10 junho 2025
Vazamentos, acidentes e altas emissões de gases do efeito estufa são alguns dos problemas apontados por moradores de municípios onde o petróleo é amplamente explorado no Brasil.
Além dos riscos ambientais, especialistas criticam o que chamam de “corrida contra o tempo” do país na busca por novos locais para exploração do combustível fóssil. Segundo eles, a pressa é inócua uma vez que a demanda de petróleo deve sofrer grande desaceleração nos próximos anos.
O pescador Humberto Sales Almeida, 42 anos, nasceu e foi criado na comunidade Baía do Araçá, na cidade de São Sebastião, em São Paulo. Filho e neto de pescadores, ele diz que a chegada da indústria do petróleo modificou a pesca artesanal da região.
Na memória, ficou a época em que saía com o pai para fazer a pesca de caceio. Eles jogavam a rede a favor da maré e voltavam com o pescado para vender na comunidade.
“Hoje a gente que mora aqui em São Sebastião, tem o porto de carga seca, temos o petroleiro ali no meio e é tudo dentro de onde a gente pescava”, afirma.
“A gente não pode mais pescar nessa área devido ao tráfego de embarcações de navios, também do prático que passa ali e já passou por cima de pessoas, quase tirando a vida. A própria Capitania [dos Portos] multa quando a pessoa passa próximo a um navio, se esquecem que a comunidade era ali”, diz.
A cerca de 30 quilômetros de distância da comunidade de Humberto, a pescadora Ladisla Crispim dos Santos afirma que costumava pescar com rede na margem, aproveitando a maré, além de coletar mariscos.
“Eu sustentei muito tempo mesmo os meus filhos com o marisco da areia, que a gente chama aqui de berbigão, nós aqui, caiçaras, chamamos de ‘bibigão’. Umas bolinhas assim de marisco, muito gostoso, mesmo”, conta a moradora da região do Porto Novo, em Caraguatatuba.
Segundo ela, tanto o pescado quanto o marisco eram abundantes. “A gente passava e cutucava assim com o calcanhar, com o pé, para pegar. Quando teve o primeiro vazamento de petróleo aqui no litoral, não acabou por completo a gente ainda encontrava, mas veio o segundo vazamento, pronto. Não tem mais nem para contar a história”, diz.
Acidentes
No último ano, o Brasil registrou 731 acidentes marítimos comunicados por operadoras de petróleo à Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) – o maior número já registrado pela agência cuja série histórica iniciou em 2012 com 349 acidentes.
O número compreende todos os tipos de incidentes de comunicação compulsória, independentemente de vazamento. “Entre eles, encontram-se: falhas em equipamentos, falhas em poços, acidentes com funcionários, doenças, entre outros”, destacou a ANP, em nota.
Na região do litoral de São Paulo, o primeiro vazamento de maior proporção ocorreu em 2013. A Petrobras Transporte (Transpetro) foi condenada pelo impacto causado na região.
Segundo os pescadores, outros eventos com danos permanentes foram registrados no local. “Eles jogam dispersante em cima do convés [do navio] e batem água. Então vem todo esse dispersante para o mar que, com o tempo, afunda e vai parar no recife e mata todos os ovos de peixes”, diz.
Perdas e danos
Esses e outros prejuízos foram reunidos no Relatório Analítico de Perdas e Danos da Cadeia do Petróleo e Gás do Pré-Sal, produzido pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e pelo Fórum de Comunidades Tradicionais (FCT), por meio do Observatório de Territórios Sustentáveis e Saudáveis da Bocaina (OTSS).
Segundo Ana Flávia Pinto, pescadora da Praia do Peres, em Ubatuba, e coordenadora da Frente Luta da Pesca Artesanal do FCT, o documento reúne danos econômicos, sociais, culturais e emocionais.
“A gente tem sido impactado de várias formas. Os fundeiros de navio, essa passagem dos petroleiros, têm diminuído o pescado e dificultado para nós, tanto o sustento das nossas famílias, como a geração de renda nas comunidades e também o perigo de a gente estar ali no pesqueiro, com a rede de embarcação, e, de repente, a gente é atropelado, ou tem atropelado os apetrechos de pesca. A gente vem sentindo muito medo mesmo”, diz.
Novas frentes
No dia 17 de junho, a ANP realizará o 5º Ciclo da Oferta Permanente de Concessão (OPC), quando serão leiloados 332 blocos de petróleo e gás em todo o país. As novas frentes incluem 47 blocos na bacia da Foz do Amazonas, na Margem Equatorial, área do litoral do país apontada como o novo pré-sal. Localizada no Norte do país, entre os estados do Amapá e Rio Grande do Norte, a Margem Equatorial apresenta significativo potencial petrolífero. As reservas são estimadas em pelo menos 30 bilhões de barris de petróleo, segundo a Petrobras.
As áreas da bacia da Foz do Amazonas poderão ser leiloadas devido a uma nota técnica, de julho de 2020, que define locais admissíveis às atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural. O documento é assinado pelos Ministérios de Minas e Energia e do Meio Ambiente.
A nota técnica, entretanto, não substitui a exigência da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS), apenas permite que os leilões ocorram enquanto o processo de licenciamento ainda está em andamento.
Nesta semana, a Petrobras conseguiu aprovação, pelo Ibama, do plano sobre a fauna para o bloco FZA-M-59, na Bacia da Foz do Amazonas, localizado a 175 quilômetros (km) da costa, em uma profundidade de 2.880 km.
O plano é uma das medidas para a obtenção da licença ambiental para perfuração de poço exploratório em águas profundas do litoral do Amapá.
Agência Brasil