Lucas Faillace Castelo Branco

Direito

Lucas Faillace Castelo Branco é advogado, mestre em Direito (LLM) pela King’s College London (KCL), Universidade de Londres, e mestre em Contabilidade pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). É ainda especialista em direito tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários (IBET) e em Direito empresarial (LLM) pela FGV-Rio. É diretor financeiro do Instituto dos Advogados da Bahia (IAB) e sócio de Castelo e Dourado Advogados.

Por um Brasil com mais burocracia

O título não é um erro de digitação, caro leitor, que pode ter imaginado mais “democracia”. É que ouvi recentemente no rádio a afirmação de que a burocracia, no Brasil, favorece a corrupção e as fraudes. Isso deixou-me intrigado.

Segundo os debatedores, o excesso de formalidades, com exigências legais e procedimentais, contribuiria sobremaneira para facilitar a corrupção, indo ao encontro da clássica frase segundo a qual aqui se criam dificuldades para se venderem facilidades. Para esses luminares, então, a redução da burocracia implicaria a diminuição da corrupção no País. Parece-me justamente o contrário.

A burocracia brasileira é realmente um atraso na vida das pessoas. Mas, sem ela, a prática de falcatrua, se já é fácil, tornar-se-ia facílima. E, pior, com a eliminação da burocracia, a corrupção não deixaria rastros (ou deixaria pouquíssimos). O formalismo burocrático vem sempre acompanhado de registros documentais que, bem o mal, permitem reconstruir alguns passos do ilícito.

Ora, a própria burocracia já espanta os picaretas preguiçosos, deixando esse relevante mercado reduzido aos mais especializados e criativos, que já não são poucos. Sem a burocracia, essa importante barreira de mercado seria eliminada.

Um caso acontecido comigo ilustra o argumento.

Certo dia fui ao banco público munido de procuração com poderes específicos para sacar um valor de FGTS de um amigo que não mais residia no Brasil. O atendente, de imediato, disse que isso não seria possível; o cliente teria de ir à agência pessoalmente (o que também não seria possível).

Após dar minha “carteirada” de advogado, atitude tipicamente brasileira para lançar autoridade, descobri que meu interlocutor do banco também era bacharel em direito.

Concordando comigo, disse-me que a orientação do banco era, em primeiro lugar, negar a possibilidade de saque de FGTS por procuração. Eu teria, então, que esperar alguns dias para que o banco fizesse um procedimento interno (burocrático) a fim de validar a procuração.

Então perguntei-lhe: “por que o banco não flexibiliza isso, quanta burocracia!?” Recebi a singela resposta de que o banco já havia feito isso antes e que – aqui vai o principal – as fraudes aumentaram significativamente após a flexibilização.

Hoje se abre uma conta de telefone em uma operadora facilmente. Parece até coisa de país civilizado. Isso explica a quantidade homérica de contas abertas em nome de terceiros inocentes. Falando de telefone, praticamente todos já foram vítimas do golpe do “zap”. A desfaçatez dos bandidos – e a quantidade deles – impressiona, assim como a facilidade de eles saírem impunes.

Quer reduzir essas fraudes? Fácil, mais burocracia. Exija-se abertura de conta mediante apresentação de cópia autenticada de CPF, RG, comprovante de residência, todos traduzidos para o latim e com carimbo do Vaticano atestando a correção da tradução. Tenho certeza de que os golpes reduziriam um pouco.

É lógico que o relaxamento das regras burocráticas, na maioria esmagadora dos casos, abriria brecha para mais fraudes, mais corrupção. Por isso, meu voto vai para o candidato que resolver piorar a nossa vida (ou melhorar, estou confuso?). Precisamos de um Brasil com mais burocracia!

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