Elias de Oliveira Sampaio

Políticas Públicas

Economista do Ministério da Economia. Mestre em Economia e Doutor em Administração Pública pela UFBA. Autor de diversos trabalhos acadêmicos e científicos, dentre eles o livro Política, Economia e Questões Raciais publicado - A Conjuntura e os Pontos Fora da Curva, 2014 a 2016 (2017) e Dialogando com Celso Furtado - Ensaios Sobre a Questão da Mão de Obra, O Subdesenvolvimento e as Desigualdades Raciais na Formação Econômica do Brasil (2019). Foi Secretário Estadual de Promoção da Igualdade Racial (Sepromi) e Diretor-presidente da Companhia de Processamento de Dados do Estado da Bahia (Prodeb), Subsecretário Municipal da Secretaria da Reparação de Salvador (Semur), Pesquisador Visitante do Departamento de Planejamento Urbano da Luskin Escola de Negócios Públicos da Universidade da Califó ;rnia em Los Angeles (UCLA), Professor Visitante do Mestrado em Políticas Públicas, Gestão do Conhecimento e Desenvolvimento Regional da Universidade do Estado da Bahia (Uneb). Professor, Coordenador do Curso de Ciências Econômicas e de Pesquisa e Pós-Graduação do Instituto de Educação Superior Unyahna de Salvador.

PARA QUE REDUZIR A MAIORIDADE PENAL NO BRASIL?

O congresso nacional começará a votar nos próximos dias a matéria sobre a redução da maioridade penal. Diante desse debate acreditamos ser necessário saber de todos aqueles que são favoráveis a essa medida não o porquê (o motivo) de sua respectiva posição, mas, o para que (o objetivo) eles imaginam que seria bom para a sociedade reduzir em, no mínimo, dois anos a idade de quem poderá ser julgado como adulto.

Em situações dessa complexidade, não podemos perder de vista que o ethos de nossa sociedade foi amalgamado pelo racismo, machismo e homofobia sob uma conformação desajustada de uma sociedade de classes num ambiente capitalista selvagem. Consequentemente, as causas motivadoras para as diversas escolhas políticas podem ser calcadas em razões que não são nem democráticas e nem republicanas e sim pautadas em ideológicas das mais diversas ordens, quando não de motivações intimas inconfessáveis, tal como a história bíblica do Rei Davi, ao enviar um dos seus melhores oficiais militares, Urias, para as garras do inimigo em pleno campo de batalha.

Situação totalmente oposta é quando se impõe a cada ator social que externe publicamente os objetivos subjacentes às suas escolhas políticas. Na democracia, as consequências da ação de cada pessoa não são neutras e, por isso, devem ser avaliadas a luz dos efeitos coletivos e públicos, os quais, necessariamente, gerarão reações imponderáveis no médio e longo prazos. Dizemos isso por que não existe no Brasil nenhuma avaliação ou quaisquer outros tipos de informações, adequadamente produzidas, que indiquem que reduzir a maioridade penal poderia contribuir para melhoria do nosso bem-estar no que diz respeito à segurança pública.

Não há no país nenhum estudo sistemático que atribua, de forma inconteste, as influências sociológicas ou mesmo psicossociais, para a crescente violência a que somos submetidos diariamente, a criminalidade e o nível geral de homicídios. Não existe, sequer, consenso entre os operadores da área de segurança pública quanto a metodologia correta para caracterizar de forma nacionalmente homogênea a quantidade de corpos mortos que encontramos diariamente nos quatro cantos do país; ou mesmo, se é a oferta de drogas ilícitas que concorrem para o aprofundamento dos efeitos deletérios do tráfico, ou se é a crescente demanda para essas drogas por parte das classes mais abastadas que alimenta de forma exponencial, a cadeia produtiva da indústria de crimes, inclusive os homicídios e os latrocínios com o envolvimento de crianças e adolescentes.

O que está causando espécie em importantes atores sociais no nosso país, e fora dele, é que todo o movimento pró redução da maioridade, traduz o desejo oportunista de alguns seguimentos políticos que, aproveitando-se do conturbado ambiente político-institucional e do viés conservador que ora acompanhamos no Brasil, buscam operar o anseio de uma espécie de vingança contra os principais beneficiários dos avanços da constituição cidadã de 1988 e dos arranjos de políticas públicas de garantia de direitos que se aprofundaram nos últimos doze anos no Brasil.

Por isso compreendemos perfeitamente a posição da Presidenta Dilma em assumir, publicamente, que trabalhará junto a sua base aliada para não permitir que essa mudança ocorra durante a sua gestão. Esse exemplo deveria ser seguido por outros lideres do executivo, nos níveis subnacionais, trabalhando junto as suas bases locais para fazer um enfrentamento mais amplo possível contra essa mudança institucional que vai de encontro de orientações partidárias explícitas, como as do Partido dos Trabalhadores e demais partidos de esquerda, mesmo porque os efeitos negativos dessa transformação recairá sobre suas principais bases sociais.

No bojo de tudo isso, devemos também refletir sobre como um país que sequer consegue dar uma solução para um problema mais simples que é a mendicância de crianças e adolescentes nas sinaleiras, pode justificar uma opção radical como essas, quando países como EUA, por exemplo, estão indo exatamente na direção oposta? Será porque no sinal de transito, normalmente fecha-se a janela dos carros, olha-se para o outro lado, aumenta o volume do rádio ou se atende o celular por trás dos vidros escuros?

Quando a situação se refere a infração de menores, essa passividade cínica não pode ser exercitada. Ao contrário, a criminalidade nesse seguimento é um nervo exposto na sociedade porque denuncia de forma fria e crua a falência de nossas instituições das mais importantes: as famílias, as organizações, as religiões e, principalmente, o Estado.

Exceto pelos casos totalmente fora dos padrões, de princípios sociais ou mesmo os de natureza patológica, se quisermos fazer uma avaliação honesta sobre a realidade de quaisquer menores infratores de nossa sociedade, devemos admitir que toda e qualquer falta que possam ser a eles atribuídas, são decorrentes de um conjunto sucessivo e sistêmico de falhas anteriores que na grande maioria das vezes tem a ver com os desajustes estruturais das instituições que citamos anteriormente.

Enquanto não nos convencermos que não existem menores de rua, visto que, ainda não se descobriu capacidade reprodutiva de asfaltos com paralelepípedos, toda criança e adolescente possui pai e mãe e por menor tempo que tenha sido, deve ter passado por alguma estrutura coletiva ou pública de educação, corporativa ou mesmo correcional, as quais, não podem abstrair de suas funções primordiais a formação efetiva de cidadãos no sentido mais amplo que essa palavra pode assumir.

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