30 outubro 2024
Advogado. Formado pela Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia - UFBA. Pós-Graduado em Direito Eleitoral e Pós-Graduando em Direito Constitucional. Vice-presidente da Juventude do União Brasil - Bahia.
No último domingo, dia 10 de julho de 2022, foi colocada em circulação uma notícia, essa que, dado o seu conteúdo, acabou sendo responsável por gerar certo tumulto nas discussões políticas voltadas às eleições 2022 no Estado da Bahia, que se aproximam e, por tal razão, acabam ensejando maiores debates entre os interessados.
Pois bem. O jornal A Tarde, um dos principais volantes comunicativos do território baiano, publicou uma reportagem por meio da qual informara à opinião pública que as contas da Prefeitura Municipal do Salvador/BA, relacionada ao exercício financeiro de 2017, se encontram sob análise da Comissão de Finanças, Orçamento e Fiscalização da Câmara de Vereadores.
Trata-se, portanto, do acervo contábil adstrito ao Poder Executivo Municipal da capital baiana, de responsabilidade do então prefeito Antônio Carlos Magalhães Neto, ora pré-candidato ao Governo do Estado pelo União Brasil, que foram aprovadas, desde os idos de 2018, pelo Tribunal de Contas dos Municípios do Estado da Bahia (TCM/BA), responsável pela lavratura do parecer prévio documentado nos autos do processo nº 03498e18.
O cerne da reportagem, que motivou inúmeros debates, muitos deles bem acalorados entre os atores políticos, diz respeito ao fato da comissão orçamentária da Casa Legislativa local, com o suporte assistencial do órgão interno de controle, ter requisitado à Procuradoria-Geral um parecer jurídico, relacionado às contas de gestão, com o escopo de embasar o relatório e o voto a serem proferidos pelos parlamentares vinculados à precitada comissão, que depois irão à deliberação pelo plenário da Câmara Municipal.
De acordo com o que fora noticiado, os argumentos declinados pelos procuradores no bojo do opinativo teriam apontado a ocorrência de supostos quatro pontos considerados graves e que autorizariam a desaprovação das contas provenientes do exercício financeiro de 2017.
Impende assentar, de plano, que o parecer lavrado pela Douta Procuradoria não detém qualquer caráter vinculativo, sendo apenas a mera exposição de ponto de vista quanto ao assunto consultado, de modo que os vereadores terão toda a autonomia para analisar e votar as contas do executivo.
Levando-se, em linha de conta, o cenário aqui narrado, fundamental, agora, a partir dos argumentos lançados adiante, rechaçar a manchete alastrada quanto à ideia de que ACM Neto poderia estar prestes a ficar inelegível e, por conseguinte, impossibilitado de disputar as eleições programadas para outubro deste ano.
De pórtico, importante sobrelevar que a Corte de Contas, ao deliberar o acervo contábil da Prefeitura do Salvador/BA, concatenado ao exercício financeiro de 2017, opinou pela aprovação com ressalvas. Somente por meio de dois terços dos votos dos edis em viés contrário ao quanto decidido pelo TCM/BA faria com que o posicionamento exarado pelo órgão técnico deixasse de prevalecer.
Em outro prisma argumentativo, é substancial afirmar ser praticamente impossível a projeção grafada pela reportagem, em relação à possibilidade de ACM Neto ficar inelegível, se confirmar, haja vista que, para tanto, a votação das contas pela Câmara Municipal precisaria ocorrer antes do período destinado pela legislação eleitoral às convenções partidárias, compreendido entre os idos de 20 de julho e 05 de agosto.
Após o referido período, o pré-candidato do União Brasil, por meio de sua legenda, deverá requerer o seu registro de candidatura à Chefia do Poder Executivo Estadual, oportunidade em que deverá, assim como qualquer outro possível candidato a mandato eletivo, fazer prova quanto ao preenchimento de todas as condições de elegibilidade previstas no ordenamento.
Acaso ocorra, em remotíssima hipótese, a rejeição, pela Casa Legislativa, do acervo contábil de responsabilidade de ACM Neto, nome já anunciado como futuro candidato ao cargo de governador, não haveria a caracterização, de forma automática, em inelegibilidade por rejeição de contas, prevista no artigo 1º, I, g, da Lei Complementar nº 64/90.
Assente o supramencionado dispositivo legal que estão inelegíveis aqueles que tiverem suas contas relativas ao exercício de cargos ou funções públicas rejeitadas por irregularidade insanável que configure ato doloso de improbidade administrativa, e por decisão irrecorrível do órgão competente, salvo se esta houver sido suspensa ou anulada pelo Poder Judiciário.
A norma jurídica extraída da disposição legislativa em análise aduz, de forma inequívoca, que não são todos os casos em que há a rejeição de contas que atraem a pena de inelegibilidade, devendo a Justiça Eleitoral analisar cada caso concreto levado à jurisdição.
Há hipótese, ainda, de mesmo existindo eventual preenchimento de todos os requisitos caracterizadores do ato doloso e da irregularidade insanável, pode o Poder Judiciário suspender ou até mesmo anular eventual deliberação que tenha pontificado a rejeição das contas do gestor e possível concorrente às eleições.
Fazendo-se, nesta oportunidade, a inserção de um parêntese neste texto, dotado de relevância ao desate da temática, compreendemos inexistir a tal da inelegibilidade “chapada” ou “incontroversa”, devendo haver, de forma minuciosa, a análise de cada peculiaridade inserta nos episódios levados aos Juízos e Tribunais Eleitorais.
Para fins de exemplificação, trazemos à ribalta o caso envolvendo o ex-presidente Lula, atualmente elegível e pré-candidato, perante o pleito deste ano, ao Palácio do Planalto, quando o Partido dos Trabalhadores requereu, na última eleição nacional, o registro do político ao cargo de Presidente da República, após o mesmo estar sob condenação criminal por órgão colegiado, atraindo-lhe, em face dele, à época, os rigores da Lei da Ficha Limpa.
Enquanto muitos atestavam que o ex-mandatário estaria, de forma incontroversa, impossibilitado de concorrer às eleições, foi possível verificar que o Tribunal Superior Eleitoral, por maioria, ou seja, sem unanimidade, entendeu que, realmente, Lula não poderia se candidatar ao assento presidencial, tendo havido divergência no âmbito da deliberação.
Voltando-se ao tema em tratativas neste artigo, a partir do cotejo do conteúdo normativo consignado após a interpretação promovida face ao comando da lei e sua aplicação ao caso debruçado na reportagem em análise, entendemos que, ao nosso sentir, não há dolo por parte de ACM Neto enquanto gestor das contas atinentes ao exercício financeiro de 2017, situação que não o afasta da disputa eleitoral vindoura e nem cria óbices jurídicos ao seu pretendido registro de candidatura, estando ele absolutamente elegível e em hígida sintonia com as exigências cominadas em lei para poder concorrer às eleições.