Foto: José Cruz/Arquivo/Agência Brasil
Urna eletrônica 16 de abril de 2024 | 12:37

Gil do Vigor quer usar redes para expor políticas populistas em ano de eleições municipais

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Célebre por sua participação no Big Brother Brasil 21, o economista Gilberto Nogueira, mais conhecido como Gil do Vigor, quer usar seus conhecimentos técnicos e sua influência nas redes para expor políticas populistas em ano de eleições municipais.

Em entrevista à Folha, ele diz pretender conscientizar seus seguidores “vigorosos e vigorentos” sobre o que torna uma política pública eficiente e como detectar motivações eleitoreiras só para ganhar votos.

No momento em que o Congresso Nacional controla uma fatia cada vez maior do Orçamento, o uso de emendas parlamentares para irrigar redutos dos parlamentares pode até ajudar no cumprimento de promessas locais. Gil quer mostrar que isso não basta.

“Eu posso prometer e até construir 50 escolas. Mas em que a escola vai, de fato, ajudar? Qual é a estratégia para que aquela escola vigore, para que de fato tenha um papel na educação? Não é só construir escola. É de que forma a minha contribuição para a sociedade é efetiva ou não”, afirma.

O economista evita citar quais políticas estão sob sua mira, com a justificativa de que está reunindo dados para apresentar as evidências do populismo. Mas afirma que o uso político da máquina pública é uma das raízes para a desigualdade de renda no Brasil.

No domingo (7), Gil deu uma palestra na Universidade de Harvard sobre economia da desigualdade. Cursando PhD em economia na Universidade da Califórnia em Davis (EUA), ele tem a pretensão de mostrar, com dados, os efeitos do racismo no sistema penitenciário.

Raiz da desigualdade

A educação é um dos pilares do combate à desigualdade no Brasil. Mas um outro ponto que está na raiz da desigualdade são as políticas individualistas, que focam muito mais em interesses políticos do que econômicos e sociais.

Uma gestão pública dura quatro anos. Mas, interessantemente, eleição após eleição, os líderes políticos deixam para fazer suas obras próximo às eleições. A gente começa a se questionar: do nada, começam a fazer investimentos porque descobriram naquele ano que aquelas políticas são eficientes, ou porque eles estão fazendo políticas populistas para comprar votos?

[São] Políticas que não foram planejadas, que não são eficientes do ponto de vista econômico, que vão piorar [a situação] ainda mais, gerar mais fome, porque os recursos são escassos. Só que, infelizmente, às vezes o egoísmo dentro da política acaba sendo maior e falando mais alto. Quem paga a conta somos nós como sociedade.

Políticas eleitoreiras

O gasto público tem que ser balanceado, não apenas no ano eleitoral. [Precisa ser] focado na utilização mais eficiente daqueles recursos. Outro ponto é que as políticas precisam ser embasadas em pesquisas. Não é só ‘ah, no ano eleitoral vou construir 50 escolas’. Onde? De que forma? Como vamos contratar professores? Não é só ‘eu vou fazer, eu vou fazer’, mas como fazer.

Teve um momento aqui nos Estados Unidos, inclusive aqui na Califórnia, que eles perceberam que o número de alunos na sala é um fator de desempenho acadêmico [no ensino básico]. Quanto maior a sala, menor é o desempenho acadêmico dos alunos, porque o professor não tem tempo de conversar com o aluno, e esse contato afeta o desempenho do estudante.

O que aconteceu? As escolas tinham o direito de escolher ou não fazer reforma para aumentar o número de salas e também ter uma verba direcionada aos professores. Os alunos de escola pública começaram a ter desempenho melhor do que os alunos de escola privada.

Muitas vezes, as [políticas] mais eficientes acabam que não são perceptíveis ao olho da massa. Por exemplo, essa política da Califórnia, a grande massa não estava entendendo, mas estava acontecendo uma revolução na educação do ensino público. Muitas dessas políticas não vão trazer retorno em votos, mas vão trazer retorno real para a sociedade.

Discurso x prática

Existe um problema muito grande de accountability [ato de prestar contas] no Brasil. Basicamente, é a capacidade dos eleitores de punirem ou beneficiarem líderes que fizeram a gestão [menos ou] mais eficiente. Se eu não sou punido por prometer e não fazer, isso não vai mudar.

Nós, como eleitores, precisamos começar a estudar as pessoas que elegemos e até que não elegemos, porque se foi eleito, tem que fazer e eu tenho direito de cobrar. Quando a história mudar, aí eles vão pensar ‘epa, se eu não fizer, eu estou lascado’.

Uso de emendas para cumprir promessas locais

A gente tem que analisar o todo. Eu posso prometer e até construir 50 escolas. Mas em que a escola vai, de fato, ajudar? Qual é a estratégia para que aquela escola vigore, para que de fato tenha um papel na educação? Não é só construir escola. É de que forma a minha contribuição para a sociedade é efetiva ou não.

