Foto: Ernesto Rodrigues / Estadão
João Doria, governador de São Paulo 22 de abril de 2019 | 06:51

Deputados paulistas criam CPI para intervir nas universidades

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A Assembleia Legislativa de São Paulo será palco de uma ofensiva da base do governo João Doria (PSDB) com abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito contra o que os deputados definem como “aparelhamento de esquerda” das universidades públicas paulistas e “gastos excessivos” com funcionários e professores. Entre as mudanças que eles querem discutir estão a escolha do reitor e a forma como o Estado repassa recursos às instituições, ambas garantidas hoje pela chamada autonomia universitária. O diretor da Faculdade de Direito da USP, Floriano de Azevedo Marques, disse que intervir nas universidades é inconstitucional. “A autonomia universitária, que diz que a instituição conduz seus assuntos acadêmicos e indica seus dirigentes, é absolutamente impenetrável porque vem da Constituição.” Tanto ela quanto a liberdade de cátedra foram reafirmadas em 2018 pelo Supremo Tribunal Federal, que tem entre os membros dois ex-colegas de faculdade de Marques – Alexandre de Moraes e Ricardo Lewandowski –, no julgamento sobre a censura a manifestações acadêmicas na eleição. Apresentada pelo deputado Wellington Moura (PRB), vice líder do governo, a CPI das Universidades Públicas será instaurada nesta semana. O objeto divulgado no Diário Oficial é vago: “investigar irregularidades na gestão das universidades públicas”. Entre as justificativas apresentadas oficialmente está o fato de as universidades de São Paulo (USP), Estadual Paulista (Unesp) e Estadual de Campinas (Unicamp) receberem 9,57% da arrecadação do ICMS do Estado. O valor atual está em torno de R$ 9 bilhões. “Vamos analisar como as questões ideológicas estão implicando no orçamento. Eu percebo um predomínio da esquerda nas universidades. Infelizmente, muitos professores levam mais o tema ideológico do que o temático para a sala de aula”, disse Moura. Líder do PSDB na Assembleia e aliada de Doria, a deputada Carla Morando afirmou que é “público, notório e amplamente divulgado pela imprensa” que as universidades públicas são “dominadas pela esquerda” em seus cargos de gestão e no ambiente educacional. Para ela, as universidades são uma “caixa-preta”. A CPI também trouxe de volta a ideia de se cobrar mensalidades em universidades públicas. Há exatos 30 anos, em 1989, decreto do então governador Orestes Quércia vinculou recursos do ICMS para USP, Unesp e Unicamp e a total autonomia para geri-los. Além disso, a Constituição de 1988 garante a autonomia às universidades no País, o que significa ser responsável por escolher dirigentes e colegiados, currículos, programas, etc. Desde a autonomia, a USP aumentou em mais de 1.100% o indicador de produção científica que se refere a publicações de trabalhos em revistas conceituadas mundialmente. O número de alunos de graduação cresceu 50% e o de teses defendidas, 400%. Nos últimos anos, as três universidades enfrentaram problemas financeiros e, em razão da autonomia, não puderam pedir mais dinheiro ao Estado. E chegaram a ter mais de 100% dos orçamentos comprometidos com folha de pagamento. “Não temos o que temer com a CPI, mas preocupa esse tipo de discussão sobre a importância da universidade”, disse o reitor da USP, Vahan Agopyan. “As universidades de pesquisa não são só para formar excelentes profissionais e fazer pesquisas. É onde se discutem e se desenvolvem políticas públicas e se trabalha para modificar e melhorar a sociedade.” Para o reitor da Unicamp, Marcelo Knobel, dizer que a esquerda domina a universidade é “falta de conhecimento”. “Temos pessoas de esquerda e de direita convivendo com relativa tranquilidade, somos um espaço para debate de ideias e respeito pelas ideias do outro.” A ideia de que as instituições públicas são aparelhadas pela esquerda também reverbera em âmbito federal. O ministro da Educação, Abraham Weintraub, diz que é preciso “vencer o marxismo cultural das universidades”. Os parlamentares querem ainda mudar o modelo de governança. Hoje, o reitor é escolhido a partir de lista tríplice enviada ao governador, que opta por um dos nomes. Quem escolhe os ocupantes da lista é a comunidade universitária, com mais peso para o voto dos professores. Para deputados da base governista, até o Conselho Universitário, órgão máximo das instituições, seria dominado pela esquerda. “Depois da CPI, muitas ideias vão surgir. Um projeto de decreto legislativo pode alterar a forma de escolher os nomes da lista tríplice. Pode ser um nome indicado pelo governo, outro pelos deputados e um terceiro pela universidades”, disse Moura.

Estadão
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