23 novembro 2024
Lucas Faillace Castelo Branco é advogado, mestre em Direito (LLM) pela King’s College London (KCL), Universidade de Londres, e mestre em Contabilidade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). É ainda especialista em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET) e em Direito empresarial (LLM) pela FGV-Rio. É diretor financeiro do Instituto dos Advogados da Bahia (IAB) e sócio de Castelo e Dourado Advogados.
Certa feita um amigo me contou que respondia a um americano curioso sobre a democracia brasileira: “no Brasil não há democracia, há uma bagunça!” É bem isso. Aqui não há capitalismo, não há comunismo, não há liberalismo.
A própria Constituição é uma mixórdia indecifrável de conceitos conflitantes de vários matizes ideológicos, cuja interpretação pode resultar em quase tudo. Se um jurista fosse convidado para dizer qual a natureza do Brasil, diria: é “sui generis”, pois o País não se encaixa propriamente em nada reconhecível.
A iniciativa é livre, mas a burocracia faz-nos questionar o preceito. Por outro lado, diminua-se a burocracia e a fraude cresce exponencialmente. Não há solução no Brasil que, implementada, não crie um problema igual ou maior.
Querem, por exemplo, que o mandato dos juízes do Supremo Tribunal Federal não seja vitalício, com o objetivo de, dizem, sanar certas distorções. Mas, ué, a vitaliciedade do cargo não era a garantia para que não houvesse envolvimento político dos ministros? Elimine-se a vitaliciedade e se verá a persistência ou mesmo o recrudescimento do que se busca evitar.
Às vezes até parece que os ministros do Supremo chegaram lá de paraquedas (alguns dirão que foi assim mesmo). Porém o povo se esquece que os ministros são nomeados após procedimento estritamente democrático (todo mundo não quer mais democracia?). Quem os indica é o Presidente da República, eleito pelo povo; quem os confirma são os parlamentares, também eleitos pelo povo, após rígida sabatina que escarafuncha a vida pregressa do candidato (não é assim?). Como procedimento tão implacável poderia dar errado?
Pensa-se que com mais leis e reformas os problemas crônicos do País serão resolvidos. É de uma ingenuidade imperdoável. Como disse Benjamin Disraeli, primeiro-ministro da Inglaterra, “quando os homens são puros, as leis são desnecessárias; quando são corruptos, as leis são inúteis”. Aliás, imperdoáveis também são os que imaginavam que o ser humano iria melhorar por causa da pandemia. Ah, vá, não conhecem nada da natureza humana!
O problema do Brasil não está particularmente no judiciário, ou nos empresários, nos empregados, na classe política, na polícia ou em nenhuma outra instituição ou corporação. Vive-se pondo o dedo em riste para cada uma delas, como se houvesse um problema pontual de cultura interna, quando o busílis é o enraizamento de um modo de ser de quase toda a gente.
O problema está mesmo na quantidade de malandros, picaretas e indivíduos despreparados que rondam em todas as partes. Pessoas sem caráter, sem compromisso com os demais, centrados unicamente em seus próprios interesses escusos. O número é de impressionar! Nada, absolutamente nada, resiste a eles. As instituições apenas incorporam em seu quadro a amostra do que há por aí. E elas, as instituições, por conta dessas pessoas de carne e osso, estão mesmo funcionando, tão mal como sempre.
E as agruras vão longe. Além do racismo que se quer por para debaixo do tapete, há também o “pobrismo”. Respeito, no Brasil, merece quem tem dinheiro. O sujeito que é rico ganha selo de qualidade, sequer importando as vias que empregou para “subir na vida”, não raramente suspeitíssimas. É o status tornando-se a medida do tipo de tratamento que a pessoa merece, fenômeno tipicamente brasileiro.
E os desprovidos de influência, pessoas sem poder algum que penam para conseguir o beneplácito do dono da caneta? Imagine-se o combo: negro, pobre e desprovido de influência, como normalmente sucede. E a situação se agrava para aqueles sem instrução (a vasta maioria), que são facilmente enganados e manipulados por quem navega no sistema burocrático. Não que haja santos nessa história toda.
Mas tudo vai melhorar, tenhamos esperanças, pois é final de ano.