24 novembro 2024
Economista do Ministério da Economia. Mestre em Economia e Doutor em Administração Pública pela UFBA. Autor de diversos trabalhos acadêmicos e científicos, dentre eles o livro Política, Economia e Questões Raciais publicado - A Conjuntura e os Pontos Fora da Curva, 2014 a 2016 (2017) e Dialogando com Celso Furtado - Ensaios Sobre a Questão da Mão de Obra, O Subdesenvolvimento e as Desigualdades Raciais na Formação Econômica do Brasil (2019). Foi Secretário Estadual de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) e Diretor-presidente da Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia (Prodeb), Subsecretário Municipal da Secretaria da Reparação de Salvador (Semur), Pesquisador Visitante do Departamento de Planejamento Urbano da Luskin Escola de Negócios Públicos da Universidade da Califó ;rnia em Los Angeles (UCLA), Professor Visitante do Mestrado em Políticas Públicas, Gestão do Conhecimento e Desenvolvimento Regional da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Professor, Coordenador do Curso de Ciências Econômicas e de Pesquisa e Pós-Graduação do Instituto de Educação Superior Unyahna de Salvador.
O ano que passou marca um significativo ponto de inflexão de tudo que vimos observando na sociedade brasileira na última década. Na verdade, o recado que foi e vem sendo dadas pelas urnas, ruas, pelo mercado e pela sociedade como um todo, é a necessidade do redesenho de princípios e estratégias para um novo ciclo na política, na gestão das políticas públicas, na economia e na própria sociedade.
Muitos mitos importantes do inconsciente coletivo de alguns seguimentos da sociedade caíram por terra e, até o momento, algumas dessas mudanças sequer foram devidamente digeridas por esses grupos sociais importantes, cujo aparente reconhecimento de suas demandas e de seus problemas, continuaram e continuam à margem dos espaços reais de poder, da apropriação da riqueza e longe de uma qualidade de vida satisfatória.
A acirrada disputa eleitoral para presidência da república trouxe à baila algo que há muito não se via no país, pelo menos nos últimos quarenta anos: uma militância conservadora e de centro-direita indo para as ruas, apresentando suas posições para a retomada do poder. Ainda refletindo os eventos de 2013, observamos que nesse início do segundo governo Dilma, não está sendo mais suficiente a utilização da mídia e das ferramentas institucionalizadas de manutenção da hegemonia do “circuito superior” da sociedade, para defender e operar os interesses da histórica elite dominante do país. A chamada “elite branca brasileira” está, sim, indo para as ruas; mas engana-se quem pensa ou quer fazer de conta que pensa que esta elite está sozinha e isolada em suas posições para fazer valer suas demandas. Nada disso! As fotos que vem sendo divulgadas das “manifestações elitistas”, não são muito diferentes das fotos dos dirigentes das estruturas governamentais empossadas pós-eleições de 2014.
Em nível de branquitude, elas são muitos semelhantes, ou seja: mesmo depois de doze anos de governo popular e democrático, a cara daqueles que estão dirigindo o aparelho de estado, em todos os níveis de governo, continuam sendo muito parecidas com as caras pintadas de verde e amarelo do bairro da Barra, em Salvador ou da avenida paulista, em São Paulo.
Essa contradição não pode ser jogada para debaixo do tapete, em nome de um projeto político que cada vez pende mais para a direita! Sendo assim, a nossa preocupação fundamental reside no fato de entendemos que o ajuste de um projeto político para a melhor consecução de metas e objetivos programáticos, não deve, necessariamente, se confundir com mudança dos princípios norteadores e estratégicos que só se consolidam no longo prazo. É esse debate que está subjacente ao chamado ajuste fiscal, isto é, as políticas macroeconômicas não são neutras!
Valores como o da democracia plena, da igualdade de oportunidades e garantia de direitos, do desenvolvimento com distribuição de renda, não se estruturam sobre quaisquer modelos macroeconômicos. Ao contrário, a história tem nos demonstrado que modelos de desenvolvimento específicos exigem gestões muito bem definidas dos fundamentos macroeconômicos, mas também de fundamentos políticos, para se alcançar o sucesso almejado. Para além da Economia, stricto senso, existe uma Economia Política a ela subjacente, e é esse aspecto do jogo mais profundo das estruturas reais de poder. Infelizmente, esse aspecto é pouco discutido com a amplitude que a sociedade merece e necessita, mesmo nos círculos mais engajados dos partidos políticos, dos movimentos sociais e da sociedade civil organizada.
É preciso dizer que são as camadas da população do “circuito inferior” que mais sofrem com a recessão no curto prazo, objeto, a priori, dos ajustes ortodoxos e, quando esses ajustes possibilitam algum retorno do crescimento no médio e longo prazo, também é esse “circuito inferior” que mais demora a auferir os ganhos reais da estabilidade monetária e do crescimento econômico.
Isso é o que explica o fato da escolha de um chicago boy e banqueiro para o Ministério da Fazenda para liderar a gestão da macroeconomia brasileira, ter sido aclamada, principalmente, pelos “circuitos superiores” da sociedade. A gestão econômica, stricto sensu, é apenas a ponta do iceberg. A parte submersa da grande pedra de gelo é Economia Política e o inconsciente coletivo representativos de poderosos segmentos sociais que, não tendo sucesso, na retomada do poder por via política eleitoral, estão aproveitando da real necessidade de ajustes e transformações no projeto político em curso, para convencer até alguns dos mais legítimos representantes progressistas do atual establishment, há doze anos no poder, de duas coisas fundamentais. A primeira é que esse próprio establishment não tem a competência necessária para fazer a gestão da macroeconomia, numa situação de crise e, a segunda, é que entrando no quarto período consecutivo de gestão do aparelho do estado brasileiro, os partidos de base popular e democrática que vem dando sustentação ideológica aos governos Lula/Dilma não conseguiram aprender nada de como gerir o aparelho de estado. É isso que Gramsci chamava de uma a verdadeira hegemonia!