22 novembro 2024
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) mudou de tom e criticou pela primeira vez, nesta terça-feira (26), o bloqueio à candidatura da opositora Corina Yoris, nome escolhido pela principal força de oposição contra o chavismo nas eleições de julho na Venezuela.
Em nota, o Itamaraty disse que “acompanha com expectativa e preocupação o desenrolar do processo eleitoral” no país, marcando uma inflexão na postura até então adotada por Lula em relação ao regime do ditador Nicolás Maduro, de preservar o aliado sul-americano.
“O Brasil reitera seu repúdio a quaisquer tipos de sanção que, além de ilegais, apenas contribuem para isolar a Venezuela e aumentar o sofrimento do seu povo”, afirma ainda o comunicado do Ministério de Relações Exteriores.
Ao menos outros sete países da América Latina já haviam expressado “grave preocupação” com o impedimento da candidatura nesta segunda (25), em uma nota conjunta de Argentina, Uruguai, Peru, Paraguai, Costa Rica, Equador e Guatemala. O Brasil decidiu aguardar o fim do prazo eleitoral para se pronunciar.
A professora universitária Corina Yoris seria a candidata da coalizão Plataforma Unitária, em substituição a María Corina Machado, que foi inabilitada para exercer cargos públicos por 15 anos pelo regime. María Corina venceu com folga as primárias da oposição no ano passado e era favorita nas pesquisas.
A aliança, porém, denunciou nesta segunda que foi impedida de incluir Yoris na disputa. “Fizemos todas as tentativas de inserir os dados e o sistema está completamente fechado para poder entrar digitalmente”, afirmou Yoris em entrevista coletiva a horas do encerramento do prazo para as inscrições.
O Itamaraty afirmou que o impedimento “não é compatível com os acordos de Barbados” e “não foi, até o momento, objeto de qualquer explicação oficial”, destacando que não há nenhuma decisão judicial contra a candidata.
Os acordos de Barbados foram entendimentos entre o regime de Maduro e a oposição, com mediação internacional, que permitiram a convocação das eleições deste ano. No entanto, houve recrudescimento da perseguição a opositores nos últimos meses, incluindo a inabilitação de Machado e a prisão de diversos críticos ao regime.
Maduro aspira a iniciar um terceiro mandato que o levaria a completar 18 anos no poder, quatro a mais do que somava seu antecessor e padrinho político, Hugo Chávez, ao morrer em 2013.
Com a crise econômica e humanitária que se instalou nos últimos anos, porém, ele foi perdendo apoio popular. Diferentes pesquisas de opinião publicadas por meios independentes do país indicam que sua rejeição hoje chega a cerca de 80% da população, por isso ele tenta encurralar os adversários.
Diante do bloqueio a Corina Yoris, seu principal rival nas eleições de julho deve ser Manuel Rosales, considerado o nome mais “palatável” ao regime dentro da coalizão opositora. Ele foi registrado poucos minutos antes do fim do prazo para as candidaturas, à meia-noite desta segunda.
Rosales é figura conhecida na política venezuelana. Atualmente é governador de Zulia, um estado de grande produção de petróleo na fronteira com a Colômbia. Ele enfrentou Hugo Chávez (1954-2013) nas eleições presidenciais de 2006, quando o líder socialista estava no auge da sua popularidade.
O Itamaraty destacou que 11 candidatos de oposição, incluindo Rosales, se registraram. “O Brasil está pronto para, em conjunto com outros membros da comunidade internacional, cooperar para que o pleito anunciado para 28 de julho constitua um passo firme para que a vida política se normalize e a democracia se fortaleça na Venezuela, país vizinho e amigo do Brasil”, afirma a nota.
Os outros dez nomes, porém, são considerados “alacranes”, termo local para colaboradores do regime. Eles ainda precisam ser aprovados pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral), controlado por Maduro, por isso a lista definitiva de candidatos só deve estar disponível depois de abril.
Ricardo Della Coletta/Júlia Barbon, Folhapress