo de serviço.

Em Minas, os colegas de Carvalho criticam seu posicionamento —de consulta ao CNJ— mesmo depois de serem informados do volume de dinheiro a ser desembolsado dos cofres públicos. O UOL obteve uma das cópias do vídeo da sessão na qual um desembargador —não é possível identificar qual deles pelas imagens— disse que o corregedor do CNJ, ministro Luís Felipe Salomão, tem origem na magistratura do Rio, que já recebe o benefício.

“Presidente, eu acho que não vai ter problema nenhum, não, porque o ministro Salomão tá recebendo [pelo] Rio”, diz o desembargador, antes de emendar uma risada.

O UOL solicitou à assessoria do TJ de Minas a ata com a lista de presença a transcrição completa da sessão de 14 de setembro, mas não obteve o documento.

Atualmente, um desembargador do TJ de Minas ganha R$ 35 mil brutos por mês, quase o limite salarial do STF (Supremo Tribunal Federal), que é de R$ 39 mil mensais. Já um juiz de primeira instância recebe pelo menos R$ 30 mil brutos mensalmente, segundo o Portal da Transparência.

Interpretação do STF. O pagamento de verbas retroativas se deve a uma interpretação de um julgamento do STF, de acordo com declarações do presidente do TJ-MG, na sessão que tratou do tema.

Em 2014 (por liminar) e 2020 (julgamento da decisão), o Supremo decidiu que o teto salarial dos desembargadores era igual ao deles —hoje fixado em R$ 39 mil mensais. Por isso, interpreta-se que essas verbas pessoais precisam ser reajustadas e pagas retroativamente há 16 anos.

“É uma interpretação que o Rio Janeiro fez com relação à abrangência e à extensão do voto da ministra [do STF, Rosa Weber], que poderá não ter essa abrangência e essa extensão”, afirmou Carvalho no julgamento do TJ-MG.

“Por isso a necessidade de submeter essa questão ao CNJ, para que ele se posicione se a interpretação dada pelo ilustre corregedor no voto é realmente vem de maneira coerente com o que foi decidido pelo STF”, disse o presidente do tribunal mineiro.

TJ vê ‘premissa aplicável’. Em nota, a assessoria do TJ de Minas afirmou que a decisão do Supremo criou uma “premissa aplicável” a outras situações. “O Supremo Tribunal Federal decidiu, com repercussão geral, (..) estabelecendo premissa a ser aplicável em todas as situações jurídicas idênticas”, diz.

O tribunal avaliou que “eventual equívoco no pagamento de servidores ou magistrados, fundado em decisão judicial, pode repercutir na composição de saldo retroativo”. “Inviável tecer qualquer consideração quanto à expressão ‘supersalário’, até porque de conteúdo indeterminado”, afirma a nota.

O presidente da Amagis (Associação de Magistrados de Minas), o juiz Luiz Carlos Rezende, disse ao UOL considerar o aumento um “direito adquirido”.

“O que ocorreu foi que o STF reconheceu que as vantagens pessoais (relacionadas ao tempo de serviço) que os magistrados possuíam ao tempo da entrada em vigor da Emenda Constitucional 41 [que trata da remuneração e do subsídio dos servidores] não poderiam ser excluídas da remuneração de cada um deles, posto que acobertadas pelo direito adquirido”, disse o juiz Luiz Carlos Rezende.

Se os penduricalhos excederem o limite legal, há os chamados “supersalários”. O presidente da Amagis, porém, nega a possibilidade de isso acontecer. “O máximo que ocorrerá será a remuneração do magistrado chegar ao teto do STF”, afirmou o juiz, em respostas encaminhadas por email à reportagem.

A reportagem perguntou ao CNJ e ao Conselho Nacional do Ministério Público se há uma estimativa de gasto se todos os 27 tribunais e Ministérios Públicos tomarem a mesma decisão do TJs do Rio e Minas. O CNJ não se manifestou.

Os promotores dizem não saber o custo da medidas “Depende de estudo aprofundado, para o qual esta Comissão [de Controle Administrativo e Financeiro] não dispõe, no momento, de elementos de informação suficientes”, disse a assessoria do CNMP.

Carla Araújo e Eduardo Militão/UOL/Folhapress
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