Adriano Peixoto

Relações de Trabalho

Adriano de Lemos Alves Peixoto é PHD, administrador e psicólogo, mestre em Administração pela UFBA e Doutor em Psicologia pelo Instituto de Psicologia do Trabalho da Universidade de Sheffiel (Inglaterra). Atualmente é pesquisador de pós-doutorado associado ao Instituto de Psicologia da UFBA e escreve para o Política Livre às quintas-feiras.

Não são 20 Centavos (ou a revolta dos sem-bolsa)

Como vários analistas dizem que não conseguem compreender o movimento que tomou conta das ruas nos últimos dias, nesta minha coluna de quinta pretendo dar minha contribuição ao tema oferecendo meu ponto de vista para a situação atual.
Tudo começou como uma ação da esquerda radical na esteira da antecipação do processo eleitoral de 2014 que busca se manter viva patrocinando causas normalmente irrealistas, mas de forte apelo social. Entretanto, o que era para ser mais uma manifestação fadada às notas de rodapé dos jornais tomou corpo próprio e rapidamente varreu o país em uma onda de protestos como há muito tempo não se vê. Sem saber e sem querer, o movimento passe livre foi a gota que transbordou o copo da insatisfação da classe média, um ator político importante, mas que não se sente representado pelos partidos e movimentos sociais e cujos interesses têm sido sistematicamente alijados, quando não abertamente hostilizados, dentro do processo político atual.

A origem “média” das reinvindicações pode ser claramente percebida a partir dos temas e palavras de ordem que estão longe de espelhar anseios típicos das camadas ditas populares, para desilusão de muitos. Os manifestantes gritam contra a corrupção, contra a PEC 37 (que limita o poder de investigação do Ministério Público), contra a impunidade, contra o caos urbano e violência que tomam conta de nossas cidades, contra o mau uso do dinheiro público, contra a péssima qualidade da educação, contra a precariedade da saúde e pelo péssimo transporte público. Esta origem em setores médios intelectualizados pode ser observada também nas manifestações de solidariedade que pipocaram em dezenas de cidades pelo mundo a fora promovidas por estudantes de intercâmbio (protesto sem fronteiras, uma alusão clara ao programa de intercâmbio do governo federal).

A impressão que tenho é que a tentativa de construção de um projeto político popular se deu apoiado na chantagem política sobre a classe média, que vem sendo diariamente pintada como privilegiada e insensível ao sofrimento dos mais pobres. É claro que esse discurso só “pegou” em função das reais dificuldades vividas por parte expressiva de nossa população e por anos de profunda desigualdade social que precisam ser superadas. Assim, a retórica política hoje dominante fez da culpa categoria política ao mesmo tempo em que anunciou (com base em rios de dinheiro de propaganda) a construção de um Brasil novo.

Não restam dúvidas de que avançamos muito nos últimos anos, mas o problema é que o tal país prometido não foi entregue e a propaganda não encontrou suporte na realidade. Onde está a Saúde de primeiro mundo anunciada tempos atrás? Onde está a solução do problema da seca do Nordeste que se arrasta desde o império? Onde está o combate à corrupção e à ineficiência, onde está a reforma política? O pessoal do mensalão depois de condenados por uma corte majoritariamente indicada pelo partido de situação, ainda pode ser absolvido? Mas por que você está fazendo este tipo de pergunta? Não vê que estamos transformando o país? Isso é ódio de classe!….e por ai vai.

Neste contexto, a Copa das Confederações, pensado como marco de um novo país, tornou a distância entre o discurso e a realidade grande demais para ser recalcada. O discurso da pátria de chuteiras e a realidade do aeroporto que jorra água pelas tomadas não combinam com a refundação da pátria brasileira. O contraste entre a Fonte Nova e o metrô inacabado é demais para ser tolerado. O estímulo às indústrias automobilísticas e o caos no trânsito nos dizem que alguma coisa está profundamente errada. A inversão das prioridades sociais não se sustenta. A propaganda não nos convence e não aceitamos mais a chantagem política travestida de reforma social.

As manifestações GRITAM que não é por 20 centavos. É mais do que isso. Assim, reduzir o preço da tarifa é apenas a parte visível da insatisfação que move os manifestantes. O problema é que nossos governantes não escutam as vozes que vêm da rua. Onde eles estão? Onde se escondem?

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