Voz nas eleições municipais

Sempre que puder, vou trazer mais conteúdos para alertar e explicar, por exemplo, qual é o papel do prefeito, do vereador, como entender melhor o papel de cada um para fazer esse julgamento mais preciso.

Já tenho também algumas políticas em mente, que eu vou trazer posteriormente em vídeos, para que as pessoas consigam realmente entender por que aquelas políticas são populistas, focadas em voto mesmo, e irresponsáveis no sentido da eficiência.

Eu prefiro não falar agora para ter esse cuidado com os números. Gosto de trazer detalhe por detalhe.

PhD, criminalidade e educação

Isso aí é uma pesquisa que eu estou também vigorando. Venho de uma realidade muito pobre, muito humilde, em que muitos jovens acabavam, por falta de renda, acesso e oportunidades, se envolvendo com o crime.

Tem um experimento que foi feito. Pegaram jovens da 5ª série das escolas, alguns foram selecionados e perguntaram [a eles] ‘quanto você vai ganhar de salário quando você se formar?’, e os alunos falavam. Outro grupo recebia uma palestra em que era dito o valor real do salário que eles teriam se concluíssem os estudos. E aí, por exemplo, achavam que ia ser R$ 2.000 e descobriam que na média era R$ 4.000.

Eles foram acompanhados e, no longo prazo, a taxa de alunos que terminaram o ensino médio foi muito maior entre os que tiveram a informação na entrevista do que entre aqueles que só foram perguntados. Ou seja, aquela expectativa muda a decisão dele de estudar.

Dado que nós temos esse conhecimento, como estabelecemos políticas que cheguem nesse jovem?

Racismo

Uma outra vertente que é um desejo meu, ainda não iniciei, é verificar de que forma o racismo afeta a taxa de pretos dentro do sistema penitenciário do Brasil.

Isso veio de uma experiência pessoal minha, por isso trouxe isso e quero começar a pesquisar. Na minha infância, eu ouvia muito que meu pai tinha dificuldades com drogas e que eu seria igual ao meu pai, que não adiantava eu estudar.

O racismo destrói, tem efeitos práticos, mas também psicológicos, porque você acorda todo dia e fala ‘caramba, vou ouvir que sou um criminoso’. Quantos dos pretos do nosso país, por conta do racismo, falaram ‘caramba, estou cansado de lutar, vou ser o que a sociedade já predeterminou para mim’?

Eu quero capturar esse efeito. Não vai ser fácil pegar efeito causal [comprovar com dados que o resultado é consequência direta do fator estudado], mas eu quero trazer alguns resultados.

O racismo é responsável por uma taxa significativa dos crimes. Isso é uma crença, eu pretendo voltar e poder falar ‘está vendo, agora eu tenho resultados que provam isso’. E nós temos a responsabilidade social de debater e tratar.

Direita x esquerda

Eu fico indignado, porque parece que só a esquerda tem que falar da educação. Não, gente! É tudo interligado.

Na economia, a gente não fala sobre as pessoas fora da curva, a gente fala da média. Na média, ninguém tem vontade de se tornar criminoso. As pessoas querem estudar, trabalhar, só que a desigualdade mexe nisso. Você olha e fala ‘não vou ter oportunidade, não vou ter emprego, vou ficar 20 anos estudando e não vou conseguir nada’.

Esse é o discurso utilizado também para recrutar para o crime organizado. Ninguém vai chegar para falar ‘fique estudando, você vai chegar lá, ser alguém na vida, mas vem para o crime que aqui você vai morrer’.

Precisa trazer [o debate] para a educação, e isso afeta a segurança pública. Tem que parar com isso de ‘ah, sou de direita, não quero saber da educação’, pelo amor de Deus. ‘Ah, sou de esquerda, não quero saber de segurança pública’, pelo amor do Senhor. O gestor tem que pensar em tudo.

Temas econômicos e engajamento nas redes

Não tenho a preocupação do engajamento. Minha preocupação é que as pessoas consumam o que é importante, que elas passem a entender e vigorem nos assuntos sobre economia, finanças, política, ou qualquer outro que vá mudar a vida dela.

De vez em quando vou fazer minhas cachorradas? Vou fazer, Brasiiiiil! Mas eu quero fazer isso [falar de economia]. Me entristece, mas eu sou muito grato também.

O algoritmo em si tenta me desvigorar, porque conteúdos engraçados com mil compartilhamentos, o próprio algoritmo divulga para milhões. Mas quando é um conteúdo sério, às vezes tem 50 mil compartilhamentos e o algoritmo não faz o papel dele. São as pessoas que trabalham para que aquele vídeo tenha alcance. Está tudo certo. Quem sou eu para brigar? Meu papel é criar o conteúdo.

Raio-X

Gilberto Nogueira, 32

Natural de Jaboatão dos Guararapes (PE), Gilberto Nogueira, 32, é formado em economia pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco) e ganhou fama após se tornar um dos protagonistas do BBB 21. Atualmente, faz PhD em economia na Universidade da Califórnia em Davis (EUA) e fala sobre educação financeira.

Idiana Tomazelli/Folhapress
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