8 novembro 2024
Uma das filhas do ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias (PT), ganhou um cargo no gabinete do deputado distrital Chico Vigilante (PT), presidente da CPI dos Atos Antidemocráticos. Ela é formada em arquitetura e tem uma empresa de beleza. Três meses depois, o filho do parlamentar petista foi nomeado como assessor da suplente de Wellington Dias no Senado. Ele não trabalha no local e é desconhecido pelos próprios colegas.
Filha mais velha de Wellington Dias, a arquiteta Iasmin Dias Helou, 32 anos, foi nomeada em 24 de janeiro no gabinete de Chico Vigilante para exercer um cargo especial. O salário dela é de R$ 8.767,12.
Iasmin é formada em arquitetura e urbanismo desde 2018, segundo seu registro no Linkedin. Depois disso, fez um curso de branding na Escola de Negócios da Moda e abriu uma marca de skincare e beleza, a Mooi Natural Beauty. O Estadão foi ao gabinete do deputado nessa quarta-feira, 4.
À reportagem, a filha do ministro se limitou a explicar que trabalha na comunicação do parlamentar. Vigilante afirmou, em nota, que Iasmin não foi nomeada em razão de ser filha do ministro de Lula. “A servidora em questão foi designada para o exercício do cargo em razão de sua competência, demonstrada através da função exercida diariamente e pessoalmente em meu gabinete.”
Já Flávio Morais dos Santos, filho de Vigilante, foi nomeado em 27 de abril como auxiliar parlamentar júnior no gabinete da senadora Jussara Lima (PSD-PI), suplente de Wellington Dias. O salário é de R$ 6.080,09. Antes disso ele trabalhava como motorista na liderança da minoria no Congresso, mas foi exonerado depois de o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) assumir a função.
O Estadão também foi ao gabinete de Jussara nessa quarta, mas não encontrou Flávio no local. Aliás, ninguém o conhecia. “Tem algum Flávio Morais dos Santos aqui?”, perguntou a chefe de gabinete aos colegas, que responderam negativamente.
Flávio é sócio de uma empresa de tecnologia, administração e construção, a MSantos. A companhia foi aberta em julho de 2021 e tem sede em Taguatinha, Brasília. À reportagem, o filho do deputado afirmou, por telefone, que trabalha no Senado desde dezembro de 2016. “Fui admitido no gabinete da senadora Jussara para desempenhar o papel de assessor. Acompanho comissão, vejo questão da pauta que acontece”, disse. “Sou pai de família, filho, agora tenho neta para criar, tenho que trabalhar, muita conta para pagar.”
A situação pode configurar nepotismo cruzado, o que viola a Constituição Federal, segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) desde 2008.
“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal”, diz Súmula Vinculante da Corte.
A relação entre Wellington Dias e Chico Vigilante vai além de serem colegas partidários. Eles se chamam de “companheiro” e “amigo”. No último dia 25 de setembro o distrital promoveu uma audiência na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) para Dias apresentar os programas do governo federal que atendem as famílias em situação de vulnerabilidade.
Para Vigilante, não há vedação legal que impeça que parentes de políticos exerçam funções públicas comissionadas. Ele disse que Iasmin gerencia as redes sociais dele.
“É louvável que a filha de um governador, eleito por 4 mandatos no estado do Piauí, desempenhando o papel público por 16 anos, se disponibilize para o trabalho e o faça com o empenho demonstrado desde que lhe foi confiado este encargo. A permanência da servidora em meu gabinete é motivo de orgulho, por sua dedicação constante e inequívoca eficiência”, acrescentou.
Por fim, negou a existência de nepotismo cruzado. “Reitero que não há impedimento para que parentes de políticos trabalhem e se empenhem para o bom funcionamento dos três Poderes. Afirmo, mais uma vez, que não há nenhuma troca ou transição ilícita nas nomeações em apreço.”
Por sua vez, Jussara Lima disse que o filho de Chico Vigilante solicitou oportunidade no gabinete “por conta da mudança de governo”. “Não houve interferência do ministro Wellington Dias”, acrescentou. O ministro do Desenvolvimento Social foi procurado, mas não respondeu.
Tácio Lorran/Estadão Conteúdo