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Concorrente do YouTube, o Rumble vídeos se diferencia por conta do baixo esforço na moderação de conteúdo 23 de fevereiro de 2023 | 15:26

Rumble vira refúgio de influenciadores de direita banidos de outras redes

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Influenciadores que tiveram seus perfis suspensos e desmonetizados nas redes sociais tradicionais encontram asilo no Rumble, plataforma de vídeos que se popularizou nos últimos anos como uma espécie de YouTube de direita.

O site se propõe a ser um ambiente livre de censura, aberto a “crenças impopulares” e “imune à cultura do cancelamento”. Não há moderação de conteúdos políticos ou científicos — mesmo em temas sensíveis como a pandemia de coronavírus e eleições —, o que o torna mais permissivo à desinformação.

Embora se defina como uma rede neutra e pluralista, a plataforma ganhou relevância a partir de 2020 ao receber investimentos e atenção de estrelas da direita radical americana, como o ex-presidente Donald Trump e o estrategista político Steve Bannon.

No Brasil, ganhou adesão de blogueiros de direita em meio às recentes decisões da Justiça brasileira de suspender contas ligadas ao bolsonarismo e após o endurecimento nas regras de moderação das redes tradicionais.

Desde então, o Rumble tem sido território livre para proliferação de conteúdos de teor antidemocrático.

São facilmente encontrados vídeos que pedem “intervenção militar”, “intervenção constitucional”, “morte a Xandão”, em alusão ao ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), e que exaltam as invasões às sedes dos três Poderes de 8 de janeiro.

Também é possível localizar canais defendem a volta da monarquia ao Brasil e espalham fake news sobre fraudes na última eleição presidencial — a plataforma não firmou parceria com o TSE para combate à desinformação em 2022.

Há ainda conteúdos sobre a teoria conspiratória de extrema direita QAnon e sobre os Red Pills, grupos misóginos que se declaram contrários a uma suposta “opressão feminina”.

Segundo relatório do NewsGuard, órgão de vigilância da mídia que analisa a credibilidade dos meios de comunicação, o Rumble distribuiu duas vezes mais vídeos de fontes não confiáveis do que o YouTube nas eleições de meio mandato nos EUA.

Recentemente, a plataforma descumpriu, no Brasil, uma determinação do ministro Moraes de bloquear um dos canais do influenciador Monark, por estimular a prática de atos antidemocráticos. O perfil segue no ar mais de um mês após a decisão. Em outras redes, a determinação foi cumprida.

A reportagem tentou contato com a empresa em seus endereços eletrônicos, mas não obteve resposta. Não foi possível localizar representação oficial da companhia no Brasil nem assessoria de imprensa. Há apenas um registro da marca no país no banco de dados da OMPI (Organização Mundial de Propriedade Intelectual).

Apesar da ampla liberdade nos conteúdos, o Rumble afirma em seus termos que comunicadores só podem se expressar “dentro dos limites da lei” e que conteúdos podem ser removidos se exigidos pela Justiça. “É a liberdade de manter e expressar crenças impopulares. Não é a liberdade de infringir a lei”, diz a própria empresa em seu site.

A plataforma também afirma moderar e restringir conteúdos protegidos por direitos autorais, propaganda ilegal, pornografia, nudez e discriminação.

Monark chegou ao Rumble em março de 2022, como uma das principais atrações do lançamento da rede no Brasil, após ser demitido do Flow por defender o direito de nazistas se organizarem. Ele também foi desmonetizado e proibido de criar perfis no Youtube.

Para os 260 mil seguidores que o acompanham em seu canal principal, o Monark Talks, o comunicador costuma reclamar de decisões do Judiciário, dizer que é vítima de censura e afirmar que o Brasil vive sob uma “ditadura”.

Adotam discurso semelhante na plataforma outros comunicadores bolsonaristas banidos nas redes, como Paulo Figueiredo, Guilherme Fiuza e Rodrigo Constantino. O blogueiro Allan dos Santos, foragido da Justiça brasileira, mantém um canal com 12 mil seguidores, onde posta vídeos quase diariamente.

Mas não só bolsonaristas adotaram o Rumble. O jornalista americano radicado no Brasil e colunista da Folha Glenn Greenwald aderiu à rede em 2020 por meio um contrato de exclusividade. Hoje com 315 mil seguidores, ele transmite um programa em que costuma acusar Moraes e o STF de suprimir a liberdade de expressão.

Postagens suas no Twitter em que critica “escalada de poder” do STF foram compartilhadas, inclusive, pelo fundador da plataforma, o canadense Chris Pavlovski.

Pavlovski define o seu trabalho como o de proteger a “internet livre e aberta”. Ele chama de luta “do grande contra o pequeno” a missão da empresa diante da “censura das big techs e da agenda corporativa”.

O discurso de “Davi e Golias” empolgou parte do establishment conservador americano e, em 2021, a empresa recebeu em torno de U$ 500 milhões de dólares da Nayra Capital, segundo o Wall Street Jornal. O fundo é gerido pelo senador republicano J.D. Vance, apadrinhado por Trump, e pelo bilionário conservador Peter Thiel, confudador do PayPal.

A rede chegou a a 73 milhões de usuários ativos em setembro de 2022, número tímido se comparado ao YouTube e, em geral, ainda se caracteriza por ser de nicho.

Um quarto (22%) dos seus comunicadores mais populares foram banidos ou desmonetizados em outras redes sociais e são produtores individuais, sem vínculos com organizações, segundo pesquisa do Pew Research Center feita nos Estados Unidos.

Três quartos (76%) dos usuários que consomem notícias regularmente na plataforma se identificam com o Partido Republicano e a maioria deles é homem (54%), branco (67%) e tem de 30 a 64 anos (63%). A maioria tem a impressão de que as informações na rede são de qualidade e que os ajudam a entender eventos da atualidade.

Ainda segundo a pesquisa, os temas mais abordados pelos comunicadores proeminentes na rede são conhecidos da pauta conservadora: armas, abortos e a comunidade LGBTQIA+.

Andrei Ribeiro, Folhapress
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