Foto: Romualdo Câmara
09 de março de 2015 | 18:49

A BAIANIDADE VIROU UMA BAIANADA (I), por Pacheco Maia

bahia

A baianidade virou uma baianada. É uma afirmativa. Para mim, quase um truísmo. Quem não concordar que reaja. Mostre-me por A mais B que sou um equivocado, ignorante, burro, estúpido. Tomara que me convença. Eu quero ser dissuadido. Baianidade e baianada deveriam ser antônimos. Paradoxalmente viraram sinônimos. É um ponto de vista.

Fala-se que os artífices da baianidade seriam Dorival Caymmi e Jorge Amado. Ou melhor, das artes deles, música e literatura, se propagou o imaginário da Boa Terra, um idílico lugar. Nela teria se forjado um tipo de civilização, a tal baianidade, onde, apesar das gritantes desigualdades sociais, um povo sestroso e festivo, guiado pelos orixás, mas sob a vigilância da santa Igreja Católica, vivia em paz e harmonia.

Inspiradas na terra natal, a música de Caymmi e a literatura de Jorge tinham um quê de originalidade e charme que seduziu muita gente. O talento deles interessou não só os brasileiros, mas gente de fora. Encantado com as coisas da Bahia, que tomou conhecimento nos livros de Jorge Amado, o argentino Carybé aqui se radicou para traduzi-las em traços geniais.

Além de registros fotográficos, o francês Pierre Verger mergulhou de cabeça na cultura afrobaiana. Por meio de sua lente e pesquisas, o mundo tomou conhecimento da riqueza antropológica da Bahia. Caymmi, Jorge Amado, Carybé e Verger formariam o quarteto que plasmou a baianidade. O encontro dessa turma deu samba, mas poderia ter dado muito mais.

O ouro negro da modernidade, o petróleo, jorrou na Bahia, onde as mais avançadas experiências educacionais eram experimentadas por Anísio Teixeira e uma universidade de vanguarda se instalara. Era o momento de desenvolver a economia do estado, que permanecera estagnada durante a primeira metade do Século XX e conter o fluxo de baianos que iam tentar a sorte no Sul Maravilha.

Enquanto se projetava a tal baianidade, os baianos, vítimas das desigualdades sociais, desembarcavam de paus de arara, fugindo da fome e da falta de oportunidades, em São Paulo. Ignorantes, analfabetos e sem instrução, junto com outros nordestinos, os baianos eram humilhados, quando cometiam erros ou bobagens.

Por sair da Bahia o maior contingente de migrantes, chamava-se de baianos a todos e daí os endinheirados paulistas darem o nome de baianada a qualquer coisa mal feita. Ao contrário do sentido pejorativo e depreciativo de baianada, a baianidade era um elogio aos valores culturais e humanísticos de um lugar e seu povo.

Infelizmente, nos últimos tempos, o que se vê é a baianidade se transformando numa grande baianada. Basta abrir as páginas dos jornais para constatar que a outrora universidade de vanguarda, a Ufba, hoje prefere esticar o carnaval no reinício de suas aulas, com show de Luiz Caldas, a discutir com os estudantes a crise de valores por que passa o nosso país.

Surpreendentemente quem tomou esta iniciativa foi uma faculdade privada, a Dom Pedro, que promove, nesta segunda-feira (09), “aula magna”, com a ministra Eliana Calmon, sobre “os efeitos da corrupção na sociedade brasileira”. Essa admirável magistrada não tem rabo de palha, mas toda a autoridade para tratar o assunto.

Repugnante foi a escatológica soberba manifestada por nosso vice-governador João Leão ao ser indagado pela imprensa sobre a sua inclusão na lista do procurador geral da República, Rodrigo Janot, entre os nomes daqueles envolvidos com o petrolão: “…estou cagando e andando na cabeça desses cornos”. Mas, pelo menos, Leão assumiu o que disse e não tentou desmentir o jornalista, como é do costume de alguns políticos, quando o divulgado não lhes agrada.

Motivo de repúdio foi a atitude de um colega de governo do vice Leão. Ligou para a direção de um tradicional órgão de imprensa para reclamar que estava sendo coagido por um repórter, quando o profissional estava apenas cumprindo seu dever jornalístico de ouvir todas as partes envolvidas em uma notícia. Deve se achar barril dobrado. Então, canta Kannário: “É tudo nosso/Nada deles/É tudo nosso/Nada deles”. E assim a baianidade segue seu destino de virar baianada…

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